Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a Abertura do Debate Geral da 79ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, no Salão da Assembleia Geral, da Sede das Nações Unidas (ONU). Nova York - Estados Unidos. Foto: Ricardo Stuckert / PR

Nesta terça-feira (24), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursou na abertura da 79ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York. Com um discurso duro para alertar as nações sobres os desafios atuais, Lula chamou a atenção do mundo para a urgência climática, para a necessidade de revisão da Carta das Nações Unidas, pelo fim das guerras, e outros temas, como combate à fome, financiamento de países pobres, taxação de super-ricos e regras para plataformas digitais.

Lula iniciou o discurso saudando o presidente Mahmmoud Abbas e a delegação palestina, presente pela primeira vez na sessão de abertura.

Em seguida, o presidente brasileiro falou sobre a adoção do Pacto para o Futuro, e não se furtou em ressaltar a difícil aprovação do documento, que classificou como: “enfraquecimento de nossa capacidade coletiva de negociação e diálogo”.

Mudanças Climáticas

Parte do discurso foi voltado para chamar a atenção das nações sobre as mudanças climáticas: “o planeta já não espera para cobrar da próxima geração e está farto de acordos climáticos não cumpridos”, afirmou.

Lula pontuou que 2024 caminha para ser o ano mais quente da história moderna, lembrou de eventos globais e lamentou a crise brasileira com enchentes no Rio Grande do Sul, estiagem na Amazônia e incêndios florestais em todo o país.

De acordo com o presidente, o seu compromisso com o meio ambiente é sagrado e parte dele é dedicado em combater “quem lucra com a degradação ambiental.”

Como meta estabeleceu a erradicação do desmatamento na Amazônia até 2030 e disse que o país apresentará uma Contribuição Nacionalmente Determinada (a NDC) em linha com o objetivo de limitar o aumento da temperatura do planeta a um grau e meio. 

Reforma das Nações Unidas

Um dos pontos de maior destaque no discurso de abertura foi a defesa de uma “reforma abrangente” na Carta das Nações Unidas.

O presidente brasileiro ressaltou que os desafios da época de fundação da ONU, com 51 países, se avolumaram: hoje são 193 nações.

Lula rememorou que “nações, principalmente no continente africano, estavam sob domínio colonial e não tiveram voz sobre seus objetivos e funcionamento.”

Em seguida, criticou a falta de equilíbrio de gênero no exercício das mais altas funções: “o cargo de Secretário-Geral jamais foi ocupado por uma mulher”, falou Lula, sendo aplaudido pelos presentes.

Na sequência, disse que a ONU está cada vez mais esvaziada e paralisada, e para mudar isso é preciso uma ampla revisão de sua Carta. Ele sugeriu quatro pontos:

  • a transformação do Conselho Econômico e Social no principal foro para o tratamento do desenvolvimento sustentável e do combate à mudança climática, com capacidade real de inspirar as instituições financeiras.
  • a revitalização do papel da Assembleia Geral, inclusive em temas de paz e segurança internacionais.
  • o fortalecimento da Comissão de Consolidação da Paz.
  • a reforma do Conselho de Segurança, com foco em sua composição, métodos de trabalho e direito de veto, de modo a torná-lo mais eficaz e representativo das realidades contemporâneas.

Por fim, disse que a exclusão da América Latina e da África de assentos permanentes no Conselho de Segurança “é um eco inaceitável de práticas de dominação do passado colonial.”

Além disso, que a necessidade de reforma é premente, sendo que não é possível “esperar por outra tragédia mundial, como a Segunda Grande Guerra, para só então construir sobre os seus escombros uma nova governança global.”

Guerras

Sobre as guerras que assolam o mundo, lembrou que “2023 ostenta o triste recorde do maior número de conflitos desde a Segunda Guerra Mundial” e que os mais de 2,4 trilhões de dólares com gastos militares globais deveriam “ter sido utilizados para combater a fome e enfrentar a mudança do clima.”

Quanto à guerra na Ucrânia, o presidente lamentou a falta de perspectiva de paz e recordou que o Brasil “condenou de maneira firme a invasão do território ucraniano”.

Nesse sentido, lembrou da articulação entre China e Brasil para a retomada do diálogo e o fim das hostilidades.

Sobre a guerra em Gaza e na Cisjordânia, indicou que a “ação terrorista de fanáticos contra civis israelenses inocentes, tornou-se punição coletiva de todo o povo palestino”. Segundo Lula, a crise se expande perigosamente para o Líbano e, sem citar Israel, disse que “o direito de defesa transformou-se no direito de vingança, que impede um acordo para a liberação de reféns e adia o cessar-fogo.”

Na oportunidade, Lula ainda ressaltou que “é injustificado manter Cuba em uma lista unilateral de Estados que supostamente promovem o terrorismo”.

Foto: Ricardo Stuckert / PR

Democracia e regramento digital

A questão de um regramento sobre ambiente digitais também foi colocado. Depois das polêmicas envolvendo a rede X no Brasil, Lula trouxe que a democracia brasileira e da América Latina continua sob ataque e que é preciso “derrotar os que tentam solapar as instituições e colocá-las a serviço de interesses reacionários.”

Assim, o futuro de nossa região passa por não se intimidar “ante indivíduos, corporações ou plataformas digitais que se julgam acima da lei.” E completou: “A liberdade é a primeira vítima de um mundo sem regras.”

Em outra frente, o presidente entende que a Inteligência Artificial tem promovido um oligopólio do saber: “avança a concentração sem precedentes nas mãos de um pequeno número de pessoas e de empresas, sediadas em um número ainda menor de países.”

Assim, no sentido de termos uma IA emancipadora, pediu: “Necessitamos de uma governança intergovernamental da inteligência artificial, em que todos os Estados tenham assento.”

Economia

O longo discurso também versou sobre economia. Lula citou que a América Latina passa, desde 2014, por uma segunda década perdida, pois o crescimento médio da região foi de apenas 0,9%, metade do verificado na década perdida de 1980.

Dessa maneira, pediu maior acesso a recursos financeiros por países de renda média e baixa, ao revelar que alguns deles tomam empréstimos com taxas até 8 vezes maiores do que países ricos.

No seu tempo, ainda destacou uma das plataformas brasileiras na presidência no G20, a taxação de super-ricos, ao lembrar que “a fortuna dos 5 principais bilionários mais que dobrou desde o início desta década, ao passo que 60% da humanidade ficou mais pobre.”

Para tal, solicitou cooperação internacional para desenvolver padrões mínimos de tributação global. O tema está imbricado ao combate à fome e à erradicação da pobreza, uma vez que permite aos Estados maiores condições para agir.

Segundo Lula, acabar com a fome é o seu compromisso primordial no Brasil: “Só em 2023, retiramos 24 milhões e 400 mil pessoas da condição de insegurança alimentar severa.”

Confira aqui o discurso completo do presidente Lula.

Foto: Ricardo Stuckert / PR