Trump expõe seu racismo contra imigrantes e Kamala aponta que, por ela, guerra na Ucrânia continua | Foto: AFP

De olho no eleitorado norte-americano “não compromissado”, isto é, pró-palestino, Kamala Harris se dedicou no debate com Donald Trump, na Pensilvânia, a fazer a acrobacia de não condenar o genocídio em curso em Gaza, nem prometeu embargar as armas para Israel para deter o massacre, mas sempre lamentando pelos “palestinos que sofrem” e acenando com a “Solução dos Dois Estados”, mas por enquanto, chamando a agressão a Gaza de “direito de Israel se defender”. 

Enquanto Trump – que fechou escritório da OLP em Washington, apoiou o plano de Netanyahu de anexar a Cisjordânia, passando o trator sobre os reconhecidos direitos palestinos à autodeterminação – disse que se ela vencer Israel estaria “acabado em dois anos”, sem dizer porque ou apontar qualquer solução para o conflito, e que, com ele na Presidência, “não haveria a guerra”.

Com as eleições nos EUA tecnicamente empatadas segundo as pesquisas e na iminência de serem decididas em seis ou sete estados por estreita margem, o primeiro – e o último? – debate Kamala-Trump na terça-feira (10) logrou, em primeiro lugar, manter a euforia nas fileiras democratas, com as pesquisas apontando a candidata como vencedora, enquanto Trump, apesar de se declarar vitorioso “por muito” do embate, reclamou que foram “3 contra 1”, se referindo à interferência dos dois mediadores da ABC News.

Mais de 57 milhões de pessoas viram o debate, realizado na Filadélfia, maior cidade da Pensilvânia, um estado-pêndulo visto como essencial para a vitória.

Curiosamente, analistas na véspera do debate se preocupavam quanto ao fato de que nos democratas a euforia pós desistência de Biden estava sendo substituída pela constatação da dureza da disputa e alertas sobre o oba-oba na reta final.

Manchetes do New York Times, do Washington Post e do Wall Street Journal registraram que Kamala tinha colocado Trump na defensiva, num quadro de “disputa acirrada”.

Ao longo de quarta-feira (11), títulos do portal do New York Times sobre o debate foram sendo substituídos por outros mais comedidos: “Harris e Trump apostam em suas próprias visões fortemente contrastantes da América” e “Especialistas disseram que Harris venceu o debate. Os eleitores indecisos não tinham tanta certeza”.

Afinal, por essa época, nas duas eleições presidenciais anteriores tanto Biden quanto Hillary tinham uma vantagem maior sobre Trump.

O debate também foi observado com atenção no mundo inteiro, onde preocupações sobre as ameaças da extrema direita à democracia se mesclam com a realidade da guerra de procuração de Biden/Otan na Ucrânia contra a Rússia, uma potência nuclear; genocídio em Gaza e risco de guerra generalizada no Oriente Médio; cerco incansável contra a China no Pacífico; e um terço dos países do mundo sob sanções de Washington.

Trump reiterou que os democratas ameaçam levar o mundo à III Guerra Mundial e que, se ele estivesse na Casa Branca e não Biden, a guerra da Ucrânia nem teria começado. Ele prometeu que, se eleito, acabará com a guerra “antes da posse”. Também culpou os democratas por enriquecerem o Irã, por trás dos ataques a Israel, por terem eliminado sanções.

Kamala se comprometeu com a continuação da guerra da Otan na Ucrânia, por ela apontada como o suprassumo da disputa entre o bem e o mal no mundo.

Apesar do aperto de mão inicial, Kamala chamou Trump de “vigarista” e “mentiroso” enquanto este a classificou como “fraca” e “marxista”. O bilionário manteve ter “vencido” a eleição de 2020 e disse nada ter a se arrepender sobre o 6 de Janeiro.

“Fizemos um trabalho excepcional”, asseverou o candidato magnata sobre seu primeiro mandato, enquanto Kamala dizia que “o que fizemos foi limpar a bagunça que Donald Trump nos deixou”.

Na questão da economia, Kamala prometeu uma “economia de oportunidades”, enquanto Trump culpava Biden e sua vice pela inflação elevada, 21% segundo ele. Um exagero proposital, para lembrar a inflação sobre alimentos. Ele prometeu elevar as tarifas para trazer a produção de volta para os EUA, voltando a prometer que seriam os chineses que pagariam a conta, não os consumidores norte-americanos. Também prometeu nova rodada de corte de impostos para os ricaços.

Segundo Kamala, sua economia seria voltada, não para Wall Street e para manter o complexo de guerra norte-americano como os distraídos achariam, mas para a “classe média como ela”.

Trump não conseguiu explicar exatamente qual é seu plano econômico, mas, quanto ao de Kamala, questionou: “por que já não fez?”, já que há quatro anos é a vice democrata. Jurou contrito nada ter a ver com o Projeto 2025, denunciado pelos democratas e criado por trumpistas.

A questão da imigração voltou a ter grande relevância no debate. Com Trump, nunca é bom subestimar para quem ele está propriamente falando, como ele fez com as histórias sobre os imigrantes em uma cidadezinha de Ohio, Springfield, que teriam raptado e “comido gatos e cachorros” dos vizinhos.

Ou as “gangues venezuelanas” que supostamente invadiram um pardieiro em outra cidadezinha, desta vez no Colorado, sinal de que os EUA estariam prestes a se tornar uma “Venezuela com anabolizantes”.

Trump chegou ao cúmulo de asseverar que no mundo inteiro a criminalidade está caindo porque os outros países estão despejando seus delinqüentes e seus doentes mentais na fronteira dos EUA, que têm livre entrada, supostamente para arrumar mais eleitores falsos para os democratas.

A manipulação da questão da imigração é o carro-chefe de sua suposta sintonia de biliardário do mercado imobiliário com a imensa massa de deserdados pela desindustrialização e hiperfinanceirização dos EUA: o país está sendo invadido pelos imigrantes, que vão tomar seu emprego e substituir você, com a mensagem subjacente de que era a incompetente Kamala a czarina da fronteira, sob o patético Biden.

No mais, é como diz o velho ditado: diga-me com que andas, e te direi quem és. Kamala, festejando o endosso do ex-vice-presidente Dick Cheney, o arquiteto da invasão do Iraque. E Trump, nos braços de Elon Musk.

Fonte: Papiro