Trump diz que com ele tudo vai ser melhor, esquecendo a crise que provocou quando na Presidência | Foto: Brendan Smialowsky/AFP

Com a aclamação do ex-presidente Donald Trump como o candidato do partido, terminou na noite de quinta-feira (18) a Convenção Nacional Republicana, com 18 mil participantes extasiados com a presença daquele que, supostamente, o próprio Todo-Poderoso teria salvo milagrosamente no sábado; a participação de um astro de luta livre e de Dana White, da UFC; promessas de deter a decadência norte-americana e deportar imigrantes em massa; 100 mil balões vermelhos, brancos, azuis e dourados caídos do teto, espetáculo que marcou a conclusão da hegemonização pelo trumpismo fascista do que já foi o partido de Lincoln, e depois, de Eisenhower, Nixon, Reagan e Bush.

Apesar de declarações iniciais de Trump, com um curativo na orelha, de que, transformado pela experiência de quase morte, governaria para “todos os americanos”, não para “metade da América” e que “a discórdia e a divisão na nossa sociedade devem ser curadas”, ao longo da peroração de 92 minutos ficou claro que o que ele propunha era a unidade em torno de sua agenda.

Ele logo se referiu à “louca Nancy Pelosi”, repetiu suas alegações de que foi roubado na eleição de 2020 e perseguido judicialmente, atacou o presidente do principal sindicato operário norte-americano, citou o “vírus da China” e despejou um vomitório infame contra os imigrantes.

Como ironizou o portal Axios, “o ‘novo’ Trump acalmou e silenciou a nação por 28 minutos na noite passada. Em seguida, o velho Trump voltou e folgou, latiu e entediou a América por mais 64 minutos.”

Talvez nada retrate melhor isso do que a enxurrada de ódio despejada contra imigrantes que chegam pela fronteira sul, de ascendência hispânica, na maior parte, escolhidos pelo trumpismo racista como bode expiatório preferencial.

“Vivemos a maior invasão do mundo. Imigrantes de países de terceiro mundo chegam aqui com pedras. Há gangues perigosas chegando e entram juntas aqui. Os países de origem não os aceitam de volta”, afirmou Trump sem ocultar o racismo e xenofobia.

“Hoje, nossas cidades estão inundadas de estrangeiros ilegais. Os americanos estão sendo expulsos da força de trabalho e os seus empregos estão sendo tomados”, continuou.

“Eles vêm de prisões, vêm de instituições mentais e manicômios”, disse Trump, culpando os imigrantes pela criminalidade e por todos os outros males sociais nos Estados Unidos “Viramos um depósito do mundo, que está rindo de nós. Eles acham que somos burros”.

 “Os 10 piores presidentes combinados não causaram tanto dano quanto Biden”, asseverou Trump, tentando culpar Biden pela decadência norte-americana em curso e exaustão da ditadura unipolar sobre o planeta instaurada após o fim da Guerra Fria, o que se agravou desde o crash de 2008, bem como pelas mudanças tectônicas, da emergência da China como fábrica do mundo até o renascimento russo, desdolarização e volta do não alinhamento à cena internacional. Como se isso já não estivesse em processo acelerado no primeiro mandato de Trump e, aliás, tivesse sido um dos motivos por sua eleição então.

“Com nossa vitória em novembro, os anos de guerra, fraqueza e caos acabarão”, afiançou Trump. “Eu acabarei com todas as crises internacionais que o atual governo criou, incluindo a horrível guerra com a Rússia e a Ucrânia, e a guerra causada pelo ataque a Israel, ambas as quais nunca teriam acontecido se eu fosse presidente”, disse.

Após afirmar que Israel sofreu “o pior ataque de sua história”, ele destacou que “a China está cercando Taiwan, e navios de guerra e submarinos nucleares russos estão operando a 96 quilômetros de nossas costas em Cuba, e a mídia não quer falar sobre isso”.

“O nosso planeta está à beira da Terceira Guerra Mundial e esta será uma guerra como nenhuma outra”, disse ainda Trump. Como se não tivesse responsabilidade nisso, depois de ter sido quem rasgou e se retirou do Tratado INF de proibição de mísseis intermediários, que impediu por três décadas a guerra termonuclear na Europa, assinado por Reagan e Gorbachev. E indiscutivelmente um fato que tornou inadiável a Rússia agir contra a anexação da Ucrânia pela Otan.

“Nós reabasteceremos nossos militares e construiremos um Sistema de Defesa de Mísseis Domo de Ferro para garantir que nenhum inimigo possa atacar nossa terra natal — e este grande Domo de Ferro será todo feito nos EUA”, prometeu Trump, no dia em que um míssil iemenita driblou o Domo de Ferro original, israelense, e aterrissou perto da embaixada norte-americana em Tel Aviv.

Quanto às questões que mais afligem a população no dia a dia, Trump prometeu a volta da “maior economia do mundo”, menos impostos e baixar a inflação, bem como estimular a produção interna ao invés de importar tudo.

Ao contrário do que promete Trump, os anos dourados não vão voltar por causa dele voltar para a Casa Branca. A história não acabou e os Estados Unidos estão mergulhados na maior crise política desde pelo menos 1968, outro ano de eleições presidenciais marcado por assassinatos, guerras e o colapso de um governo.

Agora, o colapso é da candidatura Biden e sua aposta na guerra contra a Rússia para acumular para o enfrentamento com a China. Na realidade, a grande divisão na cabeça do império é sobre quem privilegiar como inimigo principal, se a Rússia, para acumular para o enfrentamento com a China, ou se deve partir imediatamente para o confronto com Pequim.

Apesar da encenação de JD Vance como símbolo do recém remodelado Partido Republicano, supostamente encorpado pelos vêm de baixo, a plataforma aprovada não esconde que o partido segue a serviço dos monopólios e dos magnatas – do corte de impostos para os super-ricos até o arrocho dos benefícios sociais, saúde e educação, além da ojeriza a qualquer tipo de política ambiental e fluxo ininterrupto de dinheiro para o complexo industrial-militar e suas guerras.

Além de sinalizar que parcela da plutocracia norte-americana cada vez mais dúvida da capacidade de gerenciar a crise sem apelar para o fascismo.

Quanto à capacidade do trumpismo de unir os norte-americanos, nada como a estrondosa acolhida dos convencionais e convidados ao lutador Hogan, que os brindou com: “todos vocês, criminosos, todos vocês, canalhas… o que vocês farão quando Donald Trump e todos os maníacos trumpers atacarem você, irmão”, sob aplausos, segundo a mídia.

Com tal espírito de pacificação, Trump fica parecendo aquele escorpião da anedota, e resta ver se é tão imbatível quanto aparentou na foto de sábado. Até aqui, as pesquisas seguem dando Trump vencendo nos Estados-pêndulo, aqueles que decidem o resultado no colégio eleitoral, ainda que por margem estreita. Nos próximos dias deverá se resolver se ele vence Biden por WO ou não, decisão nas mãos dos democratas.

Fonte: Papiro