Camaleão JD Vance é a escolha de Trump para seu vice
A ascensão meteórica de JD Vance a vice da chapa de Donald Trump motivou o People’s World – herdeiro das tradições do Daily Worker, o centenário jornal comunista de Chicago -, a escrutinar sua trajetória, em artigo de Taryn Fivek e CJ Atkins, que o desnudam como um camaleão que “ajuda a solidificar a relação da MAGA com os elementos mais reacionários das finanças e do capital monopolista” e útil para atrair os “desanimados eleitores do Cinturão da Ferrugem” nos Estados-pêndulo, aqueles que, por margem estreita, definem o resultado do colégio eleitoral.
Observam os autores que JD Vance se “reinventou muitas vezes”: nascido James Donald Bowman, passaria a ter o nome de James David Hamel quando sua mãe se casou novamente. O nome JD Vance surge em 2014, quando ele passa a usar o sobrenome dos avós maternos, que o criaram.
Assim, ele passou a se apresentar “como um marido dedicado, católico convertido, capitalista de risco”, a “voz do Cinturão da Ferrugem” e ainda como “CEO sem fins lucrativos e patrono da mídia alt-right.”
Na quarta-feira (17), Vance foi ungido na Convenção Nacional Republicana como vice da chapa de Trump.
“Recentemente, porém, ele voltou a se desfazer de identidades. Ele não é mais o ‘conservador compassivo’ de 2016 preocupado com que Donald Trump pudesse ser ‘o Hitler da América’. Tampouco é o autor best-seller do New York Times que encantou os liberais brancos do norte com sua análise caseira de por que o populismo MAGA estava tomando conta das áreas rurais”, registra o PW, referindo-se ao best seller de 2015, “Hillbilly Elegy”, que viraria um filme da Nexflix, exibido no Brasil como “Era Uma Vez um Sonho”.
Assim, após oito anos, o senador novato de Ohio – com apenas dois anos de mandato – encontra-se ao lado de Trump como seu companheiro de chapa à vice-presidência em 2024. “Apesar de seu histórico de denunciar o candidato do Partido Republicano como ‘repreensível’, um ‘desastre moral’, um ‘cínico’ e uma ‘fraude total’ que não se importa com o homem comum, Vance agora está sendo recebido na campanha de Trump de braços abertos”.
Para Kivec e Atkins, o que tornou isso possível foi sua condição de “queridinho do capital financeiro”. Eles registram ainda o deslumbramento da mídia sobre a escalada de Vance e como o alardeiam “não apenas sucessor de Trump, mas o futuro potencial da política dos EUA”, o primeiro da geração do milênio.
“Em 2014, mesmo ano em que começou a se apresentar como J.D. Vance, ele também iniciou o que acabou sendo uma relação muito lucrativa com o que os marxistas poderiam chamar de ‘os setores mais reacionários do capital financeiro’”, registra o portal.
Em seu primeiro emprego após a universidade de Yale, tornou-se capitalista de risco na Mithril Capital, tendo como chefe o bilionário da extrema direita, Peter Thiel, que tem botado dinheiro em quase todos os empreendimentos “culturais” e “ideológicos” da assim chamada Nova Direita.
Dois anos depois, Vance deixou a Mithril Capital para seguir sua esposa Usha para a capital Washington, onde ela trabalhou para o futuro juiz da Suprema Corte Brett Kavanaugh e para o presidente da Suprema Corte John Roberts – dois expoentes do reacionarismo judiciário -, mas ele se manteve em contato com Thiel. Em seguida, foi operar na empresa de especulação, perdão, investimentos, Revolution LLC, do fundador da AOL, Steve Case.
Após dois anos em Washington, ele voltou para Ohio, onde co-fundou uma empresa de capital de risco própria, Narya Capital, com a ajuda financeira de Thiel. À espelunca Vance atribuiu a missão de “lutar contra o capital desperto”.
Menos de dois anos depois de seu retorno ao Estado natal, Vance anunciou sua candidatura ao Senado dos EUA. Thiel doou um recorde de US$ 15 milhões para um super-PAC em apoio à campanha dele, assim como o peso-pesado do fundo de hedge Robert Mercer, um grande doador de Trump e financiador do UKIP, partido envolvido no Brexit. Mercer, observa o PW, também acredita que a Lei dos Direitos Civis de 1964 foi um “grande erro”.
Para Fivek e Atkins, “a cada infusão de fundos de seus benfeitores no mundo do capital financeiro reacionário, cada vez mais parecia que o próprio Vance e quaisquer valores que ele pudesse ter cultivado de suas origens estavam definitivamente à venda”.
E é isso – acrescentam – que o torna “tão atraente para um aspirante a ditador como Trump”. Um calouro político e visto pelo establishment de Washington como “alguém facilmente influenciado pelo grande dinheiro”.
É provável ainda que Trump veja Vance como alguém que seria fácil de controlar. Aliás, Vance já declarou “que teria seguido as ordens de Trump” em 6 de janeiro de 2021 – ao contrário do então vice Pence – e “se recusado a certificar a eleição de 2020”.
Apesar das críticas anteriores a Trump, Vance expressou afinidades intelectuais que atraem aqueles no topo do movimento MAGA à procura de um herdeiro para um dia suceder seu atual líder, Trump. Como a Heritage Foundation, que fez lobby por seu nome, acrescenta a análise.
“Ideologicamente, o novo republicano #2 se encaixou na tendência do ‘conservadorismo nacional’ que se aglutinou nos últimos anos em torno de pontos como nacionalismo econômico, oposição à imigração, política externa mais isolacionista, livre mercado libertário, visões reacionárias sobre sexo e gênero e aversão à democracia em favor do poder autoritário.”
Mas – decifra o PW – “os republicanos esperam que Vance também traga algo mais com ele no dia da eleição: o desanimado ‘eleitor do Belt Rust [Cinturão da Ferrugem]’”.
Acrescenta, ainda, que “não é qualquer trabalhador da geração do milênio que Vance corteja. Co-patrocinou projetos de lei que atacam as ações afirmativas, bem como aludiu ao mito da ‘teoria da Grande Substituição’, popular entre os racistas brancos”.
Assinala ainda que Vance não era o único candidato jovem, cínico e preconceituoso à disposição de Trump, havia muitos outros com tais qualificações.
Para Fivek e Atkins, a qualidade mais atraente que Vance traz para a campanha de Trump em 2024 é que ele “ajuda a solidificar a relação da MAGA com os elementos mais reacionários das finanças e do capital monopolista”. A começar por Elon Musk, dono do Twitter/X, que anunciou que contribuiria com US$ 45 milhões por mês para a campanha.
Na noite de terça-feira, o capitalista de risco David Sacks tuitou uma lista de outros capitalistas de risco que agora estavam alinhados atrás de Trump: “Ben Horowitz, Bill Ackman, Cameron Winklevoss, Doug Leone, Elon Musk, Eoghan McCabe, Ken Howery, Kyle Samani, Marc Andreessen, Jacob Helberg, Joe Lonsdale, Palmer Luckey, Peter Thiel, Shaun Maguire, Trevor Traina, Tushar Jain, Tyler Winklevoss”.
Lista acompanhada por uma foto sorridente de Trump e as palavras: “Venha, a água está morna”.
Segundo levantamento do PW, “o valor combinado de todos os ativos que esses homens têm sob seu controle é de pelo menos US$ 424 bilhões. Eles representam a inteligência privatizada, os interesses das criptomoedas, a indústria armamentista, as incorporadoras imobiliárias e outros setores impregnados de capital financeiro reacionário.”
A publicação registra que o patrono de Vance, Theil disse no final de junho que votaria em Trump com “uma arma na cabeça”, mas não contribuiria para sua campanha. “Mas agora, com seu protegido escolhido a dedo a uma eleição e, depois, a um batimento cardíaco da presidência, ele mudará de ideia e reabrirá seu talão de cheques?”, indaga o People’s World.
Vance aceitou oficialmente a nomeação para ser companheiro de chapa de Trump na Convenção Nacional Republicana, em discurso em que falou sobre sua criação e disse que o bilionário — e suas políticas — são a melhor opção para os Estados Unidos.
“De alguma forma, um incorporador imobiliário da cidade de Nova York, chamado Donald J. Trump, estava certo em todas essas questões, enquanto Biden estava errado”, disse o senador e especulador Vance. “Joe Biden estragou tudo e minha comunidade pagou o preço”, acrescentou.
“Joe Biden é um político há mais tempo do que eu. Por meio século, ele foi o campeão de todas as grandes iniciativas políticas para tornar a América mais fraca e mais pobre”, disse Vance.
“Em pequenas cidades como a minha, em Ohio, ou ao lado, na Pensilvânia ou em Michigan, em estados de todo o nosso país, empregos foram enviados para o exterior e nossos filhos foram enviados para a guerra”, disse o candidato a vice, acrescentando que “nosso país foi inundado com produtos chineses baratos, mão de obra estrangeira barata e, nos próximos anos, com fentanil chinês barato”,
No registro da CNN, Vance também procurou “apelar aos eleitores da classe trabalhadora branca em um chamado aos Estados-campo de batalha”. Ele se dirigiu aos trabalhadores de fábricas e de energia e disse que Trump “é a pessoa que colocará os trabalhadores americanos em primeiro lugar”.
O país precisa de um líder que “responda aos trabalhadores, tanto aos sindicatos como aos não sindicalizados” e que lute para trazer de volta as fábricas, acrescentou.
Ele homenageou sua mãe, Beverly Vance, que lutou contra “[a falta de] dinheiro e vício’, mas nunca desistiu, e que estava no camarote VIP. “Tenho orgulho de dizer que minha mãe está aqui — 10 anos limpa e sóbria. Eu te amo, mãe”, declarou.
Vance também buscou tirar dividendos sobre o atentado, dizendo que Trump “apelou à unidade nacional logo depois de um assassino quase lhe ter tirado a vida”, após insistentemente chamado de “tirano e ameaça à democracia” pelos democratas. “Ele é durão mas se preocupa com as pessoas. Ele pode desafiar um assassino em um momento e clamar pela cura nacional no momento seguinte.”
No plenário, podiam-se se ver cartazes com “deportação já”.
Enquanto nas fileiras republicanas o momento é de êxtase e exibição de orelhas com esparadrapo, a fritura do adversário Biden segue imbatível, com a mídia norte-americana estampando que a ex-presidente da Câmara, Nancy Pelosi, disse reservadamente atual presidente em uma conversa recente que as pesquisas mostram que ele “não teria como derrotar Donald Trump”.
Pelosi também teria sido portadora da mensagem de que Biden poderia “destruir as chances dos democratas de vencer a Câmara em novembro se continuar buscando um segundo mandato”, de acordo com quatro fontes informadas sobre a ligação.
Embora a data exata da conversa não tenha ficado clara, uma fonte a descreveu como tendo ocorrido na última semana. Em uma entrevista na semana passada, Pelosi havia dito caber a Biden “decidir se ele vai concorrer. Estamos todos o encorajando a tomar essa decisão porque o tempo está se esgotando.”
Questionado sobre a reportagem da CNN sobre o telefonema entre Pelosi e Biden, o porta-voz da Casa Branca, Andrew Bates, limitou-se a responder que “o presidente Biden é o indicado do partido. Ele planeja vencer e espera trabalhar com os democratas do Congresso para aprovar sua agenda de 100 dias para ajudar as famílias trabalhadoras”. Na quarta-feira, diagnosticado com Covid, Biden cancelou compromissos.
Fonte: Papiro