Servidora é confundida com foragida por reconhecimento facial e aborda a questão do racismo estrutural
A servidora pública e ativista pela igualdade racial, Daiana de Souza Mello, foi abordada pela Polícia Militar do Rio de Janeiro após ser erroneamente identificada como uma foragida da justiça pelo sistema de reconhecimento facial. O incidente ocorreu durante um evento sobre igualdade racial no Centro do Rio. Daiana, que há 10 anos trabalha com vítimas de preconceito, registrou uma queixa na delegacia devido à situação constrangedora.
Daiana relatou que os policiais mostraram uma foto da suposta foragida, que era completamente diferente dela. “Eu me senti muito desamparada. Tenho medo porque, se essa câmera me reconheceu naquele momento, ela pode me reconhecer em qualquer lugar. Eu não tive nenhuma resposta ainda, não tive nenhum retorno sobre para onde foram as minhas imagens, se isso é arquivado”, questionou.
Os policiais informaram que estavam seguindo o protocolo e encerraram a abordagem após perceberem o erro do sistema de reconhecimento facial. A Polícia Militar esclareceu que o sistema foi escolhido em um processo de licitação e testado nos Estados Unidos. No entanto, Daiana destacou que a tecnologia não foi desenvolvida para garantir a segurança de todos e expressou sua preocupação.
O caso está sendo acompanhado pela Defensoria Pública do Estado, que solicitou informações à Secretaria de Segurança Pública sobre o uso da tecnologia. A defensora pública Anne Caroline Nascimento explicou que há registros de casos de racismo perpetuados pelo uso da IA e algoritmos, que tendem a reproduzir a lógica racista estrutural.
O videomonitoramento em tempo real é utilizado em diversos pontos do estado do Rio, e, de dezembro do ano passado a junho deste ano, 200 pessoas foram presas com base no reconhecimento facial. No entanto, a ferramenta é polêmica e especialistas pedem regulamentação mais rigorosa para evitar erros e abusos.
Daiana destacou que, como pessoa negra, foi instruída desde criança a sempre portar documentos, não correr, não responder e segurar a bolsa nas lojas, para evitar situações problemáticas. Em janeiro, dois indivíduos foram presos erroneamente devido a dados desatualizados no banco de dados.
A Defensoria Pública questiona o protocolo utilizado, o treinamento dos agentes de segurança e a atualização da base de dados. A Secretaria Estadual de Governo, responsável pelo Programa Segurança Presente, informou que a abordagem seguiu os protocolos e que a ocorrência foi encerrada após Daiana apresentar seu documento. A Polícia Civil registrou o caso na Delegacia de Combate aos Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, que investiga o incidente.
Fonte: Página 8