"Meu problema é só o cérebro", assegurou Biden em reunião com 20 governadores democratas | Foto: Jim Watson/AFP

Com sua campanha à reeleição em crise, desde o fiasco diante das mentiras e provocações de Trump no primeiro debate na semana passada, o presidente Joe Biden participou na ABC News de uma entrevista com George Stephanopoulos, um clinton-boy de carteirinha, na noite de sexta-feira (5), no esforço para aliviar a pressão que se avoluma, desde os principais jornais dos EUA, até doadores de campanha, governadores e congressistas, para que deixe a disputa presidencial.

Questionado se “teve uma avaliação neurológica e cognitiva completa”, Biden deu uma resposta bastante incoerente, segundo a RT. “Já fiz um exame neurológico completo todos os dias comigo. E eu tive um exame físico completo. Eu estive no Walter Reed [centro médico militar nacional]. Quero dizer, uhm sim, a resposta”, afirmou.

A pergunta se deve aos frequentes episódios de Biden que viralizaram nas redes sociais, em que este cai ou tropeça, apresenta sintomas de desorientação ou não diz coisa com coisa – até a época da morte do filho Beau ele confundiu. A ponto da porta-voz da Casa Branca vir a público desmentir senilidade ou alzheimer.

Instado por Stephanopoulos a responder se ele realmente teve “testes cognitivos específicos” e um exame por um neurologista treinado, em vez de um clínico geral, Biden insistiu que “ninguém” lhe disse que ele realmente precisava se submeter a um.

Biden também se esquivou da pergunta sobre se submeteria de bom grado em tal teste e divulgaria seus resultados ao público, argumentando que seu trabalho por si só prova que ele está apto para o cargo.

“Olha. Eu tenho um teste cognitivo todos os dias. Todos os dias eu tenho esse teste. Tudo o que faço. Você sabe, não só estou fazendo campanha, mas estou governando o mundo. Não é exagero, mas somos a nação essencial do mundo”, afirmou.

“NOITE RUIM E UM RESFRIADO”

Na entrevista ele voltou a atribuir seu pífio desempenho no debate da semana passada a um “resfriado ruim”, descartando-o como um “episódio ruim” em vez de parte de um problema maior.

Ao longo da semana, aliás, as desculpas para o desastre no debate passaram a incluir “jet lag” – o maior estar por troca de fuso horário – por viajar muito como parte de seus afazeres com chefe do império, além de anúncios de que Biden pretende trabalhar menos e dormir mais.

Durante a entrevista à ABC News, Biden anunciou que se considerava o melhor candidato que os democratas poderiam lançar e o melhor preparado para derrotar Trump. “Eu me convenci de duas coisas. Sou a pessoa mais qualificada para vencê-lo e sei como fazer as coisas”, afirmou.

Questionado se algo poderia convencê-lo do contrário, Biden afirmou que só Deus “poderia” ter autoridade suficiente para fazê-lo. “Depende de, se o Senhor Todo-Poderoso descer e me disser isso, eu posso fazer isso.”

Ele disse ainda que não acreditava que seu índice de aprovação seja de 36%. “Não é isso que nossas pesquisas mostram”, asseverou.

Possivelmente, ele também deve não acreditar na pesquisa CBSNews/YouGov que constatou que, para 72% dos eleitores norte-americanos, Biden não deveria disputar a reeleição em novembro.

Mas para continuar candidato democrata, Biden precisar sobreviver às oito semanas que o separam da Convenção de Chicago e a pressão não para. Na sexta-feira, um grupo de 168 apoiantes de alto nível do Partido Democrata, incluindo grandes doadores e acadêmicos, enviou uma carta ao Presidente norte-americano, instando-o a abandonar a corrida, noticiou o Washington Post, citando fontes anônimas.

A coisa também está pegando no Congresso. Um deputado democrata do Texas há 15 mandatos, Lloyd Dogget, pediu que Biden tomasse a “difícil e dolorosa decisão de retirar” para servir o país.

O principal jornal norte-americano, The New York Times, após o debate afirmou em editorial que “o maior serviço público que o Sr. Biden pode agora prestar é anunciar que não continuará a concorrer à reeleição”. O Washington Post e The Wall Street Journal chegaram a conclusão análoga

“O presidente apareceu na noite de quinta-feira como a sombra de um grande servidor público. Ele teve dificuldades para explicar o que realizaria em um segundo mandato. Ele teve dificuldades para responder às provocações do Sr. Donald Trump. Ele teve dificuldades para responsabilizar o Sr. Trump por suas mentiras, seus fracassos e seus planos assustadores. Mais de uma vez, ele teve dificuldades para concluir uma frase,” escreveu o Conselho Editorial do NYT.

Para o jornal, “Não há razão para o partido arriscar a estabilidade e a segurança do país, forçando os eleitores a escolher entre as deficiências do Sr. Trump e as do Sr. Biden”.

Também a revista britânica The Economist deu um pitaco devastador: retratou na última capa o colapso da candidatura de Biden, com a foto de um andador, ao qual foi acoplado o brasão da presidência norte-americana.

A reunião de Biden com 20 governadores democratas mereceu a atenção do NYT, com um artigo registrando que o governador do Havaí, Josh Green, que é médico, perguntou sobre a saúde dele e obteve como resposta “é apenas meu cérebro”.

Uma observação – acrescenta o artigo – que alguns presentes interpretaram como uma piada, incluindo a governadora Kathy Hochul, de Nova York, como disse uma pessoa próxima a ela. “No entanto, pelo menos um governador teria ficado ‘confuso com o comentário’”.

Fonte: Papiro