Putin deve ser reeleito presidente | Foto: Yuri Kadobriov/AFP

Eleitores de toda a Rússia votaram no sábado (16), segundo dia de uma eleição realizada em meio à guerra por procuração da Otan contra a Rússia na Ucrânia e as mais extensas sanções econômicas já aplicadas em qualquer momento da história moderna pelo chamado Ocidente, o que não impediu a Rússia de manter sua soberania e inclusive crescer mais que a União Europeia.

E com Washington e Bruxelas prometendo uma “derrota estratégica” à Rússia no campo de batalha.

Fatos que implicam, na realidade, em uma eleição com caráter de referendo à figura do presidente Vladimir Putin e do sistema democrático russo, erguido a duras penas com os partidos que se consolidaram na Rússia após o fim da União Soviética, a começar pelos comunistas, os liberal-democratas, e o Partido Novo Povo, que têm candidatos na cédula, respectivamente Nicolai Kharitonov, Leonid Slutsky e Vladislav Davankov.

Putin se apresentou como independente, como já fez na eleição anterior, embora tenha o apoio do Rússia Unida, o partido no poder. E não há dúvida de que será reeleito, com a pesquisa de fevereiro do Instituto Levada – centro de pesquisa de opinião tido como ‘independente’ mesmo no Ocidente – registrando aprovação recorde de 86% para o mandato de Putin na presidência.

“É necessário reafirmar a nossa unidade e determinação para avançarmos juntos. Cada uma de suas vozes é valiosa e significativa. Portanto, peço-lhe que exerça o seu direito de voto nos próximos três dias”, disse o chefe de Estado na sua mensagem de vídeo transmitida no Canal 1, chamando a votar “no candidato que escolherem”, para o futuro da “nossa amada Rússia”.

“Somos todos o povo multinacional da Rússia – uma grande família, nos preocupamo-nos com o nosso país natal, queremos que seja forte, livre e próspero, para que o nível e a qualidade de vida melhorem. Assim será”, destacou Putin.

ELEIÇÃO EM 11 FUSOS HORÁRIOS

De acordo com a Comissão Eleitoral Central, 50,5% dos 114 milhões de eleitores já votaram, e a votação continua neste no domingo (17), último dia. Uma eleição monumental, ao longo de 11 fusos horários.

Também participam os eleitores inscritos nos território recém libertados no Donbass e que por referendo deliberaram em 2022 pela reunificação com a Rússia, depois de por dez anos terem resistido ao neonazismo e à limpeza étnica contra os de fala russa.

A reunificação da Crimeia foi decidida por referendo em 2014, em reação ao golpe neonazista em Kiev e à perseguição aos russos.

Na campanha eleitoral, embora centrada no apoio à luta pela soberania e independência da Rússia em curso, também foram debatidos os novos rumos que o país precisa tomar para desenvolver sua indústria, ciência e autossuficiência, assim como reduzir a desigualdade e ampliar os programas sociais. Questões nas quais os comunistas chamaram a aprender com a rica experiência soviética.

Em Moscou e algumas regiões, eleitores que se cadastraram previamente puderam optar pelo voto online. No sábado, mais de quatro milhões de russos já haviam votado por essa modalidade, o representa 84% de todos os eleitores registrados na votação remota.

As eleições são monitoradas por mais de 333 mil fiscais, incluindo mais de 700 observadores vindos de 106 países, que têm o poder de supervisionar e registrar potenciais violações.

ALVOROÇO NO “BAILE DOS VAMPIROS”

Esse debate eleitoral também significa a superação de vez, em um nível superior, em vastos setores da população e inclusive da elite russa, dos laços de subordinação e mimetismo ao Ocidente e à Europa, paridos no processo de desmanche da URSS.

E de avanço para o mundo multilateral em construção, com a Rússia ligada ao Oriente e ao Sul Global. Como Putin disse em recente entrevista, falando das potências coloniais e imperialistas barricadas no G7, “Seu baile dos vampiros acabou”.

Esse é o enorme significativo dessas eleições, realizadas quando a Rússia, o maior país do mundo em termos territoriais, um país multinacional – sob pressão extrema do “bilhão dourado” e sua ordem global “sob regras” – mantém sua unidade, identidade, soberania e valores.

Assim, a mídia imperial, que nos “bons tempos” se gabava, como colocou na capa a revista Time, “Yankees at Rescue” [Ianques ao Resgate] – quando Washington interveio para salvar Yeltsin no segundo turno em 1996, com os comunistas perto de vencer com Gennady Ziuganov -, agora “denuncia”, calunia, inventa que a eleição “é só formalização de mais seis anos para Putin”.

PROVOCAÇÕES A RODO

Washington e seus vassalos aproveitaram a campanha eleitoral russa para novas provocações, buscando enlamear o processo eleitoral russo, enquanto o regime de Kiev tentou perturbar a eleição, assediando a população russa com bombardeamentos transfronteiriços com drones e mísseis e incursões de tropas ucranianas em regiões como Belgorod.

Com a arrogância costumeira, dirigentes de países europeus, cujo comportamento, diga-se de passagem, vem sendo responsável em grande parte pela ascensão de fascistas por todo canto do bloco europeu, meteram-se a dar declarações altissonantes – e impotentes – de que a Rússia “não podia” realizar eleições na Crimeia ou no Donbass, e que eleição sob ocupação “não vale”. (Já em Kosovo, eles fizeram isso tudo, menos referendo, e, aí sim, aí vale).

Se o golpe da CIA que pôs os herdeiros do colaboracionista de Hitler, Bandera, no poder em Kiev, não houvesse rasgado a constituição que desde a dissolução da URSS prometia neutralidade e respeito aos de fala russa, em terras historicamente russas, que na União Soviética acabaram dentro da Ucrânia, não haveria conflito, nem derramamento de sangue.

Também se não tivessem recuado no último minuto nas negociações de Istambul, como eles próprios já admitiram.

Um dos mais abusados quanto a essa questão, o embaixador britânico em Moscou, Nigel Casey, que chamou de ilegais as eleições na Crimeia e no Donbass, foi prontamente chamado às falas pela porta-voz da diplomacia russa, Maria Zakharova.

As questões desses territórios são decididas “pelos povos da Rússia, não pela Grã-Bretanha”, ela enfatizou. E estes já fizeram essa escolha, como evidenciado “pelos resultados do referendo”.

A porta-voz recomendou, ainda, que os diplomatas britânicos resolvessem “o problema das Ilhas Malvinas em vez de tentarem interferir nos assuntos internos da Rússia”.

TESTEMUNHO DE OBSERVADORES 

Se não havia olheiros de Washington, Bruxelas ou Soros, em compensação os setores progressistas e soberanistas foram à Rússia testemunhar sua eleição presidencial nesta hora extraordinária.

A Organização do Tratado de Xangai e a CSTO, dos países ex-soviéticos, enviaram observadores.

“É uma honra para mim vir observar as eleições. Também temos eleições no nosso país, gostaria de comparar como estão a correr no seu país e no nosso”, disse Rajesh Bagha, da Índia.

Pino Cabras, da Itália, discutiu a russofobia na política da União Europeia. E Lou Bommier, da França, argumentou cautelosamente que “mesmo que os nossos países não concordem em todos os lugares, é importante e necessário dialogar”.

Daniel Martin Kovalik, professor do Departamento de Direitos Humanos Internacionais da Faculdade de Direito da Universidade de Pittsburgh, dos Estados Unidos, disse que o que estava presenciando “não corresponde ao que o Ocidente diz de uma forma ou de outra”.

“Em primeiro lugar, em minha opinião, a região de Kherson não parece uma região ocupada. As pessoas parecem felizes – apesar de todas as dificuldades e circunstâncias atuais. Não há muitos obstáculos. Tudo isto contradiz o que nos é dito [nos meios de comunicação ocidentais]”.

Segundo Kovalik, a mídia ocidental fala sobre pessoas sendo forçadas a votar, mas ele não viu nada parecido nem ouviu nada parecido dos residentes locais.

Cofundador do movimento “Pelo Pan-Africanismo”, o cientista político sul-africano Passeka Farumele, por sua vez, observou que muitas vezes as pessoas acreditam no que os meios de comunicação ocidentais escrevem, mas a realidade difere muito do que ali é imposto.

“Se um dia você sair desse [espaço], cruzar com pessoas de fora, visitar lugares onde não foi categoricamente recomendado estar, você vai experimentar uma verdadeira quebra de padrão, porque vai entender o quanto a realidade afeta ao não coincidir com o que foi incutido em você”, assinalou Farumele.

Conforme a mídia imperial, a única “oposição de verdade” a Putin era Navalny, o racista que chamava os russos a acabar a tiros com as “baratas”, isto é, os imigrantes muçulmanos do Cáucaso, e que se proclamou, depois de um curso de férias em Yale pago pela embaixada dos EUA, a vanguarda da “luta anticorrupção” na Rússia.

Cumprindo pena por vários crimes, Navalny teve um mal súbito em uma caminhada e morreu na prisão na Sibéria pouco antes das eleições. A viúva de Navalny já foi ungida pela mídia imperial e pelos governos ocidentais a herdeira dessa “oposição”.

QUINTA COLUNA SABOTA MEIA DÚZIA DE URNAS

Assim, Washington e Bruxelas buscaram insuflar ações de sabotagem às eleições, cometidos por supostos seguidores de Navalny, e visando desqualificar o pleito.

Esses atos – como despejar um líquido verde para comprometer votos já depositados na urna, ou incendiar urnas – não foram muitos, mas receberam da mídia imperial o máximo de alarde. De acordo com o jornal liberal Kommersant, uma dúzia de incidentes, que levaram a prisões dos executores.

A presidente da Comissão Eleitoral Central, Ella Pamfilova, chamou de “escória” os que estragam votos nas sessões eleitorais.

Ela lamentou que “a nossa chamada oposição liberal pró-Ocidente” haja mudado a “natureza das suas ações”, antes voltada para exigir suposta “transparência” na eleição.

“A participação é boa, as pessoas estão chegando. Eles sabem, e também não são idiotas. Não querem que as urnas sejam abertas porque presumem que não vão gostar do resultado que vai acontecer”, acrescentou.

Mudaram de tática, inventaram falsificações, não funcionou, ela observou. “Então, o que fazer em tal situação, por desesperança, pode-se dizer? Na verdade, esta é uma admissão sincera do próprio fiasco e uma transição para métodos que são simplesmente nojentos…”

Como assinalou o vice-presidente da Comissão Eleitoral Central, Nikolai Bulaev, as tentativas de danificar as cédulas não afetarão os resultados eleitorais: “Temos agora uma participação de 23,9% [no primeiro dia], cerca de 27 milhões de pessoas votaram. Talvez 100-150 votos tenham sido anulados. O que foi conseguido? Nada.”

Fonte: Papiro