Fala de Bolsonaro pode colocá-lo como autor material de trama golpista
As declarações de Jair Bolsonaro a respeito da minuta golpista, durante o ato de domingo (25), soam como uma confissão sobre seu conhecimento a respeito do documento e deslocam o ex-presidente da posição de “possível autor intelectual para pretenso autor material” da tentativa de golpe, segundo avaliação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. A declaração foi dada em entrevista ao Estadão/Broadcast, veiculada nesta quarta-feira (28).
No domingo, sobre um trio elétrico na avenida Paulista, Bolsonaro disse: “O que é golpe? É tanque na rua, é arma, conspiração. Nada disso foi feito no Brasil”. E prosseguiu: “Agora, o golpe é porque tem uma minuta de um decreto de Estado de Defesa. Golpe usando a Constituição? Tenham a santa paciência”.
Questionado se a fala transparecia uma confissão sobre o conhecimento do ex-presidente a respeito da minuta, Mendes respondeu: “Parece que sim. Que todos sabiam”. Por isso, avalia o ministro, Bolsonaro deixou uma situação de “possível autor intelectual para pretenso autor material” da tentativa de golpe de Estado.
O magistrado disse, ainda, haver elementos “severos que indicam intuitos golpistas” e que precisam ser aprofundados. “Tenho certeza de que, no momento em que estamos falando, a Polícia Federal está muito avante”. Não à toa —conforme apurou a jornalista Malu Gaspar, de O Globo — a transcrição do discurso de Bolsonaro passou a compor o arcabouço investigatório. Em especial, o trecho que fala da minuta pesa como uma confirmação de que Bolsonaro teria tido não apenas conhecimento como também acesso ao documento.
Diante do fechamento do cerco a Bolsonaro e seus ministros diretamente envolvidos na trama golpista, Mendes avalia que o ato foi um movimento para mostrar que o presidente ainda teria apoio popular. Mas, ponderou, “isso não muda uma linha em relação às investigações, nem qualquer juízo ou entendimento do STF”.
A análise vai ao encontro de percepção da opinião pública captada por pesquisa Genial/Quaest divulgada nesta semana. Segundo o levantamento, dentre aqueles que tiveram conhecimento da manifestação, 48% acreditam que a mesma não terá influência no andamento das investigações, contra 34% que acham o contrário. Além disso, 50% acham que seria justo Bolsonaro ser preso — contra 39% que disseram ser injusto e 10% que não souberam avaliar.
Anistia não faz sentido
Outro ponto colocado por Gilmar Mendes diz respeito ao discurso de Bolsonaro sobre a anistia aos golpistas que atacaram as sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Para justificar sua posição, Bolsonaro introduziu a questão argumentando que estaria buscando “uma pacificação”, passando uma “borracha no passado”. Em seguida, pediu anistia “para aqueles pobres coitados presos em Brasília”.
Na avaliação de Mendes, o pedido “não faz o menor sentido”. E completou: “Estamos falando da ameaça mais grave à democracia em todos esses anos pós-ditadura. Aqueles que tiveram participação menor no evento já foram consagrados com medidas muito mais leves. A maioria dessas pessoas foi liberada. Essa dosimetria a Justiça já está fazendo”.
Como forma de patrolar a Justiça e garantir a impunidade dos golpistas, o ex-vice-presidente de Bolsonaro e atual senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), apresentou projeto de lei que propõe a anistia para os acusados.
A tentativa de “limpar a barra” dos golpistas também foi criticada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante entrevista ao jornalista Kennedy Alencar na Rede TV, nesta terça-feira (27). “Quando o cidadão lá pede anistia, ele tá dizendo: ‘Não, perdoe os golpistas’. Tá confessando o crime”, afirmou Lula.
Nesse sentido, o presidente Lula enfatizou que é contra qualquer projeto de anistia aos golpistas e ressaltou que as investigações sobre o 8 de Janeiro ainda estão em curso. “Eles nem foram julgados ainda, eles estão presos como garantia da paz e da ordem deste país. Ainda não se descobriu quem mandou, financiou, porque houve uma tentativa de golpe”, declarou.
Com agências