Israel pediu a demissão de Francesca Albanese, relatora da ONU que denuncia massacre em Gaza | Foto: ONU

Diante da ameaça de Israel de desencadear uma carnificina em Rafah, cidade para a qual forçou 1 milhão de palestinos a se deslocarem, e de incendiar de vez o Oriente Médio, mais vozes de repúdio na comunidade internacional se pronunciaram na segunda-feira (12).

Em entrevista ao jornal britânico The Guardian, a Relatora Especial da ONU para os Territórios Palestinos Ocupados, Francesca Albanese, disse acreditar que Israel está desafiando as decisões da Corte Judicial Internacional, emitidas há duas semanas, e que determinam que tome medidas imediatas para proteger os direitos dos palestinos e cesse todas as atividades que possam constituir genocídio.

“PERSONA NON GRATA”

Em represália ao comentário, o governo Netanyahu decretou que ela é uma “persona non grata” e a proibiu de entrar em Israel para cumprir seus deveres de Relatora da ONU. Antes, Israel já pedira a renúncia do secretário-geral Guterres e do comissário-geral da agência de assistência aos refugiados, Philippe Lazzarini.

“As mortes não são apenas o resultado de bombardeios e ataques de franco-atiradores”, disse a relatora especial. “Também ocorrem devido à escassez de suprimentos médicos e tratamento e, o que é mais preocupante, devido ao acesso inadequado a alimentos e água potável, forçando o consumo de água contaminada ou poluída.”

Desde a ordem judicial da CIJ, pelo menos 1.755 palestinos foram mortos em Gaza. Em sua conta X, Albanese afirmou que “desafiando as medidas provisórias da CIJ, a escalada de ISR (Israel) em Gaza levou a centenas de vítimas, mais devastação e deslocamento forçado. ISR é obrigada a cumprir a ordem do Tribunal e os estados devem agir de forma decisiva para evitar novas atrocidades.”

CORTE DE HAIA

O governo israelense tem até 23 de fevereiro para informar a CIJ sobre o que fez para cumprir as seis medidas de emergência emitidas pelo tribunal, em resposta ao pedido da África do Sul, o Estado símbolo da luta contra o apartheid, o racismo e o fascismo, de investigação de genocídio e intenção de genocídio perpetrado por Israel em Gaza.

CHEFE DA DIPLOMACIA DA UE PEDE “MENOS ARMAS A ISRAEL”

O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, se disse “extremamente preocupado”, à margem da reunião em Bruxelas de ministros sobre o curso dos acontecimentos em Gaza.

Borrell disse ainda que “se você acredita que muitas pessoas estão sendo mortas, talvez deva fornecer menos armas para evitar que tantas pessoas sejam mortas” – comentário que analistas acreditam ter como alvo o presidente Joe Biden.

Ele acrescentou que os governos que acreditam que “isso é uma matança, que muitas pessoas estão sendo mortas, talvez tenham que pensar no fornecimento de armas” – uma carapuça que serve também a vários governos europeus.

“Todo mundo vai para Tel Aviv, implorando: ‘Por favor, não faça isso, proteja os civis, não mate tantos’. Quantos são demais?” perguntou Borrell. “É um pouco contraditório continuar dizendo que há ‘muitas pessoas sendo mortas, muitas pessoas sendo mortas, por favor, cuidem das pessoas, por favor, não matem tantas’. Pare de dizer por favor e [faça] alguma coisa.”

O ministro das Relações Exteriores da França, Stephane Sejourne, advertiu que um ataque a Rafah seria “injustificado” e o chanceler inglês, David Cameron, dirigiu um alerta a Israel, pedindo para “pensar seriamente” antes do ataque terrestre a Rafah.

“Estamos muito preocupados com a situação e queremos que Israel pare e pense seriamente antes de tomar qualquer ação adicional”, disse Cameron a repórteres durante uma visita à Escócia. Não se sabe se o comentário é por receio de o caldo entornar de vez, ou temor de que a autoincriminação na CIJ não pare.

Em nome do secretário-geral Antonio Guterres, seu porta-voz, Stephane Dujarric, disse que a ONU “não fará parte” de deslocamento forçado em Rafah, subproduto óbvio de um assalto por tropas terrestres.

“Não faremos parte do deslocamento forçado de pessoas”, disse o porta-voz Stephane Dujarric a repórteres. “Do jeito que está, não há nenhum lugar que esteja seguro atualmente em Gaza.”

“Você não pode enviar pessoas de volta para áreas que estão repletas de munições não detonadas, para não mencionar a falta de abrigo”, disse Dujarric, referindo-se a partes do norte e centro da Faixa de Gaza.

ABDULLAH

O mundo “não pode permitir-se um ataque israelense a Rafah” que “certamente produzirá outra catástrofe humanitária”, afirmou o rei da Jordânia, Abdullah, em visita em caráter de emergência a Washington, para um encontro com Biden. Mais de 100 mil palestinos, ele denunciou, foram “mortos, feridos ou continuam desaparecidos” em Gaza. Ele exigiu um “cessar-fogo duradouro” e esforços renovados para levar mais ajuda a Gaza.

O papel da UNRWA [a agência da ONU para ajuda aos refugiados palestinos] é indispensável, e é “imperativo” que continue a receber apoio, acrescentou o rei jordaniano. Ele pediu ainda ao mundo que não ignore a situação na Cisjordânia ocupada e em Jerusalém Oriental, onde a expansão de assentamentos israelenses ilegais e a escalada de colonos extremistas ameaçam “desencadear o caos em toda a região”.

“Não pode haver paz sem uma solução política que leve a um Estado palestino independente, soberano e viável, com Jerusalém Oriental como sua capital”.

“Todos os ataques contra civis, mulheres e crianças inocentes, incluindo os de 7 de outubro, não podem ser aceitos por nenhum muçulmano”, e os horrores dos últimos meses não devem ser “repetidos ou aceitos”.

Segundo as agências internacionais, Biden teria instado Netanyahu a ter um plano “crível” para “proteger os civis” em Rafah.

ISRAEL ELIMINA FAMÍLIAS INTEIRAS, DENUNCIA ANISTIA

De acordo com a Anistia Internacional, as evidências mostram que as forças israelenses estão desrespeitando o Direito Internacional Humanitário em suas operações militares em Gaza. Pelo menos 95 civis morreram, sendo 42 crianças, em quatro ataques aéreos israelenses, segundo novo relatório da entidade.

Um ataque a duas casas pertencentes à família Harb, no distrito de Al-Zuhour, em 12 de dezembro, matou 25 civis, incluindo 10 crianças. Outro ataque em 14 de dezembro matou 30, incluindo 11 crianças. Em 19 de dezembro, um ataque à casa da família Zu’rub, no oeste de Rafa, matou 22 civis, incluindo 11 crianças. E em 9 de janeiro, um ataque à casa da família Nofa em Tal Al-Sultan matou 18 civis, incluindo 10 crianças.

“Esses ataques ilustram um padrão contínuo de forças israelenses desrespeitando descaradamente o direito internacional, contradizendo as alegações das autoridades israelenses de que suas forças estão tomando precauções reforçadas para minimizar os danos aos civis”, disse a diretora sênior da Anistia Internacional, Erika Guevara-Rosas, diante dos ataques que eliminam famílias inteiras.

“À luz da escala terrível de morte e destruição, todos os Estados têm uma obrigação clara de agir para prevenir o genocídio, mas, em vez disso, os Estados-chave falharam em fazer um apelo claro por um cessar-fogo e continuam a alimentar crimes de guerra fornecendo armas a Israel.”

“Os testemunhos que os sobreviventes enlutados compartilharam devem servir como um lembrete de que esses crimes atrozes em Gaza são uma mancha na consciência coletiva do mundo.”

Para o relatório, a Anistia visitou o local dos quatro ataques, tirou fotos e vídeos e conversou com 18 sobreviventes e socorristas. Três dos quatro ataques ocorreram à noite, e nenhum dos moradores dos prédios visados recebeu qualquer aviso prévio.

Fonte: Papiro