Destruição em Hawara causada por ataque de colonos fanatizados | Foto: Ronaldo Schmidt/AFP

Quatro assaltantes de terra palestina na Cisjordânia – israelenses que se autodenominam ‘colonos’ – foram sancionados na quinta-feira (1º) pelo governo Biden por “incendiar edifícios, campos e veículos; agredir civis e danificar bens”, um gesto muito raro da Casa Branca, sempre pronta a assinar um cheque em branco para o regime de Israel.

David Chai Chasdai, Einan Tanjil, Shalom Zicherman e Yinon Levi terão possíveis ativos financeiros nos EUA bloqueados e não terão visto para viajar aos EUA, segundo o Departamento de Estado.

De acordo com o Palestine Chronicle, são 700 mil os ‘colonos’ israelenses, que vivem em 164 assentamentos ilegais sob a lei internacional, além de 116 postos avançados na Cisjordânia ocupada. Seus crimes e provocações contra a população palestina se intensificaram após a operação do Hamas contra a ocupação em 7 de outubro.

Mais de 370 palestinos já foram mortos na Cisjordânia e quase 4.400 outros feridos pelas forças israelenses, de acordo com o Ministério da Saúde palestino. 6 mil foram presos.

Desses palestinos assassinados, 360 foram mortos por forças israelenses, oito por colonos israelenses e dois por forças israelenses ou colonos.

Pelas estimativas da ONU, os ataques de colonos contra palestinos mais do que dobraram desde 7 de outubro. A violência admitida agora pelo Departamento de Estado é a reedição dos pogroms que atingiam os judeus no Império Russo, só que agora contra os palestinos.

Em um comunicado, o secretário de Estado Antony Blinken afirmou que “Israel deve fazer mais para parar a violência contra civis na Cisjordânia e deter os responsáveis por isso.”

TAPINHA NA MÃO DE GVIR

Vindo de um governo cujo presidente já disse que “se Israel não existisse, teríamos de inventar para defender os interesses norte-americanos”, mesmo um tapinha na mão do cúmplice de Netanyahu, Itamar Gvir, não deve ser desprezado – nem superestimado.

Ainda mais depois de Washington ter retaliado a decisão da Corte Internacional de Justiça da ONU, que decidiu seguir em frente com o processo apresentado pela África do Sul, contra Israel, por genocídio, ameaçando adicionar ao genocídio pelas armas que fornece, o genocídio pela fome, via asfixia financeira da agência de assistência da ONU aos refugiados palestinos, de que dependem para sobreviver os 2,3 milhões de palestinos sob ataque.

O portal Axios registrou que a “ordem executiva sem precedentes” foi assinada horas antes do presidente Biden viajar para Michigan, “um dos principais epicentros da indignação árabe-americana com a guerra em Gaza”.

O momento pode ter sido coincidência – observa Axios -, mas o governo Biden está “ansioso para apresentar resultados aos eleitores árabes e muçulmanos americanos que ameaçaram se omitir ou trabalhar ativamente para derrotar o presidente por seu apoio a Israel”.

“Essas comunidades – para não mencionar as gerações mais jovens alienadas pelas políticas de Biden em relação a Gaza – normalmente votam democratas por amplas margens.”

INDIGNAÇÃO EM MICHIGAN

“Uma grande deserção colocaria em risco a coalizão de Biden em 2020: em Michigan, por exemplo, Biden venceu por 154 mil votos. Estimativas do censo colocam a população árabe americana do estado em torno de pelo menos 278.000”, registrou o portal.

Biden não enfrenta um adversário sério nas primárias democratas de Michigan em 27 de fevereiro, mas o comparecimento e a margem de vitória podem oferecer um teste importante dos obstáculos à frente.

Axios apontou, ainda, que Biden “não se encontrou com nenhum líder da comunidade muçulmana ou árabe em sua visita à área de Detroit”. Protestos pró-palestinos foram realizados na noite de quarta-feira em Dearborn, Michigan – lar da maior população muçulmana per capita do país.

Alguns líderes comunitários palestino-americanos recusaram um convite para se reunir com Blinken, dizendo que “não podem imaginar” o que ele poderia ter a dizer depois de “quase quatro meses insuportáveis”.

Na semana passada, algumas autoridades eleitas árabe-americanas se recusaram a se reunir com a gerente de campanha de Biden em Michigan, Julie Chávez Rodríguez, – chamando de “desumanizante” discutir política eleitoral enquanto a guerra está em andamento.

“Quando você envia funcionários de campanha como a primeira delegação a esta comunidade para se reunir conosco pela primeira vez, isso envia uma mensagem de que este é puramente um problema político que você vê”, disse o prefeito de Dearborn, Abdullah Hammoud, à PBS Newshour.

DILEMAS DE BIDEN

Axios faz a ressalva, porém, de que “Biden vem perdendo a paciência com o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, há semanas”. De acordo com o portal, o Departamento de Estado começou a conduzir uma revisão de possíveis opções políticas para o reconhecimento internacional e americano de um Estado palestino após a guerra.

“Alguns dentro do governo Biden agora pensam que o reconhecimento de um Estado palestino deve ser o primeiro passo nas negociações para resolver o conflito israelense-palestino, em vez do último”, disse a Axiox  um alto funcionário dos EUA. O portal acrescenta que “autoridades sauditas deixaram claro pública e privadamente desde 7 de outubro que qualquer potencial acordo de normalização com Israel estaria condicionado à criação de um caminho ‘irrevogável’ para um Estado palestino”.

Entre as opções em análise por Washington, segundo o portal, está “não usar seu veto para impedir o Conselho de Segurança da ONU de admitir a Palestina como um Estado-membro pleno da ONU”. Em 2012, a Assembleia Geral da ONU aceitou a Palestina como Estado observador, mas não lhe deu a adesão plena. O Estado palestino visualizado por Blinken seria “desmilitarizado, com base em outros modelos de todo o mundo”.

Um porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca disse que “tem sido política de longa data dos EUA que qualquer reconhecimento de um Estado palestino deve vir por meio de negociações diretas entre as partes, em vez de por meio de reconhecimento unilateral na ONU”, política que “não mudou”.

Axios também destacou a declaração do ministro britânico das Relações Exteriores e ex-primeiro-ministro, David Cameron, de que o Reino Unido está considerando o reconhecimento da Palestina como parte de seus planos para o dia seguinte à guerra em Gaza. “Nós, com aliados, analisaremos a questão do reconhecimento de um Estado palestino, inclusive nas Nações Unidas (…) isso pode ser uma das coisas que ajude a tornar esse processo irreversível”, ele disse.

‘QUEREM A TERRA SEM PALESTINOS’

Recente reportagem da BBC na Cisjordânia registrou os pogroms dos ‘colonos’ contra a população palestina.  

Como no caso da escola da pequena aldeia palestina nas colinas a sul de Hebron, Khirbet Zanuta, destruída, junto com a maioria das casas do local, por uma escavadora. A população de cerca de 200 palestinos tivera de fugir após pressão contínua de colonos israelenses armados e agressivos.  

A visita da BBC foi acompanhada por Nadav Weiman, ex-soldado das forças especiais israelenses que agora é ativista do Breaking the Silence, um grupo de ex-combatentes que faz campanha contra a ocupação israelense de territórios palestinos.

“Eles estão demolindo aldeias palestinas, espancando agricultores palestinos, roubando suas azeitonas, tentando abrir uma terceira frente, uma frente oriental contra os palestinos na Cisjordânia. Por quê? Porque eles querem a terra sem palestinos”, denunciou Weiman.

POGROMS

Realidade capturada num vídeo feito por Muntassar Mhilat, um jovem palestino de uma família de beduínos que vive no deserto da Judeia, não muito longe de Jericó. A casa de sua família – acrescenta a reportagem – foi invadida por cerca de 20 homens judeus armados e violentos. Muntassar os filmou gritando e apontando armas.

“Ele estava atirando no meu tio, então corri até lá e o confrontei. Estávamos empurrando um ao outro e gritando, cara a cara. E eu estava filmando ele. Então, cerca de 20 colonos vieram.”

Os colonos os acusaram, falsamente segundo a família, de roubar suas cabras. O vídeo mostra um colono, que usa uma jaqueta de policial, carregando seu rifle de assalto M-16 e apontando-o para a família.

Uma das mulheres presentes, Umm Omar, carregando um bebê de um mês, pensou que eles estavam prestes a morrer. “Eles atacaram a nossa casa, roubaram as nossas ovelhas, ameaçaram os meus filhos com armas e me ameaçaram. Depois bateram em mim e na irmã do meu marido. Eu pensei que eles iriam nos massacrar.”

A sul de Hebron, os agricultores palestinos “estão arando com um burro porque os colonos judeus locais ameaçaram destruir o seu trator se eles o utilizarem”.

Quase no outro extremo da Cisjordânia, numa aldeia perto de Nablus chamada Burin, o agricultor Ahmed Tirawi viu as azeitonas nas suas oliveiras do outro lado do vale começando a apodrecer porque foi proibido pelos colonos locais de as colher sob ameaça de morte, relata a BBC.

“Meus sentimentos são mais do que raiva. É uma grande humilhação estar tão sozinho e incapaz de se proteger. A única solução é o direito internacional, dois Estados, e proteger as pessoas da ocupação israelense.”

Fonte: Papiro