Palestinos em busca de comida na cidade Rafah, sul da Faixa de Gaza | Foto: Fatima Shair/AP

Um quarto da população palestina de Gaza – cerca de meio milhão de pessoas – enfrentam uma “fome catastrófica” segundo alerta da ONU, que está sendo respaldada por mais denúncias diariamente. “Essas não são condições para os seres humanos”, disse a diretora de comunicação da agência da ONU para refugiados da Palestina, Juliette Touma.

O “cerco completo” que Israel declarou a Gaza, com as entregas de alimentos, água potável, combustível e outras ajudas severamente reduzidas, deixou “meio milhão de pessoas literalmente passando fome” quase quatro meses após o ataque, disse o economista-chefe do Programa Mundial de Alimentos (PMA) no início desta semana.

Na sexta-feira (26), uma organização de ajuda humanitária que existe desde 1972 e financiada principalmente por países europeus, atua em 43 países e de sede em Johanesburgo, a  Actionaid, denunciou que em Gaza as pessoas “estão tão desesperadas por comida que estão triturando ração animal para usar como farinha”. “A fome está se aproximando em todo o território” de Gaza, advertiu.

A Actionaid citou a denúncia do Programa Mundial de Alimentos da ONU, de que “nenhuma das 335.000 crianças menores de cinco anos de Gaza está recebendo nutrição suficiente, de acordo com o Programa Mundial de Alimentos, o que corre o risco de prejudicar seu crescimento e causar complicações de saúde ao longo da vida” e que algumas novas mães “estão tão desnutridas que não conseguem produzir leite para seus filhos.”

De acordo com a Actionaid, “apenas 15 das 97 padarias de Gaza estão agora funcionais e todas elas estão no sul: não há padarias operando no norte”. A organização humanitária também ressaltou a escassez de água; a pessoa média em Gaza “agora só tem acesso a entre 1,5 e 2 litros de água por dia para todas as suas necessidades, incluindo beber, lavar e limpar”.

“Apenas uma das três tubulações de água de Israel para Gaza estão funcionando e a quantidade de água disponível nos poços municipais – que é salobra e abaixo do padrão – caiu para um décimo de seu nível anterior a 7 de outubro”, disse a instituição citando dados da UNOCHA.

Todas as pessoas em Gaza neste momento estão passando fome e a situação só está piorando, disse Riham Jafari, coordenador de defesa e comunicação da ActionAid Palestine, segundo o Palestine Chronicle. Ele citou famílias que só tiveram um único pedaço de pão para dividir durante o dia inteiro. “Algumas pessoas estão tão desesperadas que estão triturando ração animal para usar como farinha. Muitos não têm escolha a não ser beber água suja e contaminada e estão adoecendo como resultado.”

Para Jafari, o que é mais trágico sobre fome em Gaza é que ela era “completamente evitável”. “Há semanas, as organizações humanitárias têm soado o alarme de que a fome está se aproximando, mas o número de caminhões de ajuda autorizados a entrar em Gaza continua muito baixo”, ele acrescentou.

No início da semana, apesar dessas e outras advertências sobre o desastre humanitário em curso em Gaza sob o ataque das tropas coloniais israelenses, um certo coronel Elad Goren, chefe da agência israelense que supervisiona a política para as regiões palestinas, disse que os relatos de um desastre humanitário em Gaza são “exagerados”.

“O abuso cínico do Hamas da infraestrutura médica e de outras infraestruturas humanitárias tem a intenção de fazer parecer que há uma crise humanitária na Faixa de Gaza”, asseverou Goren.

Sob o clima de incitamento ao genocídio que prevalece em Israel, desde as mais altas instâncias do Estado, grupos de fanáticos vêm há três dias impedindo a entrada de caminhões da ajuda humanitária pela passagem de Kerem Shalon.

Bloqueio que ocorre dias após o Observatório Euro Mediterrâneo de Direitos Humanos (EuroMed) denunciar que as tropas israelenses lançaram um ataque com projéteis de artilharia, munição real e drones contra “centenas de civis famintos” que esperavam perto da Cidade de Gaza por “caminhões da ONU que transportavam suprimentos de ajuda limitados” e que estavam isolados da ajuda humanitária há semanas.  

O ataque ocorreu na rotunda do Kuwait; 20 pessoas morreram e 150 ficaram feridas. Tanques israelenses bombardearam a multidão e dispararam munição real. Também usaram drones. As autoridades informaram que o número de mortos deve aumentar drasticamente, já que muitos dos feridos são graves. Os sobreviventes estão sendo tratados no Hospital Al Shifa, que está sem suprimentos médicos e tem apenas uma equipe muito reduzida. Em novembro, soldados das FDI bombardearam e invadiram o hospital, que era o maior de Gaza antes da investida genocida de Israel.

MASSACRES EM KHAN YOUNIS

Mais ao sul, em Khan Younis, Israel intensificou seus ataques indiscriminados contra civis, infraestruturas e áreas residenciais, além de cercar e bloquear os dois hospitais restantes na cidade, Al Nasser e Al Amal.

A agência de direitos humanos da ONU informou que “ninguém pode entrar ou sair” do Hospital Nasser, incluindo 400 pacientes em diálise. O hospital ficou sem alimentos, anestésicos e analgésicos.

Na noite de quinta-feira, o Ministério da Saúde de Gaza informou que tanques estavam bombardeando consistentemente a área circundante e drones estavam disparando mísseis em direção ao centro médico, indicando preparativos avançados para um ataque ao estilo do perpetrado contra o Al Shifa.

“A situação em Khan Younis ressalta um fracasso consistente em defender os princípios fundamentais do Direito Internacional Humanitário: distinção, proporcionalidade e precauções na realização de ataques”, disse o chefe da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (UNRWA), Thomas White. “Isso é inaceitável e abominável e deve parar.”

O número de mortos após um ataque israelense a um abrigo da ONU na cidade na quarta-feira subiu para 13. Este centro abriga dezenas de milhares de civis deslocados e foi alvo de projéteis e tiros de armas pequenas das forças israelenses. Outras 75 pessoas ficaram feridas, 15 delas em estado crítico.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) afirmou na quinta-feira que menos de 20% do território de Gaza, ou 60 quilômetros quadrados, está fornecendo refúgio a 1,5 milhão de pessoas, cerca de dois terços da população de Gaza. E advertiu que “a dramática escalada dos combates ameaça sua sobrevivência”.

O sistema médico em Gaza corre o risco de colapso total, alertou o chefe do escritório do CICV no enclave, William Schomburg. “Todos os hospitais em funcionamento na Faixa de Gaza estão superlotados e com escassez de suprimentos médicos, combustível, comida e água”, disse ele. “Muitos estão abrigando milhares de famílias deslocadas. E agora mais duas instalações correm o risco de serem perdidas devido aos combates.”

Fonte: Papiro