Lei que anistiou Bolsonaro é condescendente com a impunidade, diz AGU
A Advocacia-Geral da União (AGU) apresentou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta segunda-feira (11), na qual defende ser inconstitucional a lei que perdoa multas aplicadas em razão do descumprimento de medidas sanitárias contra Covid-19. A anistia, sancionada pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, beneficiou diretamente seu padrinho político, o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A manifestação da AGU defende a procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.510, apresentada pelo PT, e que tem como como foco a Lei 17.843/2023. Além disso, argumenta que a medida é “condescendente com a impunidade e com o descumprimento de regras impostas a toda coletividade”.
O artigo 36 da lei em questão estabelece o cancelamento das “multas administrativas, bem como os respectivos consectários legais, aplicadas por agentes públicos estaduais em razão do descumprimento de obrigações impostas para a prevenção e o enfrentamento da pandemia de Covid-19”.
Na ADI, cuja relatoria foi distribuída ao ministro Luiz Fux, o PT defende que o cancelamento legal das multas administrativas afrontaria o direito constitucional à saúde e esvaziaria o caráter punitivo e pedagógico da penalidade, além de desconstituir políticas públicas já implementadas sobre a matéria.
Proteção à vida e à saúde pública
Na manifestação, a AGU argumenta ser “fato notório que a pandemia decorrente do alastramento das infecções pela Covid-19 produziu efeitos nefastos sobre a saúde pública, a dinâmica social e a economia que atingiram não apenas o Brasil, mas o mundo todo. Nesse contexto, foi decretada situação de calamidade pública, a qual demandou das autoridades brasileiras, em todos os níveis de governo, a efetiva e concreta proteção à vida e à saúde pública, com a adoção de diversas medidas legislativas, tributárias e administrativas pelos Poderes Públicos locais”.
Também destacou que “tendo em vista a forte linha jurisprudencial contra a apatia no combate ao Covid-19, governadores e prefeitos de muitas localidades do país se houveram de maneira responsável para evitar uma tragédia ainda mais drástica sobre a saúde da população, tomando a dianteira da política sanitária pela edição de atos normativos que impuseram medidas restritivas destinadas a minimizar a disseminação do vírus”.
Em contrapartida, a defesa do Governo do Estado nos autos do processo argumenta que a nova lei levava em consideração que o período crítico da pandemia foi superado; que as finalidades de proteção sanitária dos decretos estaduais foram cumpridas; que a cobrança das multas seria atividade administrativa dispendiosa e que a anistia contribuiria com o desenvolvimento econômico e social.
Neste aspecto, a AGU alega: “Ainda que a Organização Mundial da Saúde tenha reconhecido, em maio de 2023, que a Covid-19 já não representava mais emergência sanitária de caráter global, é inconteste que as multas aplicadas durante a vigência desse período só podem conscientizar a população sobre a seriedade das medidas então tomadas se forem exigidas e recolhidas, por meio de regular procedimento administrativo”.
A AGU diz, ainda, que “ao optar por um modelo de leniência geral e incondicionada para beneficiar infratores de medidas sanitárias (independentemente da gravidade do ato infracional, do caráter reiterado da conduta ou de qualquer outro dado contextual), o Estado de São Paulo — longe de promover qualquer tipo de desenvolvimento social — incorreu em atitude contrastante com o dever de proteção da saúde pública”.
Atitude irresponsável
Em diversos eventos dos quais participou no estado ao longo da pandemia, Bolsonaro promoveu aglomerações com centenas de pessoas e não utilizou máscara, assim como parte de seus apoiadores, em desacordo com decretos estabelecidos durante o mandato de João Dória.
Bolsonaro foi autuado ao menos oito vezes por esses atos e somou mais de R$ 1,1 milhão em multas. No início de novembro, Tarcísio sancionou projeto de lei que altera regras para cobrança da dívida ativa em São Paulo e que, na prática, significou anistiar quem cometeu infrações como essas. O filho do ex-presidente, deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), entre outros, também se beneficiou, já que tinha uma dívida de R$ 137 mil.