Abraço dos fascistas Milei e Zelensky | Foto: Reprodução

O chefe do regime de Kiev, Volodymyr Zelensky, cruzou o oceano para ir à posse do fascista Javier Milei na presidência da Argentina e, pessoalmente, trazer o abraço da turma do Azov, Setor Direita e outros porta-suásticas ucranianos aos hermanos recém empoderados nos pampas.

Para a ocasião, Zelensky escolheu trajar uma “camisa-preta”, símbolo dos fascistas desde a Marcha a Roma de Mussolini, enfeitada com um “Trizub” (tridente), muito apreciado nas marchas com tochas em homenagem a Bandera.

Foi calorosamente recebido pelo fascista argentino, que manteve com ele sua primeira bilateral com outro chefe de governo, na Casa Rosada, em que registraram a identidade que os une, do fascismo ao entreguismo, passando pela sabujice aos EUA.

Também o chefe dos fascistas espanhóis, do Vox, Santiago Abascal, fez questão de vir à posse de Milei, acompanhado pelo rei da Espanha, Felipe VI. A presidente fascista da Itália, Giorgia Meloni, não veio mas mandou uma mensagem carinhosa e uma ministra para a representar. Trump, muito atarefado com nova audiência em um tribunal de Nova Iorque que investiga suas fraudes, não veio.

Apesar da babação em relação aos EUA, o governo Biden não lhe deu bola, por considerá-lo um trunfo de Trump, e quem representou Washington foi o embaixador Marc Stanley. A China se fez representar por Wu Weihua, vice-presidente do Comitê Permanente da Assembleia Popular Nacional.

O comparecimento da América Latina foi sofrível. O presidente do Chile, Gabriel Boric foi, assim como Luis Lacalle Pou (Uruguai) e Santiago Peña (Paraguai). O Brasil enviou o ministro das Relações Externas, Mauro Vieira.

Jair Bolsonaro, que foi a Buenos Aires festejar a vitória do fascista hermano, ao tentar se infiltrar em uma foto de Milei com chefes de Estado latino-americanos, acabou sendo barrado no baile.

Entre os presidentes latino-americanos, dois não podiam deixar de vir, o barão da banana recém empossado no Equador para um mandato tampão, Daniel Noboa, e o rei do bitcoin da América Central, o presidente de El Salvador, Nayib Armando Bukele.

Dois que podem contar, de viva voz, a Milei como é viver em um dos três países do planeta que não têm moeda própria e usam no lugar o dólar. Miraculoso óleo de cobra vendido por Milei insistentemente, mas que terá que adiar sine die, até porque não há como dolarizar sem ter dólares para movimentar.

CHOQUE E PAVOR ULTRALIBERAL

Em seu discurso de posse, o fascista Milei anunciou aos argentinos o que os espera em sua presidência: nada de gradualismo, os pobres, os trabalhadores, a indústria nacional, que se explodam. “Não há alternativa ao ajuste, não há alternativa ao choque”.

Devastação que, segundo Milei, abre “uma nova era” em que o país voltará a ser como “no século XIX” – atenção, século XIX! -, em que, segundo ele, supostamente a Argentina era a “1ª potência mundial”, a “luz do Ocidente”.

No único momento de seu discurso em que teve algum vínculo com a realidade, Milei admitiu que “naturalmente, haverá um impacto negativo no nível de atividade, de emprego, nos salários reais, no número de pobres e indigentes”.

Ou como disse o chefe dos seus conselheiros econômicos, Carlos Rodríguez: “há que sofrer, para aprendam que as coisas custam (…) e sim, vão sofrer, não há mais remédio, isto é uma guerra”.

Na véspera, um colunista do Página 12 comparara a posse de Milei com o momento em que o Titanic se chocou com o iceberg, enquanto os passageiros de terceira classe eram arremessados nas águas frígidas do Ártico na noite escura e os passageiros da primeira classe conseguiam um lugar em um bote salva-vidas.

De acordo com o diagnóstico do fascista, o problema da Argentina nos últimos 100 anos é que “nossa liderança decidiu abandonar o modelo que nos enriqueceu e abraçou as ideias empobrecedoras do coletivismo.” O que só piorou com o “kirchnerismo” e o “populismo”, sobre quem tentou jogar a culpa pela “herança maldita”, fazendo de conta que a ida do comparsa Macri ao FMI não foi o que fez a casa cair.

Milei recebeu a faixa do ex-presidente Alberto Fernández e, em uma cerimônia no Congresso, ele jurou a Constituição por um período de quatro anos perante a vice-presidente cessante Cristina Fernández de Kirchner.

Depois, nas escadarias, de costas para o Congresso, Milei recebeu da turba de apoiadores que o saudavam entusiasticamente, como resposta, “motosserra, motosserra, motosserra!!”

Para apavorar o povo argentino e tentar demover qualquer resistência ao desmonte planejado, Milei mentiu escandalosamente no discurso alegando que a inflação herdada do atual governo seria de 15.000% anuais, sob suposições que não se sustentariam em qualquer faculdade de economia ou diante de um tribunal.

Exagerou a dívida argentina ao ponto de dizer que chegaria a 500 bilhões de dólares. Anunciou, ainda, que não realizará obras públicas em nenhum recanto da Argentina, a não ser que haja financiamento externo. Ameaçou manifestantes se “bloquearem as ruas”.

E concluiu seu discurso com sua marca registrada de “viva a liberdade, carajo!”. Há fascistas mais fascinados por outra versão: “viva a morte!”.

Para compor uma base no Congresso que o permita perpetrar o desmonte do Estado argentino e dos direitos sociais e privatizar a rodo, Milei teve de compor com Macri, e por isso algumas ideias mais estapafúrdias, como o “mercado de órgãos humanos” possivelmente terão que esperar. Assim como o próprio fechamento do BC argentino (para que precisa de um, se já tem o Fed?) e até a dolarização.

O DESGOVERNO AVANÇA

Em seu primeiro decreto, Milei reduziu os 18 ministérios a nove, imitando o estilo Bolsonaro de desgovernar, enquanto o ex-presidente Mauricio Macri desfila como novo delfim da política argentina.

Seu ministério é constituído por Luís Caputo (Economia, ex-ministro de Macri); Diana Mondino (Relações Exteriores); Patricia Bullrich (Segurança, ex-candidata a presidente do macrismo); Guillermo Francos (Interior); Luis Petri (Defesa); Mariano Cúneo Libarona (Justiça); Mario Russo (Saúde); Guilhermo Ferraro (Infraestrutura, que unifica Transporte, Obras Públicas, Minas, Energia e Comunicações); e Sandra Pettovello (‘Capital Humano’, que unifica Trabalho, Educação e Desenvolvimento Social). Ele eliminou os ministérios da Cultura, Meio Ambiente, Mulheres e Ciência e Tecnologia.

Segundo Caputo, o pacote deve levar a um corte de 5,5% do PIB (Produto Interno Bruto) da Argentina. Ele disse ainda que a “âncora do programa é fiscal” e que o governo visa a fechar o ano que vem com déficit zero.

O novo Congresso argentino foi instalado na quinta-feira com a bancada que apoia o presidente eleito Javier Milei em minoria nas duas câmaras. Também na quinta-feira, em sua manifestação semanal como fazem há mais de 40 anos, as Mães da Plaza de Mayo exibiram uma faixa: “Ninguém está disposto a perder todos os seus direitos”.

AS VÍTIMAS DE SEMPRE

Para o economista argentino Alfredo Zaiat, como registrou o jornal Página 12, “a principal restrição da economia argentina que a mantém em permanente instabilidade é a relativa escassez de dólares no Banco Central”.

“Se esta condição não for colocada no centro da análise, qualquer avaliação da herança econômica de um governo para outro se torna muito frágil”.

“Os números do déficit fiscal, do déficit parafiscal do Banco Central, da dívida com os importadores, da dívida pública de vencimento imediato, da dívida total e de muitas outras variáveis” apresentados por Milei em seu discurso são “números exagerados para justificar um ajustamento regressivo e enfatizar a sua inevitabilidade”. Como repetiu Milei, sem alternativa ao ajuste ou choque.

O ajuste planejado é “desnecessário e fundamentalmente injusto”, afirmou Zaiat. Para ele, os poderosos meios de comunicação e aparatos políticos de direita decidiram ignorar o pesado legado do governo Macri e, mais ainda, questionar aqueles que apontaram o imenso condicionamento que restou daquela experiência traumática.

“Não é segredo que culpar o Estado e as políticas expansionistas pela ampliação de direitos permite a impunidade e o retorno dos responsáveis pelas experiências neoliberais e seus herdeiros que mergulharam o país numa crise de proporções.”

“Desta forma, depois de Alfredo Martínez de Hoz (ditadura militar 1976-1983), surgiram Domingo Cavallo (Menem e De la Rúa 1989-2001) e depois Alfonso Prat-Gay, Federico Sturzenegger, Luis Caputo, Nicolás Dujovne e Guido Sandleris (Juntos Pela Mudança 2015-2019)”.

Esta impunidade – acrescenta Zaiat -explica porque a equipe econômica de Milei é agora liderada por Luis Caputo [ex-JPMorgan] juntamente com a casta dos financistas. “São iguais, com a mesma receita e com a escolha das mesmas vítimas na repetição do ajuste conhecido”.

DESINDUSTRIALIZAÇÃO

Primeiro a ditadura militar, depois o menemismo, depois o macrismo e o que vem do governo Milei são projetos políticos que procuraram e continuam a procurar modificar o regime social de acumulação através do desmantelamento da industrialização baseada na substituição de importações, enfatizou o economista argentino.

Para Zaiat, não se deve cair na armadilha de fazer um diagnóstico errado sobre a crise no governo Fernández. “A má gestão de grandes excedentes de dólares comerciais num contexto internacional complexo (pandemia, aumento das taxas de juro internacionais e guerra Ucrânia-Rússia) e um acontecimento local inesperado (a pior seca da história na Argentina) levaram a um estrangulamento extremo do estoque de reservas do Banco Central.”

“Ignorar ou não compreender a dinâmica desta crise, considerando que os aumentos de preços e a destruição do poder de compra se devem exclusivamente à emissão monetária e ao desequilíbrio das contas públicas, conduzirá a ações que só agravarão a crise. Sem dólares não há paraíso, por mais forte que seja o ajustamento fiscal e monetário”.

Fonte: Papiro