A Defensoria Pública teve posse de imagens de câmeras de uniformes policiais que revelam o tratamento ilegal a um suspeito de furto, em São Paulo. O vídeo gravado no dia 19 de julho mostra que, mesmo algemado com as mãos para trás e colocado na traseira da viatura, os agentes decidem tirá-lo do carro, jogar o suspeito no chão e iniciar agressões. No processo, os policiais dizem que o homem resistiu à prisão e a Secretaria de Segurança Pública (SSP) mencionou abertura de inquérito.

Em nota, a Ouvidoria da Polícia diz que instaurou procedimento em que exigirá “o máximo de rigor na apuração”. “Para que se verifique também um crescimento na qualidade das prisões e abordagens em nosso Estado”, diz o ouvidor das polícias, Claudio Aparecido Silva. Ele sugeriu à SSP, ao Comando Geral da PM e à Delegacia Geral da Polícia Civil a criação de um grupo de trabalho para debater as abordagens policiais em São Paulo.

Imagem que circulou em junho, chocou pela similaridade com a prática de tortura na ditadura militar

Ele afirma que o caso remete ao “triste episódio de junho passado”. Naquela ocasião, outro homem negro em situação de rua, teria confessado furtar chocolates em um supermercado, e acabou tendo pés e mãos amarrados com uma corda por policiais. Imagens de um vídeo publicado em redes sociais chocaram. O ouvidor diz que o ladrão “sofreu um tratamento que nos remete à tortura dos anos de chumbo da ditadura e aos tempos da escravidão”.

As câmeras policiais nos uniformes dos agentes de segurança pública têm se mostrado essenciais para comprovar as violações de direitos dos suspeitos. A audiência de custódia presencial também é considerada um espaço essencial para a pessoa detida apresentar as lesões e sua versão sobre a violência policial aos juízes e promotores.

A ocorrência e as imagens 

As imagens mostram um homem rendido e algemado, com um policial sentado sobre seu pescoço, enquanto ele é agredido verbalmente. Os PMs o suspendem pela blusa e o jogam no porta-malas da viatura sob ameaças. Durante a audiência de custódia, o suspeito disse que os policiais “já chegaram agredindo com socos na cabeça e nas costelas”. Fotos mostram o preso com ferimentos no rosto e hematoma em um olho. Ele também contou à juíza sobre a agressão “em uma espécie de pau de arara”, mas a juíza plantonista manteve a prisão.

O rapaz foi solto na terça-feira (29) depois que a Defensoria, já em posse das imagens, recorreu à Justiça. Ao analisar o vídeo, a desembargadora Jucimara Esther de Lima alegou abuso policial e mandou soltar o homem. Ela cita a Constituição Federal, “a qual prevê que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.

“Nenhum delito, por mais grave que seja, justifica a prática de outro, em especial pelos agentes investidos pelo estado para preservarem a ordem pública”, disse ela na decisão.

Segundo o processo, o homem foi acusado de furto e roubo no dia da prisão. Antes da denúncia no supermercado sobre as barras de chocolate, ele teria simulado a posse de uma arma e roubado objetos pessoais de uma mulher no estacionamento do supermercado. Acionada, a polícia teria encontrado os objetos e o homem com as características físicas relatadas. 

Abordagem policial

As abordagens policiais são um aspecto crítico da interação entre a polícia e as pessoas detidas, inclusive em outros países. Uma abordagem inadequada pode resultar em violações dos direitos humanos, abuso de poder e até mesmo tortura. Portanto, é fundamental que haja normas claras e procedimentos apropriados para orientar as abordagens policiais e garantir que sejam conduzidas de maneira legal, ética e respeitosa.

Alguns princípios essenciais que são frequentemente incluídos em normas ou diretrizes sobre abordagens policiais incluem:

  • Respeito aos direitos humanos: Todas as abordagens policiais devem ser realizadas de acordo com os princípios dos direitos humanos, incluindo o direito à vida, à integridade pessoal e à dignidade. Isso significa que a força deve ser usada apenas como último recurso e de maneira proporcional.
  • Não discriminação: As abordagens policiais não devem ser baseadas em critérios de raça, etnia, gênero, religião ou qualquer outra característica pessoal. A igualdade perante a lei deve ser respeitada.
  • Transparência e prestação de contas: As ações policiais devem ser transparentes, e os agentes de segurança devem estar sujeitos a mecanismos de prestação de contas por qualquer abuso ou conduta imprópria.
  • Treinamento adequado: Os agentes de segurança devem receber treinamento apropriado para realizar abordagens de forma profissional, garantindo a segurança tanto dos policiais quanto dos cidadãos.
  • Uso de câmeras corporais: A utilização de câmeras corporais pode ser uma ferramenta importante para registrar e documentar as abordagens policiais, garantindo transparência e servindo como evidência em casos de reclamações ou investigações.
  • Proteção de grupos vulneráveis: Deve haver atenção especial à proteção de grupos vulneráveis, como crianças, idosos, pessoas com deficiência e refugiados, durante as abordagens policiais.
  • Mediação e resolução de conflitos: Sempre que possível, a mediação e a resolução pacífica de conflitos devem ser incentivadas, reduzindo a necessidade de uso da força.
  • Direito a um advogado e notificação dos direitos: Os cidadãos abordados pela polícia devem ser informados de seus direitos, incluindo o direito a permanecer em silêncio e a ter acesso a um advogado.
  • Revisão e atualização regulares: As normas sobre abordagens policiais devem ser revisadas e atualizadas regularmente para garantir que reflitam as melhores práticas e as mudanças na sociedade.

É importante que os órgãos de aplicação da lei, como a polícia, estejam em conformidade com essas normas para proteger os direitos humanos dos cidadãos e prevenir a tortura e outros abusos. O Conselho Nacional de Justiça publicou uma resolução sobre esse tema, o que torna fundamental que essas diretrizes sejam seguidas e que haja mecanismos eficazes para monitorar e fazer cumprir essas normas, garantindo assim a proteção dos direitos dos cidadãos.

(por Cezar Xavier)