Ex-presidente francês Nicolas Sarkozy, em entrevista | Foto: AFP

O ex-presidente de França, Nicolas Sarkozy, considera que a entrada da Ucrânia na OTAN “não favorece a paz”, ao mesmo tempo em que defende uma solução diplomática para o conflito, pois, caso contrário, adverte, “o mundo corre o risco de cair numa guerra total”.

“Para resolver uma guerra há dois caminhos: ou a destruição de uma das partes, e aviso que não conseguiremos destruir a segunda potência nuclear do mundo – e então o mundo corre o risco de cair numa guerra total-; ou uma discussão diplomática”, afirmou Sarkozy em entrevista ao canal de televisão francês BFMTV na quarta-feira (13).

Neste sentido, o ex-presidente assinalou que a adesão da Ucrânia à OTAN “não favorece a paz”, uma vez que a entrada de Kiev na Aliança Atlântica seria percebida como “uma provocação” pela Rússia.

Sarkozy reiterou à BFMTV a sua posição de que a Ucrânia deveria manter uma neutralidade firme nas suas relações com a Rússia e o Ocidente. “Quando agitamos a bandeira vermelha debaixo do nariz do touro, não devemos ficar surpreendidos se ele atacar”.

Ao se tornar independente da Rússia após o fim da União Soviética, a Ucrânia havia se comprometido com o status de neutralidade, o que só mudou com o golpe da CIA em Kiev de 2014. “Se a Ucrânia tem o estatuto de país neutro com garantias de segurança e fronteiras dadas pela ONU ou pela comunidade internacional, parece-me que é uma alternativa que vale a pena discutir”, sugeriu.

Em relação ao presidente russo, Vladimir Putin, o ex-presidente francês destacou que aqueles que dizem que é impossível negociar com ele “são geralmente aquelas pessoas que nunca conheceram Putin”. “Tive talvez 80 conversas com ele”, acrescentou.

“QUERO UMA EUROPA INDEPENDENTE”

Por outro lado, Sarkozy, que governou a França de 2007 a 2012, condenou a estratégia articulada por Washington que visa “dominar” a UE através da adesão de mais países da Europa do Leste.

“Os americanos têm uma visão coerente e é sempre a mesma. Queriam trazer a Turquia para a Europa, porque a Turquia é sua aliada. Os americanos queriam trazer a Ucrânia para a Europa, porque quanto mais países da Europa do Leste estiverem na UE, mais estará a Europa sob o domínio americano”, disse Sarkozy, que apresentou a visão de um continente livre destas influências. “Quero uma Europa independente”, sublinhou.

Ele também destacou a importância de a Rússia e a Europa trabalharem juntas. “Somos vizinhos, essa é a diferença entre os EUA e nós”, enfatizou.

Em declarações anteriores à emissora de televisão France 5, Sarkozy reiterou os seus apelos a um compromisso entre Moscou e Kiev, observando que o conflito já custou a vida a cerca de meio milhão de pessoas, a maioria das quais eram ucranianas.

“Mas continuamos porque no Boulevard Saint-Germain eles são muito corajosos em enviar jovens ucranianos para morrer”, acrescentou, referindo-se à rua que ganhou reputação como local de debates políticos acalorados entre intelectuais franceses.

Para Sarkozy, embora a Ucrânia expresse essencialmente os desejos da América porque depende fortemente da assistência militar de Washington, o mesmo não se aplica às relações entre Washington e Paris. “A França tem uma voz única… e não se alinha com os interesses americanos”, disse ele.

Ao reiterar que deseja que a França apoie a Ucrânia, Sarkozy disse acreditar que a Ucrânia deveria eventualmente receber garantias de segurança do Ocidente, mas deve permanecer neutra e continuar a servir como uma “ponte entre o mundo eslavo da Rússia e nós”.

“Não podemos continuar a travar a guerra dizendo simplesmente: ‘Mais armas, mais mortes, mais resistência.’ Como você sai disso? Ele perguntou. Sarkozy afirmou que o conflito na Ucrânia beneficia apenas a China, que, segundo ele, está ganhando influência nos BRICS, e os EUA, que estão lucrando com a venda de armas e com os preços mais elevados do gás natural liquefeito.

Antes, o ex-presidente havia observado que qualquer compromisso com Moscou envolveria o reconhecimento da Crimeia como parte da Rússia, causando um surto de urticária em Kiev.

Foi o então presidente dos Estados Unidos, W. Bush, que primeiro tirou da algibeira a ordem à Ucrânia para ingressar na OTAN, um “convite”, segundo Washington, em cuja execução, até o golpe de 2014, os EUA gastaram US$ 5 bilhões, segundo a indiscrição de Victoria Nuland.

Fonte: Papiro