Lula, Xi Jinping, Ramaphosa, Narendra Modi e Lavrov na Cúpula do BRICS em Johanesburgo | Foto: Divulgação

O BRICS – o grupo das cinco maiores economias emergentes, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – iniciou nesta terça-feira (22) sua cúpula em Johannesburgo, em que está em pauta a admissão de novos membros, o fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento, bem como o uso de moedas nacionais para o comércio global, na busca de um mundo mais justo e multipolar.

Em seu discurso, por um link de vídeo, o presidente russo Vladimir Putin assinalou que o processo de desdolarização é “irreversível e objetivo”, com os membros do grupo das principais economias emergentes buscando “reduzir sua dependência do dólar em transações mútuas”. Putin observou ainda que, medido pela paridade do poder de compra, o BRICS já ultrapassou o Grupo dos Sete principais países industrializados – respondendo por 31% da economia global, em comparação com 30% do G7.

Ele denunciou as “sanções ilegítimas… que pesam gravemente na situação econômica internacional” e o “congelamento ilegal de bens de Estados soberanos”, que constituem uma violação das normas de livre comércio e cooperação econômica.

O déficit de recursos e a crescente desigualdade em todo o mundo são o “resultado direto” dessas políticas, afirmou o presidente russo. Ele destacou a disparada dos preços dos grãos e dos alimentos como a mais recente manifestação desse processo, afetando principalmente “as nações mais vulneráveis”.

Putin se referiu, ainda, aos esforços russos em reorientar suas rotas de transporte e logística para “parceiros estrangeiros confiáveis”, como o BRICS, para garantir um fornecimento ininterrupto de energia e alimentos ao mercado internacional.

Para isso, a Rússia está desenvolvendo a Rota Marítima do Norte e o corredor de transporte “Norte-Sul”, afirmou Putin.

A primeira, via Ártico, ao longo da costa norte da Rússia, garantirá entregas mais rápidas de mercadorias entre a Europa e o leste asiático. A segunda conectará os portos do norte da Rússia ao Golfo Pérsico e ao Oceano Índico, facilitando o movimento de carga entre as nações eurasianas e africanas.

“Estamos aumentando consistentemente o fornecimento de combustível, alimentos e fertilizantes para os estados do Sul Global” e contribuindo ativamente para a segurança alimentar e energética global, disse o líder russo. Ele culpou as sanções unilaterais do Ocidente pela atual crise alimentar internacional, descrevendo-as como “ilegais”.

Putin decidiu enviar o chanceler Sergey Lavrov a Johannesburgo, para evitar a provocação para constranger o governo sul-africano montada pelos círculos belicistas ocidentais via Tribunal Penal Internacional (TPI), que é presidido por um funcionário britânico, sob o pretexto de que a evacuação russa de crianças da zona de guerra na Ucrânia equivalia a “transferência ilegal da população”.

LULA

Em seu discurso, o presidente Lula sublinhou que “o dinamismo da economia está no Sul Global e o BRICS é sua força motriz” e que “já ultrapassamos o G7 em paridade de poder de compra”, e voltou a repetir que “não podemos aceitar um neocolonialismo verde que impõe barreiras comerciais e medidas discriminatórias, sob o pretexto de proteger o meio ambiente”.

O BRICS tem “uma chance única de moldar a trajetória do desenvolvimento global”, destacou. Segundo o FMI, enquanto os países industrializados devem desacelerar seu crescimento de 2.7%, em 2022, para 1.4% em 2024, o crescimento previsto para os países em desenvolvimento é de 4% neste ano e no próximo.

“O comércio total do Brasil com o BRICS aumentou de 48 bilhões de dólares em 2009 para 178 bilhões em 2022 – um crescimento de 370% desde a criação do grupo”, disse Lula, que defendeu “a adoção de uma unidade de conta de referência para o comércio, que não substituirá nossas moedas nacionais”.

“As necessidades de financiamento não atendidas dos países em desenvolvimento continuam muito altas. A falta de reformas substantivas das instituições financeiras tradicionais limita o volume e as modalidades de crédito dos bancos já existentes”.

A decisão de estabelecer o Novo Banco de Desenvolvimento representou um marco na colaboração efetiva entre as economias emergentes, apontou Lula, acrescentando que “nosso banco conjunto deve ser um líder global no financiamento de projetos que abordem os desafios mais urgentes de nosso tempo”.

Lula defendeu que nessa estratégia, “o engajamento com o Banco Africano de Desenvolvimento será central”. No plano multilateral, acrescentou o presidente brasileiro, “o BRICS se notabilizou por ser uma força que trabalha em prol de um comércio global mais justo, previsível, equitativo”.

“Não podemos aceitar um neocolonialismo verde que impõe barreiras comerciais e medidas discriminatórias, sob o pretexto de proteger o meio ambiente”, enfatizou Lula, que lembrou que a partir de dezembro, o Brasil ocupará a presidência do G20.

Lula salientou que “ainda nos faltava o retorno do Brasil à África”. “É inaceitável que, em 2022, o comércio do Brasil com a África tenha diminuído em um terço com relação a 2013, quando era de quase 30 bilhões de dólares”. A África – apontou – está construindo “um ambicioso projeto de zona de livre comércio: 54 países, 1,3 bilhão de pessoas e um PIB de mais de US$ 3 trilhões”.

“Para que nossa integração econômica e produtiva floresça, será preciso ampliar as conexões marítimas e aéreas entre os dois lados do Atlântico”, acrescentou Lula, que considerou “inexplicável” que ainda não tenhamos voos diretos entre São Paulo e Joanesburgo, Cairo ou Dacar.

MODI

Por sua vez, o primeiro-ministro indiano Narendra Modi, que enfrenta eleições no próximo ano, enalteceu o desenvolvimento da economia indiana, apontando que o PIB do país está a caminho de atingir US$ 5 trilhões e anteviu a Índia como ‘motor de crescimento para o mundo’. Ele também enfatizou o papel coletivo das nações do BRICS na abordagem dos desafios colocados pela pandemia e suas consequências.

“Apesar da turbulência na situação econômica global, a Índia conseguiu brilhar como um farol de crescimento”, afirmou Modi. Ele atribuiu este crescimento às reformas transformadoras que o seu governo empreendeu desde que chegou ao poder em 2014. Em particular, enfatizou como a Índia transformou os desafios colocados pela pandemia de Covid-19 numa oportunidade.

“Isso porque a Índia transformou a pandemia em uma oportunidade para realizar reformas econômicas. Por meio de nossas reformas [realizadas] de maneira orientada para a missão, a facilidade de negócios melhorou na Índia”, continuou ele. O líder indiano destacou o compromisso de seu governo em promover um ambiente propício para investimentos domésticos e internacionais. Ele também observou o foco de seu governo em melhorar a prestação de serviços públicos e promover a boa governança.

XI JINPING

O ministro do Comércio Wang Wentao leu o discurso do presidente chinês Xi Jiping, que se encontra em visita de Estado a África do Sul, em que este assinalou que a ascensão coletiva dos mercados emergentes e dos países em desenvolvimento representados pelos BRICS estava “mudando fundamentalmente o cenário global”.

Ele disse que qualquer que seja a resistência, os BRICS, como uma “força do bem” positiva e estável, continuarão a crescer. A China – acrescentou – apoia a expansão do BRICS e espera “uma parceria estratégica do BRICS mais forte, expandir o modelo BRICS-plus e promover ativamente a expansão da associação… e ajudar a tornar a ordem internacional mais justa e equitativa”.

Todo pais tem direito ao desenvolvimento e as pessoas devem ter a liberdade de buscar uma vida feliz, destacou, alertando contra um país que “está obcecado em manter a hegemonia” e tenta paralisar os países emergentes e os em desenvolvimento. “Quem desenvolve primeiro passa a ser alvo de contenção. Quem está alcançando se torna alvo de obstrução”.

Nas palavras de Xi, a reunião dos países do BRICS e de mais de 50 países de África “não é um exercício de pedir aos países que tomem partido, nem um exercício para criar confronto em bloco. Pelo contrário, é um esforço para expandir a arquitetura de paz e desenvolvimento.”

RAMAPHOSA

O anfitrião da cúpula, o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa, disse que há necessidade de uma reforma fundamental das instituições financeiras globais para que possam ser mais ágeis e capazes de responder aos desafios que as economias em desenvolvimento enfrentam.

Ele disse que o Novo Banco de Desenvolvimento, criado pelos países do BRICS em 2015, estava liderando o caminho. Desde a sua formação, demonstrou a sua capacidade de mobilizar recursos para infra-estruturas e desenvolvimento sustentável nas economias emergentes sem condições, disse ele.

No domingo, Ramaphosa disse que a África do Sul apoiava a expansão do BRICS. Ele disse que um bloco expandido representaria um grupo diversificado de nações com diferentes sistemas políticos que compartilham um desejo comum de ter uma ordem global mais equilibrada. 23 países formalmente apresentaram pedido de ingresso no bloco e cerca de 40 manifestaram a disposição de aderir ao grupo.

Fonte: Papiro