O fascista Milei pretende criar comércio de órgãos humanos | Foto: AFP

Surfando no tsunami causado à Argentina pela ida de Macri ao FMI e insuficiente resposta do governo Fernandez, o clone argentino de Bolsonaro, Javier Milei, que saiu em primeiro nas primárias da semana passada, não perdeu tempo nem asneiras em seu afã de se tornar mascote de Washington, preferencialmente de Trump, se as eleições de outubro/novembro deixarem.

É complexo o quadro na Argentina, com inflação de 115%, desvalorização de mais 20% na moeda no início da semana, 40% da população na pobreza, isso tudo sob achaque incessante do FMI. Nas primárias no final de semana passado, a direita tradicional (macrismo), o peronismo e o voto cacareco em Milei dividiram em terços a votação, com a extrema-direita ligeiramente à frente.

Milei anunciou que, se eleito, vai romper relações com a China, segundo maior parceiro comercial da Argentina, em especial dos grãos e carne, para amarrar sua canoa furada no Titanic norte-americano.

Sobre o rompimento com o país que no momento é o que tem ajudado a Argentina a não soçobrar diante do FMI, Milei disse que “as pessoas não são livres na China, não podem fazer o que querem e, se o fizerem, serão mortas”. “Você negociaria com um assassino?”, ele acrescentou.

Mas, para não antagonizar o agronegócio, ele disse que não vai interferir nas transações do setor privado com a China, nem se oporá a que a China construa uma usina nuclear na Argentina.

Milei desmereceu o Mercosul, que classificou como “uma união aduaneira de baixa qualidade que gera distorções comerciais e danos aos seus membros”, depois de dizer que não tem “sócios socialistas”, em alusão aos presidentes do Brasil, Chile, Colômbia e México.

E, claro, para dar sustância ao seu cavalo de troia, a dolarização, o pretenso “antissistema” Milei resgatou várias múmias sobreviventes do desgoverno de Carlos Menem. Como os chicago-boys Roque Benjamín Fernández, ministro de Economia entre 1996 e 1999 e presidente do Banco Central entre 1991 e 1996; Carlos Rodríguez, designado recentemente chefe do Conselho de Assessores Econômicos do partido La Libertad Avanza, ex-funcionário do FMI e secretário de Política Econômica entre 1997 e 1998, no segundo governo Menem; e Emilio Ocampo, coautor do livro ‘Dolarização, uma solução para a Argentina’.

MOTOSSERRA

Quanto a quem seria seu ministro da Economia, em entrevista ao jornal La Nación, Milei asseverou que “vai ser alguém tão ortodoxo como eu, e que goste tanto de motosserra quanto eu gosto”.

O libertário – ou seria ortodoxo? – Milei quer, ainda, liberalizar a venda de órgãos humanos – deixa o “mercado” cuidar-, liberar a posse de armas, cortar programas sociais, privatizar a educação e saúde e liberar as importações em detrimento do aparelho produtivo argentino.

Para enxugar a máquina estatal, prometeu reduzir os ministérios pela metade, para oito. Passariam a ser Defesa, Justiça, Economia, Relações Exteriores, Infraestrutura, Previdência, Interior e um novo ministério do Capital Humano, do qual seriam secretarias Desenvolvimento Social, Saúde, Trabalho e Educação, segundo o jornal Página 12.

Parece um remake de um filme ruim já exibido no Brasil. E sem ministério da Ciência e Tecnologia. Quem precisa disso, na volta à Idade Média?

TERRAPLANISMO

Como denunciou o ministro argentino da Ciência e Tecnologia, Daniel Filmus, ao Página 12, “[Milei] pretende um país que só exporte produtos primários, sem agregar valor a partir da qualidade do trabalho de nossos cientistas. Uma visão colonial, que volta a colocar nossa relação com o mundo nesses termos”.

Até mesmo Macri prometia aumentar o investimento em ciência e tecnologia para 1,5%, embora não tenha cumprido. Para Ana Franchi, presidente do Conicet, órgão argentino análogo ao CNPq, “não apoiar C&T é ridículo em pleno século 21. Não existe país desenvolvido sem investimento neste setor”.

Ao mesmo tempo em que traz de volta à cena política os mais desgastados ladrões da história moderna argentina, os anos das “relações carnais” com Washington e da “dolarização” que implodiu. Milei também assevera que irá acabar com a “casta” dos políticos. Um plágio portenho do “drenar o pântano” do ídolo Trump.

Sobre as relações futuras com o FMI, Milei não vê nenhum problema à frente e inclusive jura que já foi procurado por porta-vozes do órgão após o resultado de domingo passado.

“Eles me ligaram do FMI e entraram em contato com minha irmã para fazer uma reunião, estamos vendo como lidar com isso”, disse, referindo-se a Karina Milei, sua irmã e assessora mais importante. “O Fundo não é um problema, porque temos um programa fiscal muito mais agressivo, mais duro, estaríamos superando a meta”, confessou.

Após as declarações do candidato presidencial argentino, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, disse que se Milei visitasse o país asiático “teria uma conclusão completamente diferente sobre liberdade e segurança”.

Ainda sobre sua volúpia quanto aos vínculos com Washington, Milei esclareceu que se avassalaria a qualquer presidente norte-americano eleito em 2024. “Pode ser que eu goste mais do perfil dos republicanos do que dos democratas, mas isso não significa que não considere os Estados Unidos como nosso grande parceiro estratégico”.

LADO B

A versão portenha do mito tem exposto também um caráter tortuoso, que vai além dos gritos, insultos, polêmicas e exibicionismo já evidenciados.

No relato do Página 12, “quando Milei começou a viajar pela fama, ficou claro que ele nunca teve companheira, nem filhos, nem queria ter. Tampouco amigos, já que com as poucas pessoas com quem já teve algum tipo de relacionamento pessoal, acabou brigando”.

“Milei não falou com o pai e a mãe por mais de uma década. Ele não conseguia esquecer ou perdoar as surras, pancadas, humilhações e maus-tratos que recebeu quando criança. Ele só retomou o relacionamento com os ‘pais’, como ele mesmo os chama, há alguns anos”.

“Assim, seu único apoio emocional é sua irmã Karina, que também é sua mais importante conselheira, aquela que administra as finanças do partido; e, acima de tudo, seu cachorro Conan, que ele clonou após sua morte. Como resultado, hoje ele tem outros seis cachorros que são a coisa mais importante em sua vida, tanto que dedicou a eles sua campanha de encerramento das eleições primárias”.

“Eles não são apenas uma empresa, pois, graças à intervenção de parapsicólogos, médiuns, bruxas e telepatas, Milei diz que ainda está em comunicação com Conan e seus outros cães, pede-lhes conselhos sobre sua estratégia de campanha, além de o ajudar a saber o que vai acontecer no futuro e a fazer análises políticas e econômicas. Em alguns casos, ele também ‘se comunica’ com humanos mortos, principalmente economistas e filósofos”, detalha o Página 12.

“Ele também acredita que Conan é quem permite que ele esteja em contato direto com Deus. ‘Vi a ressurreição de Cristo três vezes, mas não consigo contar’, disse o próprio Milei, segundo o jornalista Juan Luis González na biografia ‘El Loco. A vida desconhecida de Javier Milei e sua irrupção na política argentina’”.

“A visão mística de Milei é combinada com questões mais terrenas. Especificamente, o financiamento opaco e milionário que ele recebeu e que é totalmente controlado por sua irmã. No ano passado, o papel de Karina Milei começou a ser cada vez mais questionado, depois que surgiram denúncias de que o La Libertad Avanza vendia candidaturas de até US$ 50 mil. O escândalo cresceu e hoje há mais casos e investigações criminais em curso”.

Fonte: Papiro