No RJ, ampla maioria é contra acesso fácil às armas de fogo, mostra pesquisa
Pesquisa Genial/Quaest divulgada nesta segunda-feira (3) mostra que a maioria da população do estado do Rio de Janeiro, 72%, é contra a facilidade de acesso às armas de fogo, ampliada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), e apenas 24% se dizem favoráveis; 4% não souberam responder ou preferiram não opinar.
Quando feito o recorte político-ideológico, a pesquisa mostrou que a maioria dos que rechaçam a maior disponibilidade de armas é de eleitores de esquerda, com 75%; entre os que se dizem lulistas, o índice é de 72%.
Na ponta oposta, os que se identificam como bolsonaristas e de direita contra essa facilidade cai para 43% — os que apoiam ficam, respectivamente, em 55% e 54%.
A pesquisa foi feita de maneira presencial, com 1.500 pessoas de 40 municípios do Rio de Janeiro, nos dias 30 e 31 de outubro — logo após a operação feita pelo governo do RJ nos complexos da Penha e do Alemão e que resultou na maior matança promovida da história, com 121 mortos (dos quais quatro policiais).
Problema grave
A grande circulação de armas de fogo é um dos principais problemas no enfrentamento ao crime organizado, devido ao aumento tanto na possibilidade de se obter armas legais quanto nos processos de fabricação e montagem.
A política de maior liberalidade com relação ao acesso às armas, implantada por Jair Bolsonaro (PL), contribuiu diretamente para o aumento na circulação desses instrumentos, inclusive e especialmente entre criminosos.
Ou seja, apesar do discurso da extrema direita de que o cidadão de bem deve ter direito à sua defesa pessoal, a facilidade de obtenção desses artefatos vem ajudando a alimentar o crime organizado — seja as facções tradicionalmente baseadas no tráfico de drogas, seja as milícias, historicamente ligadas a grupos de extermínio, ex-policiais e lideranças da extrema direita —, justamente os grupos mais nocivos à sociedade.
Exemplo dessa ligação promíscua veio à tona com uma operação deflagrada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que mostrou a ligação entre dois CACs (Colecionador, Atirador e Caçador) e um traficante do Comando Vermelho.
Um deles era atirador desportivo e presidente de um clube de tiro no interior de São Paulo, com mais de sete mil associados. O outro, um atirador desportivo certificado sócio de uma loja de armas em plena Faria Lima, coração financeiro do país, em São Paulo.
Salto nas armas em circulação
Este é apenas um dos muitos casos descobertos recentemente. De acordo com o Instituto Sou da Paz, entre 2016 e 2018, foram registrados e veiculados apenas 6 casos de envolvimento de CACs com o crime organizado, número que saltou para 11 em 2022, e alcançou o recorde de 12 casos em 2023.
Segundo a ONG, “a retirada de barreiras entre os CACs iniciantes e avançados e o aumento das cotas de compra de armas e munições facilitaram o desvio de armamentos para o crime organizado. Armas de grande interesse para o crime, como fuzis e pistolas 9mm, tornaram-se mais acessíveis”.
Em São Paulo, aponta, “as 9 mm eram 2,7% das apreensões em 2017 e saltaram para 7,6% em 2022. No Rio de Janeiro, no mesmo período, o salto foi de 19% para 28%”.
De 2018 a 2025, ao menos 6 mil armas de CACs foram desviadas — número que deve estar subestimado, já que diz respeito aos que informaram ao Exército o roubo, o furto ou a perda das armas, segundo o Sou da Paz.
Outro dado alarmante é que auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), feita no ano passado, identificou mais de 70 mil boletins de ocorrência, 9 mil mandados de prisão e quase 19,5 mil processos de execução penal relacionados a pessoas físicas, registradas como CACs pelo Exército — então responsável por esse controle, agora a cargo da Polícia Federal — além de 2,5 mil pessoas mortas com registro ativo.
Para piorar, o poder pública ainda enfrenta as fábricas clandestinas de armas, que alimentam várias facções. Estrutura com capacidade para produzir 3,5 fuzis por ano foi desbaratada em operação realizada pela PF e MPF no começo de outubro em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Enfrentamento
Desde a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma série de medidas foram tomadas com o objetivo de estancar o amplo acesso estimulado nos anos anteriores, mas a redução na circulação de armas é um processo em andamento.
Na avaliação do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em artigo contido no Anuário 2025, “fica evidenciado que as medidas adotadas pelo governo federal a partir de 2023 para a racionalização do sistema nacional de armas de fogo, sobretudo no que se refere às atividades de CAC, demonstraram efeitos significativos para o segmento, com redução no ritmo de seu desenvolvimento a um patamar compatível com um crescimento orgânico e não a um crescimento impulsionado artificialmente a partir de incentivos e flexibilizações injustificadas, amplamente utilizadas por segmentos diversos, inclusive
o criminal”.




