Estreia na Mostra de Cinema de SP homenageia Herzog
O pôster oficial do filme, feito especialmente para a Mostra, traz uma foto inédita de Vlado ao lado da esposa e dos filhos — imagem registrada poucos dias antes de sua morte, em 25 de outubro de 1975.
Cinco décadas após o assassinato de Vladimir Herzog nas dependências do DOI-Codi, o legado do jornalista ganha novas formas de expressão na 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. O documentário A Vida de Vlado – 50 anos do Caso Herzog, produzido pela TV Cultura, teve seu lançamento oficial nesta sexta-feira (24) durante o festival, que se tornou palco de memória, resistência e arte em homenagem ao símbolo da luta democrática.
A sessão especial contou com a presença de familiares, amigos e ex-colegas de Herzog, além de representantes do Instituto Vladimir Herzog (IVH) e da TV Cultura. O pôster oficial do filme, feito especialmente para a Mostra, traz uma foto inédita de Vlado ao lado da esposa e dos filhos — imagem registrada poucos dias antes de sua morte, em 25 de outubro de 1975.
Documentário reúne acervo inédito e depoimentos marcantes
Com direção de Marília Assef, diretora de Jornalismo da TV Cultura, o filme apresenta um vasto material inédito — fotos, slides e trechos de produções recuperadas do acervo da emissora e do IVH “Encontramos slides do filme que o Vlado fazia sobre Canudos e imagens pessoais nunca exibidas. É um retrato íntimo e profissional, que ajuda o público a conhecer o ser humano por trás do símbolo”, explica Assef.
O documentário também resgata registros históricos, como imagens raras do culto ecumênico realizado na Catedral da Sé, em 31 de outubro de 1975, e da cerimônia no cemitério Israelita do Butantã, quando o túmulo de Herzog foi descerrado um ano após sua morte.
“Contar quem ele era — suas vontades, seu senso ético, seu amor pelo jornalismo — é fundamental para que as novas gerações compreendam o peso histórico do caso Herzog e a importância da democracia”, acrescenta a diretora.
Mostra de São Paulo como espaço de memória e resistência
A estreia de A Vida de Vlado na Mostra de São Paulo reforça o papel do festival como um dos principais espaços de diálogo entre cinema, política e história no país. Ao longo das últimas décadas, a Mostra consolidou-se como ponto de encontro de obras que revisitam o período da ditadura militar e discutem os desafios contemporâneos da liberdade de expressão.
O público presente reagiu com emoção ao filme, cuja exibição coincidiu com o aniversário de 50 anos da morte de Herzog — data lembrada por atos e homenagens em todo o país.
Segundo o curador da Mostra, o lançamento é “um gesto simbólico de preservação da memória e de resistência cultural”, ao lembrar que o festival nasceu ainda nos anos 1970, em pleno regime militar.
Voz recriada por inteligência artificial amplia legado
Além do documentário, novas iniciativas marcam as cinco décadas do assassinato de Herzog. O jornalista Paulo Markun, amigo e colega de Vlado, desenvolveu uma ferramenta que utiliza inteligência artificial para recriar a voz do jornalista e responder perguntas com base em seus textos, reportagens e cartas.
“É uma forma de permitir que ele volte a dialogar com o presente, com sua própria voz”, explica Markun. A tecnologia será apresentada no fim do mês em evento no Sesc-SP sobre o uso da IA na preservação da memória.
Memória viva e compromisso democrático
As homenagens prosseguem neste sábado (25), com o ato inter-religioso na Catedral da Sé, repetindo a cerimônia que, em 1975, reuniu mais de 8 mil pessoas contra a farsa do suicídio forjado pelos militares. No domingo (26), a Praça Memorial Vladimir Herzog, no centro da capital, receberá a instalação Calçadão do Reconhecimento, com os nomes de todos os premiados no Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos.
Para Markun, essas iniciativas reafirmam o pacto democrático que emergiu da mobilização em torno do caso Herzog. “O que derrubou a ditadura foi a união de quem pensava diferente em torno da ideia de que a democracia é inegociável. Lembrar Vlado, meio século depois, é lembrar que esse pacto não pode ser rompido”, afirmou.
Ao estrear na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, A Vida de Vlado transforma a memória em arte e reforça o compromisso coletivo com a verdade, a justiça e a liberdade — valores que Vladimir Herzog representou e pelos quais perdeu a vida.
Por Cezar Xavier




