Este texto é uma contribuição à Tribuna de Debates do 16º Congresso do PCdoB e tem como objetivo dialogar com a resolução proposta, em especial com os itens 36, 39 e 40, que tratam da política internacional, da atuação do governo brasileiro e da solidariedade ao povo palestino. Reconhecendo a importância das formulações apresentadas, busco aqui reforçar suas convergências, tensionar seus limites e propor avanços necessários diante da gravidade do genocídio em curso na Faixa de Gaza.

O nosso silêncio também dói. O nosso silêncio também mata. Diante da brutalidade do maior genocídio do século XXI, denunciado por organismos internacionais, jornalistas independentes e pelas telas das redes sociais, cada vida ceifada em Gaza nos interpela. O genocídio do povo palestino é um crime contra a humanidade, sustentado por décadas de ocupação, apartheid e impunidade. Em cada criança morta, em cada hospital bombardeado, em cada família destruída, mora a urgência de levantarmos a nossa voz. O uso da fome como arma de guerra transformou pão e água em munição. Mais de duzentos jornalistas foram assassinados para que a verdade não alcance o mundo, jogadores de futebol palestinos tombaram sob bombardeios, flotilhas humanitárias são atacadas, o governo de Israel aprovou a ocupação total de Gaza, oficializando um projeto colonial que rasga o direito internacional. Esse é o cenário de deslocamentos forçados, morte em massa e limpeza étnica. O que se vive hoje é genocídio.

Mesmo dentro de Israel, passeatas pela paz desafiam a escalada genocida. Pelo mundo, massas populares se levantam em solidariedade: Londres, Paris, Joanesburgo, Buenos Aires. No Brasil, porém, a mobilização popular ainda é tímida. Diferente de outros países, aqui quase ninguém faz nada em escala significativa. Cabe a nós, comunistas, transformar essa ausência em luta organizada. A proposta de resolução do 16º Congresso do PCdoB, em seu item 36, é clara ao denunciar a política colonialista, expansionista e de terrorismo de Estado praticada por Israel, apoiada pelo imperialismo estadunidense. Afirma com razão que se trata de genocídio e limpeza étnica em Gaza. Nos itens 39 e 40, reconhece a importância da política externa proativa do governo Lula, que denunciou com veemência o genocídio, mas também aponta os limites da inserção internacional do Brasil e convoca a fortalecer a solidariedade internacionalista, especialmente ao heroico povo palestino. Esses pontos de convergência são fundamentais, mas se o Partido denuncia genocídio e extermínio, se o próprio governo brasileiro já reconheceu o caráter de limpeza étnica das ações de Netanyahu, então não basta apenas fortalecer a solidariedade. A denúncia precisa se traduzir em medidas concretas. É imperativo que o Brasil rompa relações diplomáticas com o governo genocida de Israel. A manutenção de embaixadas e acordos comerciais com um Estado que pratica crimes contra a humanidade é uma contradição ética e política. O governo Lula deu passos importantes, como não credenciar o embaixador e acionar a Corte Internacional de Justiça, mas é hora de avançar. A história exige mais.

O PCdoB, com sua tradição internacionalista, deve estar na linha de frente dessa batalha. Ao longo de sua trajetória, o Partido nunca se omitiu diante das grandes causas da humanidade. Da solidariedade a Cuba ao apoio às lutas de libertação na África, da denúncia da guerra do Vietnã à defesa da autodeterminação dos povos latino-americanos, sempre estivemos ao lado do justo contra o imperialismo. Hoje, essa mesma responsabilidade nos chama à trincheira da Palestina. Como aponta o projeto de resolução, a política externa brasileira está tensionada pela correlação de forças internas e pelo cerco imperialista, mas é justamente por isso que nossa militância precisa organizar um grande movimento de massas contra o genocídio cometido pelo Estado sionista de Israel. Sindicatos, universidades, parlamentos, juventude, partidos, coletivos populares, é urgente multiplicar atos, campanhas, cineclubes, boicotes e iniciativas educativas que levem a causa palestina ao povo brasileiro. 

Ao mesmo tempo, é necessário situar a questão palestina no contexto mais amplo da luta contra o imperialismo e pela multipolaridade. Os BRICS, fortalecidos pela ampliação recente e pela centralidade econômica e política de seus membros, precisam assumir papel ativo diante do genocídio em Gaza. Não basta que cada país manifeste sua posição de maneira isolada. É necessário que o agrupamento, enquanto força coletiva que se apresenta como alternativa à hegemonia ocidental, demonstre capacidade de ação, denuncie de forma unificada o genocídio e atue com firmeza nos organismos internacionais. Se os BRICS querem ser mais do que um polo econômico, devem afirmar-se também como polo político na defesa dos povos oprimidos. O caso palestino é a prova de fogo para essa afirmação. O Brasil, como membro fundador e com a liderança de Lula, tem condições de pautar essa agenda dentro do bloco, articulando posições conjuntas e demonstrando que a solidariedade pode ser também uma força geopolítica.

É verdade que a correlação de forças no Brasil e no mundo é difícil, mas não é admissível que a denúncia do genocídio seja esvaziada de consequências. Ao mesmo tempo em que afirmamos a necessidade de romper relações diplomáticas e comerciais com Israel, é preciso reconhecer que apenas medidas políticas e econômicas podem não ser suficientes. A história mostra que genocídios e crimes contra a humanidade muitas vezes exigiram respostas mais duras. Se a diplomacia falhar, se as sanções não forem capazes de deter o massacre, a comunidade internacional terá de considerar seriamente a necessidade de uma ação militar internacional para interromper o genocídio e proteger o povo palestino. Essa não é uma posição fácil, mas é uma exigência da vida diante da morte em massa. Não se trata de aventura belicista, mas da consciência de que genocídios não são detidos apenas com palavras. A vida do povo palestino deve estar acima da inércia dos governos e do cálculo das potências.

Concluo, portanto, que diante do maior crime de nosso tempo, o Brasil deve romper imediatamente relações diplomáticas e comerciais com Israel, os BRICS devem demonstrar força coletiva em defesa da Palestina e a militância comunista precisa organizar em nosso país um movimento de massas consequente, internacionalista e firme contra o genocídio. O PCdoB precisa ser audaz, transformar a denúncia em ação, a solidariedade em mobilização, a indignação em força organizada. A Palestina resiste, e o Brasil, se quiser estar à altura de sua tradição humanista e internacionalista, precisa resistir junto.