O PCdoB é um partido centenário, portador de uma bela história e de um patrimônio político que merece ser preservado e renovado. Contudo, em meio às novas condições da luta política e social no Brasil, torna-se evidente a necessidade de revolucionar a vida orgânica partidária, tornando as organizações do Partido mais vivas, atuantes e enraizadas na vida do povo.

Hoje, a vida partidária enfrenta um dilema: há forte centralização em torno das instâncias superiores e, ao mesmo tempo, dispersão e enfraquecimento de parte das organizações de base. Essa configuração cria um vazio organizativo intermediário, que dificulta o enraizamento regional e a articulação entre o centro dirigente e a base militante.

As instâncias do PCdoB são, de cima para baixo: Direção Nacional; Direções Estaduais e do Distrito Federal; Direções Municipais; Direções Distritais (em algumas experiências municipais) e Organizações de Base. Em um país continental como o Brasil, com realidades tão distintas entre Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul, é insuficiente operar somente com esses degraus. É preciso criar uma ponte orgânica que articule o centro dirigente com os níveis estaduais/DF e, por extensão, fortaleça a capilaridade municipal e de base.

Para preencher essa lacuna, propõe-se a criação de Comitês (ou Direções) Regionais do PCdoB, organizados nas cinco grandes regiões do país (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul), posicionados entre a Direção Nacional e as Direções Estaduais e do Distrito Federal. Essas instâncias teriam caráter político e organizativo, com atribuições como:

1. Elaboração de diagnósticos regionais – análise da realidade econômica, social e cultural de cada região, permitindo que o Partido formule propostas sintonizadas com o povo local.

2. Articulação de políticas regionais – integração de lutas de escala regional, como a defesa da Amazônia no Norte; a reforma agrária no Centro-Oeste; o desenvolvimento industrial no Sudeste; a valorização da cultura popular no Nordeste; e a agenda ambiental no Sul.

3. Formação e cultura partidária – promoção de cursos, debates e produção teórica vinculada às realidades regionais, fortalecendo a cultura militante.

4. Apoio às organizações de base – suporte para que Direções Municipais/Distritais e Organizações de Base tenham mais força e vida, evitando estruturas meramente formais e promovendo núcleos de atuação popular.

5. Intermediação política – atuação como ponte entre a Direção Nacional e as Direções Estaduais/DF, contribuindo também para a articulação destas com as Direções Municipais/Distritais e com as Organizações de Base, oxigenando a vida interna e evitando a concentração das decisões em poucos centros.

Além disso, a criação dos Comitês Regionais permitiria redistribuir a experiência acumulada por muitos dos quadros nacionais. Para um partido de dimensões modestas, a superconcentração de dirigentes em um único colegiado nacional tende a diluir a eficácia do comando. Parte significativa desses quadros poderia atuar de maneira mais produtiva compondo os Comitês Regionais, ajudando a qualificar a vida partidária em cada região do país e cooperando diretamente com as Direções Estaduais e do Distrito Federal.

Mais do que criar instâncias, é necessário transformar a prática organizativa. O Partido não pode se contentar com reuniões burocráticas ou estruturas cartoriais. Cada organismo deve ser um espaço vivo de cultura, luta e aprendizagem, onde militantes e simpatizantes encontrem referências concretas para suas vidas.

Isso significa transformar núcleos e comitês em locais de:

• produção cultural conectada à realidade do povo;

• debate político permanente, capaz de interpretar a conjuntura e propor alternativas;

• iniciativa prática, apoiando sindicatos, movimentos populares, centros acadêmicos e coletivos sociais;

• integração comunitária, tornando-se presença real nos bairros, universidades, fábricas, campos e espaços digitais.

Outro aspecto essencial é que o Partido acompanhe individualmente novas lideranças que ingressam em suas fileiras, evitando o desencantamento e a desfiliação precoce por falta de atenção. Militantes que se sentem abandonados ou invisíveis dificilmente permanecerão ativos.

Do mesmo modo, o Partido não deve se limitar a escutar apenas a voz de sua direção. É fundamental criar fóruns de debate permanentes, onde militantes com experiência e conhecimento possam partilhar ideias, críticas e propostas. Isso reforça o caráter democrático e a riqueza coletiva da militância.

O PCdoB precisa também se afirmar como centro de convivência democrática, fraterna e cultural, com acolhimento humano, estímulo à criação e ambiente de camaradagem. Um Partido que pulsa como comunidade tem muito mais força de atração do que uma organização reduzida à lógica eleitoral ou transformada numa espécie de igreja sem transcendentalismo.

Ousar na vida interna é decisivo. A criação de Comitês Regionais é mais que um ajuste administrativo: é uma decisão política capaz de fortalecer o Partido, torná-lo enraizado e visível em todo o território nacional, oxigenando sua vida orgânica com a experiência dos quadros e a energia da base. Se quisermos que o PCdoB seja mais do que uma legenda formal em federações, precisamos transformá-lo em instrumento vivo do povo brasileiro. Isso só será possível se nossas organizações respirarem a vida real, a cultura, a luta e as esperanças populares.

Num momento em que a esquerda precisa renovar suas forças para enfrentar desafios históricos e políticos, a inovação organizativa do PCdoB é, também, a capacidade de mudar sem perder a sua identidade.

*Poeta, advogado público federal e professor do curso de Direito, na UFRN. Possui doutoramento em Direito (UNIMAR) e mestrado em História (UFRN). Milita no PCdoB do Rio Grande do Norte há quase 40 anos.