Corre, no Congresso Nacional, sob a tutela do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), mais uma ofensiva contra os trabalhadores e contra o caráter público do Estado brasileiro. Travestida de “Reforma Administrativa”, essa proposta é parte de um projeto mais amplo de precarização e privatização, alinhado ao receituário neoliberal que, desde os anos 1990, impõe retrocessos em nome de uma suposta modernização. Na verdade, atende aos interesses da classe dominante, que busca abrir novos mercados e lucrar com serviços que hoje são garantidos por servidores públicos e voltados ao bem comum.

É preciso reconhecer que reformas administrativas podem, em determinados momentos históricos, cumprir papel progressista. A primeira delas, ainda no governo Getúlio Vargas, em 1936, foi decisiva para romper com o patrimonialismo, instituindo concursos públicos, profissionalizando carreiras e racionalizando processos estatais. No entanto, desde então, especialmente após a ascensão das políticas neoliberais no Brasil e no mundo, reformas têm servido como instrumentos para enfraquecer a máquina pública, reduzir direitos e transferir responsabilidades para o setor privado.

Nos anos 1990, com Fernando Henrique Cardoso, o país assistiu à intensificação das privatizações e ao ataque frontal aos trabalhadores do serviço público. Salários foram congelados, direitos conquistados foram suprimidos, o turno de seis horas foi extinto, o estágio probatório ampliado para três anos e o Regime Jurídico Único foi esvaziado. Tudo isso sob a justificativa enganosa de aumentar a eficiência do Estado, quando, na realidade, tratava-se de desmontar o que havia de público e estratégico, entregando ao mercado setores essenciais para a soberania nacional e para o bem-estar do povo.

Hoje, o discurso se repete. A nova Reforma Administrativa busca fragilizar a estabilidade, ampliar contratos temporários e aproximar o serviço público dos modelos privados, estabelecendo metas de desempenho incompatíveis com a finalidade de atender a população com qualidade. Mais uma vez, a lógica do lucro se sobrepõe ao compromisso com o interesse coletivo. Não por acaso, os supersalários e os privilégios do alto escalão ficaram de fora da proposta, evidenciando seu caráter classista: quem pagará a conta serão os trabalhadores da base do serviço público, aqueles que mantêm escolas, hospitais, universidades e centros culturais funcionando.

Além do conteúdo, o processo também é autoritário. O debate é conduzido sem a participação efetiva dos servidores e das entidades que os representam. A própria militância política comprometida com o serviço público, como o PCdoB, foi excluída do Grupo de Trabalho responsável pela discussão. O prazo estabelecido para análise e votação é curto, inviabilizando um debate profundo e democrático com a sociedade. Mais uma vez, tenta-se aprovar, de forma açodada, uma mudança estrutural que afetará gerações, sem ouvir aqueles que conhecem, na prática, as necessidades e a realidade do setor público.

Os efeitos dessa reforma não atingem apenas os servidores. O verdadeiro alvo é a população brasileira. Sem estabilidade, sem valorização profissional e sem concursos regulares, os serviços públicos perderão qualidade, continuidade e transparência. O cidadão será prejudicado porque um servidor instável, submetido a pressões políticas e a contratos temporários, não tem condições de atuar com independência nem de acumular a experiência necessária para garantir políticas públicas sólidas. Educação, saúde, ciência e cultura – pilares do desenvolvimento nacional – serão cada vez mais tratados como mercadorias.

Por isso, a luta contra a Reforma Administrativa é uma luta de toda a classe trabalhadora. Ela não diz respeito apenas aos servidores, mas ao futuro do próprio Estado brasileiro como garantidor de direitos. Ao fragilizar carreiras e abrir caminho para a terceirização irrestrita, a reforma aprofunda a dependência do país ao mercado e reduz sua capacidade de planejamento e execução de políticas públicas estratégicas.

O PCdoB tem o dever histórico de denunciar o caráter neoliberal dessa proposta e de organizar a resistência popular. É preciso mobilizar sindicatos, movimentos sociais e toda a militância para levar esse debate às ruas, às universidades, aos locais de trabalho. Não podemos permitir que, em nome de uma suposta eficiência, se destrua o patrimônio público construído com tanto esforço e luta. Precisamos ocupar o espaço público, pressionar parlamentares e mostrar que a sociedade não aceitará mais esse retrocesso.

Mas não basta dizer “não”. É necessário também apresentar alternativas. É possível modernizar a administração pública sem atacar direitos, sem desmontar carreiras e sem privatizar o essencial. É possível avançar na digitalização de processos, na qualificação profissional, no fortalecimento do planejamento estatal, mas sempre preservando o caráter público e universal dos serviços. Uma verdadeira reforma administrativa deveria ampliar a participação social, valorizar os servidores e garantir mais eficiência para atender ao povo – e não para servir aos interesses do mercado.

Por isso, nossa tarefa é dupla: resistir e propor. Resistir à ofensiva neoliberal que busca transformar direitos em mercadorias, mas também propor um novo caminho, que consolide o serviço público como instrumento de desenvolvimento, justiça social e soberania nacional.

A nova Reforma Administrativa é mais um capítulo da ofensiva burguesa para capturar o Estado e transformá-lo em máquina de negócios privados. Cabe à classe trabalhadora organizar-se, identificar os verdadeiros interesses por trás dessa proposta e lutar para barrá-la. Essa não é apenas uma disputa institucional; é uma disputa de projetos de país. De um lado, a lógica da mercantilização, do lucro e da retirada de direitos; de outro, a defesa do público, do social e da democracia.

O PCdoB reafirma seu compromisso histórico com os trabalhadores e com o povo brasileiro. Defenderemos, em todas as frentes, a estabilidade, os concursos públicos, a valorização das carreiras e a qualidade dos serviços. Mais do que nunca, é hora de fortalecer a unidade popular, articular forças progressistas e construir uma ampla frente de resistência.

Não aceitaremos que o Congresso mais conservador da história destrua, de forma irreversível, as bases do serviço público brasileiro. Não aceitaremos que o futuro do país seja entregue às mãos do mercado. É hora de dizer, em alto e bom tom: não à Reforma Administrativa! Sim ao fortalecimento do Estado e à garantia de direitos para todo o povo brasileiro!

Diogo Maia de Carvalho é militante do PCdoB-MG e sindicalizado no SINDSEP-MG