“A consciência socialista não pode surgir espontaneamente; ela só pode ser trazida de fora da luta econômica… pela teoria socialista.” — Vladimir I. Lênin, Que fazer?

Nas últimas décadas, o Partido Comunista do Brasil acumulou avanços significativos no campo da formação. Consolidou estruturas como a Escola Nacional João Amazonas e a Fundação Maurício Grabois, sistematizou conteúdos e promoveu cursos e jornadas de formação política. Mas, apesar dos avanços, estamos diante de um desafio estrutural: a perda de centralidade da formação ideológica marxista-leninista como eixo da construção partidária.

Esse não é um problema meramente técnico, nem de metodologia. Não se trata apenas de “melhorar a didática” ou “modernizar a linguagem”. O problema é político e ideológico. O que está em jogo é o abandono, consciente ou não, de uma concepção de formação que se ancora na totalidade, no materialismo histórico e na centralidade da luta de classes. A formação política vem sendo, em muitos espaços, substituída por atividades que priorizam pautas identitárias, vivências individuais, debates éticos e morais descolados da estrutura econômica e da exploração do trabalho.

Essa substituição não é inofensiva. Representa a infiltração de uma lógica reformista e pós-moderna que nega a totalidade, rejeita a mediação teórica e abdica da leitura objetiva da realidade. Essa concepção infiltra-se no Partido não apenas por for, mas através de militantes e dirigentes que consideram o marxismo-leninismo ultrapassado, rígido ou “inadequado para os tempos atuais”. Trata-se, portanto, de uma escolha política — e não de um simples problema de forma.

Essa inflexão tem reflexo direto nas estratégias de atuação do Partido. Ao abrir mão da centralidade do trabalho como categoria fundante da análise social, substitui-se o proletariado por categorias sociológicas fluidas e heterogêneas, como “sujeitos oprimidos”, “grupos vulneráveis” ou “identidades periféricas”. Com isso, esvazia-se o conceito de classe, fragmenta-se o sujeito coletivo da revolução e dissolve-se o horizonte histórico do socialismo em uma colcha de retalhos de lutas parciais.

 A consequência dessa guinada é clara: ao invés de formar quadros capazes de interpretar a realidade com base no método marxista, estamos formando militantes sensíveis às dores do mundo, mas incapazes de compreender suas causas estruturais. Militantes que denunciam as opressões, mas não apontam o sujeito histórico capaz de superá-las. Militantes que falam em “transformação”, mas não dizem que essa transformação exige a derrubada do capitalismo.

É preciso afirmar: o marxismo-leninismo não é um dogma, mas também não é uma moldura opcional. É o método teórico-prático da classe trabalhadora organizada. A essência ontológica do ser social, como Marx nos mostra em seus Manuscritos Econômico-Filosóficos, manifesta-se no trabalho. É através do trabalho, acredite, que as relações sociais são estabelecidas, as estruturas de dominação, construídas, e a vida organizada. Sem o trabalho como categoria central, não há leitura materialista da realidade — há apenas moralismo, indignação difusa e impotência política.

É possível — e necessário — atuar em movimentos feministas, negros, ambientais, LGBTQIA+. Mas a intervenção comunista nesses espaços só se diferencia se estiver orientada por uma concepção de mundo ancorada na luta de classes. Caso contrário, estaremos apenas reproduzindo, com outra estética, a mesma lógica liberal de fragmentação.

 “A luta política é muito mais ampla do que a luta econômica, a luta ideológica é ainda mais ampla. É por isso que os oportunistas odeiam a teoria.” — Vladimir I. Lênin

A omissão em relação à formação não é apenas uma negligência. É uma capitulação. E como toda capitulação, ela tem um preço: o rebaixamento da consciência de classe, a adaptação ao senso comum burguês e o esvaziamento da identidade comunista.

É preciso recuperar os clássicos. Ler Marx, Engels, Lênin, Lukács, Gramsci, Rosa Luxemburgo. Estudar com rigor o Programa Socialista do PCdoB. Conhecer a história das revoluções e dos partidos comunistas. Recolocar a teoria no centro da formação, sem medo de parecer “hermética” ou “antiga”. Não há nada mais atual do que a luta de classes. Não há nada mais urgente do que formar militantes capazes de compreendê-la e organizá-la.

Essa é a tarefa formativa do Partido Comunista do Brasil. E essa é a luta que devemos travar dentro do Partido, nos núcleos, nas conferências, nos encontros de base e, sobretudo, nos Congressos. A disputa pela formação é, na verdade, uma disputa pelo rumo do Partido. Se queremos que o Partido continue sendo o instrumento histórico da classe trabalhadora, precisamos formar quadros comunistas, e não apenas ativistas bem-intencionados.

Como nos ensinou Gramsci, a luta pela hegemonia exige direção intelectual e moral. E isso só se constrói com teoria, com método, com escola. A militância comunista deve ser portadora de uma concepção de mundo totalizante, dialética e comprometida com a superação revolucionária da ordem vigente. A formação ideológica marxista-leninista não é um adereço. É o coração pulsante de um partido revolucionário.