Trump desencadeia conflitos constitucionais e políticos internos ao atacar o Irã
Trump enfrenta resistência de democratas e republicanos, após ataques ao Irã
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, rompeu um dos pilares de sua política externa ao ordenar um ataque militar direto contra as instalações nucleares do Irã. Durante anos, Trump se posicionou como um crítico das “guerras eternas” do passado e prometeu não arrastar os EUA para novos conflitos no Oriente Médio. No entanto, após uma série de bombardeamentos coordenados com Israel, ele deu início a uma operação que analistas já classificam como uma das mais arriscadas da história recente americana.
Na noite de sábado, Trump declarou que as principais instalações de enriquecimento de urânio iraniano foram “completa e totalmente destruídas” e alertou que o Irã deve buscar a paz ou enfrentar consequências ainda maiores.
Mudança de regime: O verdadeiro objetivo
Apesar das justificativas oficiais sobre a suposta ameaça nuclear iraniana, Trump foi claro nas últimas horas: seu objetivo vai além do desmantelamento do programa nuclear. Em uma postagem nas redes sociais, o presidente perguntou: “Se o atual regime iraniano não for capaz de TORNAR O IRÃ GRANDE NOVAMENTE [MIGA], por que não haveria uma mudança de regime???”
Essa declaração alimenta assertivas de que o verdadeiro objetivo dos EUA é derrubar o governo do Irã e substituí-lo por um regime alinhado com Washington e Tel Aviv — algo que vai muito além da questão nuclear e aponta para uma reconfiguração geopolítica do Oriente Médio.
Analistas alertam que essa estratégia pode levar a uma escalada significativa no conflito. “Cuidado com o desvio de missão, avanço à mudança de regime e às campanhas de democratização”, disse Laura Blumenfeld, da Escola Johns Hopkins de Estudos Internacionais Avançados. “Você encontrará enterrados nas areias do Oriente Médio os ossos de muitas missões morais fracassadas dos EUA.”
Milhões de pessoas foram mortas e sociedades devastadas devido às guerras dos EUA no Iraque, Afeganistão e Líbia, entre outros, travadas como parte da chamada “guerra ao terror”. Também custou trilhões de dólares e a vida de milhares de soldados norte-americanos.
Resistência cresce no Congresso e dentro do próprio Partido Republicano
Vários críticos acusaram Trump no sábado à noite de violar a Constituição dos EUA ao lançar
ataques militares contra instalações nucleares do Irã sem a aprovação do Congresso. Ele tem confiado cada vez mais nos poderes executivos para governar internamente, e agora parece estar deixando o Congresso de lado em sua política externa. Trump enfrenta uma forte onda de críticas tanto de democratas quanto de setores do Partido Republicano.
“Trump disse que acabaria com as guerras; agora ele arrastou a América para uma”, disse o senador Christopher Van Hollen Junior (Democrata-MD) em um comunicado. “Seu ato é uma clara violação da nossa Constituição — ignorando o requisito de que apenas o Congresso tem a autoridade de declarar guerra”, afirmou o senador Van Hollen.
A congressista progressista Alexandria Ocasio-Cortez disse que Trump violou a constituição e a Resolução sobre Poderes de Guerra. “Ele arriscou impulsivamente lançar uma guerra que pode nos enredar por gerações. É absoluta e claramente motivo para impeachment”, disse ela. Mas com os republicanos controlando o Senado e a Câmara dos Representantes, os legisladores têm poucas ferramentas para influenciar sua decisão militar.
Além disso, representantes republicanos como Thomas Massie (Kentucky) e Marjorie Taylor Greene (Geórgia) também condenaram a ação. Massie chamou a atenção para o fato de que “quando dois países bombardeiam um ao outro diariamente em uma guerra acirrada, e um terceiro país se junta ao bombardeio, isso é um ato de guerra”.
Massie e o deputado democrata Ro Khanna introduziram uma resolução bipartidária pedindo que qualquer ação militar adicional receba autorização explícita do Congresso. O senador Tim Kaine (Democrata-VA), que apresentou uma medida semelhante no Senado, defendeu que o “Congresso precisa retomar o controle sobre decisões de guerra e paz”.
Divisão ideológica dentro do MAGA e entre aliados
Mesmo dentro do movimento MAGA (Make America Great Again), a decisão de Trump gerou divisão. Esta base de Trump também se opõe à adesão dos EUA à guerra de Israel. A organização destacou que Trump venceu a eleição com a promessa de não comprometer Washington com mais uma guerra no Oriente Médio. Eles querem que Trump se concentre em questões internas, especialmente a economia
Figuras influentes como Tucker Carlson e Stephen Bannon criticaram a intervenção, enquanto outros, como os senadores Tom Cotton e Ted Cruz, defenderam uma linha dura contra o Irã.
Trita Parsi, cofundador do Quincy Institute, alertou que Trump corre o risco de alienar seus próprios apoiadores mais fervorosos, que acreditavam em sua promessa de “América Primeiro” e menos envolvimento no exterior.
“Muitos podem seguir temporariamente, por lealdade ou patriotismo. Mas se a guerra não for bem-sucedida, veremos uma reação contrária muito mais rápida do que em 2003”, disse Parsi, referindo-se à invasão do Iraque.
O vice-presidente JD Vance, outrora conhecido por visões isolacionistas, tentou tranquilizar os apoiadores dizendo que “agora temos um presidente que realmente sabe como atingir os objetivos de segurança nacional dos Estados Unidos”. Mas sua posição contrasta com a visão de figuras históricas do MAGA.
Consequências jurídicas e diplomáticas
Juristas e especialistas em direito internacional têm questionado a legalidade do ataque. Na imprensa norte-americana, afirmam que Trump violou tanto a lei internacional quanto a constitucional norte-americana ao lançar o ataque sem aprovação legislativa.
O Irã já denunciou a ação como “uma grave e sem precedentes violação da Carta das Nações Unidas”, exigindo respostas da comunidade internacional.
A situação coloca pressão sobre os EUA para que esclareçam seu posicionamento perante organismos multilaterais, especialmente num momento em que Pequim e Moscou aumentam sua influência na região.
Guerra prolongada ou retorno à diplomacia?
Embora Trump insista que os ataques foram limitados e precisos, os analistas alertam que o conflito pode escapar do controle rapidamente. Diversas avaliações destacam que o Irã pode optar por voltar à mesa de negociações, embora agora em posição mais frágil, ou continuar escalando a resposta.
“Os ataques militares por si só não podem destruir o amplo conhecimento nuclear do Irã”, alertou a Arms Control Association. “Eles farão o programa nuclear do Irã retroceder, mas ao custo de fortalecer a determinação de Teerã de reconstruir suas atividades nucleares.”
Com a possibilidade de novos ataques, fechamento do Estreito de Ormuz ou aumento da tensão com potências como China e Rússia, o mundo assiste com preocupação ao próximo capítulo dessa crise.
Irã promete resistência total
Logo após os ataques, o Irã respondeu com firmeza. A Organização de Energia Atômica do país afirmou que não permitirá que seu desenvolvimento nuclear seja interrompido, enquanto a televisão estatal classificou todos os cidadãos e militares norte-americanos na região como alvos legítimos.
O Ministério das Relações Exteriores do Irã emitiu uma declaração afirmando que “Teerã considera seu direito de resistir com todas as suas forças à agressão militar dos EUA”. Analistas sugerem que o Irã pode retaliar fechando o Estreito de Ormuz, lançando mísseis contra bases americanas e aliados regionais ou ativando grupos armados ligados ao regime.
Trump, que durante anos prometeu acabar com as guerras sem fim, está agora no centro de uma nova frente de conflito no Oriente Médio. Seu slogan de “paz por meio da força” será testado como nunca antes, e o preço pode ser alto — tanto para os EUA quanto para a própria presidência.
“Agora, Trump está de volta ao negócio da guerra”, disse Richard Gowan, diretor da ONU no International Crisis Group. “Isso sempre pareceu mais uma frase de campanha do que uma estratégia.”
Cezar Xavier com informações de agências de notícias