Colheita do Arroz Agroecológico no Assentamento Filhos de Sepé, em Viamão-RS, O MST defende que a agricultura familiar produz diversidade de alimentos, enquanto o agronegócio exporta monoculturas e degrada o ambiente. Foto: Priscila Ramos/MST

No mês de abril, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realiza sua tradicional Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, conhecida como Abril Vermelho. Com atividades espalhadas por todo o país, o movimento reivindica a destinação de terras para a produção de alimentos, denuncia os impactos do agronegócio e lembra o Massacre de Eldorado do Carajás, que completa 29 anos.

“A reforma agrária não é só uma questão social, mas de soberania alimentar e defesa dos bens comuns da natureza”, afirma Margarida Maria da Silva, da direção nacional do MST, em entrevista. Segundo ela, os assentamentos produzem alimentos saudáveis e sustentáveis, contrapondo-se ao modelo do agronegócio, baseado em desmatamento, agrotóxicos e concentração de terras.

Com o lema “Ocupar para o Brasil Alimentar”, o MST planeja ações em todo o país: ocupações de latifúndios, entregas de alimentos à população, pressão no INCRA e debates sobre a importância da reforma agrária. Margarida ressalta que as ocupações não são apenas por terra, mas para denunciar a desigualdade e a destruição ambiental.

“Na pandemia, nossos assentamentos produziram comida para doar. Isso mostra o papel social da reforma agrária”, lembra.

Reforma Agrária como solução para a fome e a crise climática

Margarida Maria da Silva, direção nacional do MST

A dirigente do MST destacou que a luta deste ano enfatiza a relação entre Reforma Agrária, soberania alimentar e justiça climática. Segundo ela, a produção de alimentos saudáveis em assentamentos da reforma agrária pode conter a inflação dos alimentos e reduzir a desigualdade social.

“A Reforma Agrária cumpre um papel essencial para combater a fome e enfrentar as consequências das mudanças climáticas. O agronegócio, com seu desmatamento e uso excessivo de veneno, tem destruído os bens comuns da natureza e impactado diretamente os mais pobres, que vivem às margens de rios e são os mais afetados por enchentes e secas prolongadas”, afirma Margarida.

Expectativa e cobranças ao governo federal

Ato Nacional em Defesa da Reforma Agrária. Aconteceu em 7 de março de 2025, o Ato Político no Acampamento Quilombo Campo Grande, em Campo do Meio (MG), que marcou a realização dos anúncios de políticas voltadas para a Reforma Agrária. Foto: Lucas Bois/MST

Apesar de reconhecer a boa intenção do governo Lula, Margarida avalia que ainda faltam medidas concretas para atender a demanda por terras no Brasil. Atualmente, cerca de 100 mil famílias do MST vivem em acampamentos, muitas delas há mais de 15 anos.

“O governo precisa fazer uma Reforma Agrária ampla e efetiva. Recentemente, algumas terras foram destinadas para assentamentos, mas isso ainda representa menos de 8% da nossa base acampada. Não basta boa vontade, é necessária a destinação de terras improdutivas para o povo”, pontua, destacando que áreas de grandes devedores e terras improdutivas poderiam ser destinadas à reforma.

O MST também exige um aumento no orçamento para a reforma agrária e avanços em programas de apoio à agricultura familiar e agroecologia.

Denúncia contra o agronegócio

Marcha Estadual pela Reforma Agrária em abril de 2024, Foto: MST BA

Uma das principais pautas do Abril Vermelho é a exposição das contradições do agronegócio. O MST denuncia que, apesar de receber altos investimentos públicos, o setor não tem contribuído para a redução da fome no Brasil. Pelo contrário, o modelo baseado em monoculturas voltadas à exportação e no uso intensivo de agrotóxicos tem encarecido o preço dos alimentos e aprofundado desigualdades.

O agronegócio, por sua vez, é acusado de ser “devedor do Estado” e priorizar lucros à sustentabilidade. “Eles recebem bilhões em recursos públicos, mas não resolvem a fome. A agricultura familiar é quem alimenta o país”, critica.

“O agronegócio não produz comida para o povo. Ele destrói a natureza, expulsa comunidades camponesas, desmata e contribui para a crise climática. Queremos mostrar para a sociedade que a verdadeira solução é a Reforma Agrária Popular, que coloca comida na mesa da população com preços justos”, afirma Margarida.

Abril Vermelho: mobilização nacional

Neste ano, a Jornada Nacional de Lutas inclui ocupações, marchas, doação de alimentos e entregas de pautas ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). A mobilização ocorre em todas as regiões do Brasil, reforçando a demanda pela distribuição de terras e pela promoção de políticas que fortaleçam a agricultura camponesa.

“Nosso lema este ano é ‘Ocupar para o Brasil Alimentar’. A ocupação de terras é essencial para garantir que as famílias camponesas possam produzir alimentos e ajudar a combater a fome no Brasil”, finaliza Margarida.

A líder do MST destaca que o movimento busca dialogar com a sociedade sobre a centralidade da reforma agrária. “Queremos que o governo priorize o assunto, aumente o orçamento e garanta direitos”, diz. Apesar dos obstáculos, ela mantém a esperança: “A reforma agrária é estratégica para o Brasil. Seguiremos ocupando, resistindo e produzindo”.

Diante do agravamento da fome e da crise climática, o Abril Vermelho se reafirma como um momento essencial para colocar a Reforma Agrária no centro do debate público, pressionando por soluções que atendam às necessidades do povo brasileiro.

“Enquanto houver latifúndio, haverá violência no campo” Foto_MST-PR

29º aniversário do massacre de Eldorado dos Carajás (PA), onde 19 trabalhadores rurais foram assassinados em 1996, reforça a urgência das pautas do MST. “Abril Vermelho é também sobre memória. Enquanto houver latifúndio, haverá violência no campo”, afirma Margarida.

(por Cezar Xavier)