Em nota, Centrais denunciam “pejotização” como ameaça a direitos sociais

A decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender todos os processos que tratam da chamada “pejotização” — a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas — acendeu um sinal de alerta nas centrais sindicais brasileiras. Em nota divulgada nesta quinta-feira (17), as principais lideranças do movimento sindical apontaram que o reconhecimento de Repercussão Geral sobre o tema (ARE 1532603, Tema 1389) pode representar um grave retrocesso na proteção ao trabalho decente e na própria arquitetura da seguridade social do país.
A nota, assinada por centrais como CTB (Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), CUT (Central Única dos Trabalhadores), Força Sindical, NCST (Nova Central Sindical de Trabalhadores), UGT (União Geral dos Trabalhadores), CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros), denuncia que a suspensão dos processos sobre fraudes nas contratações ameaça o papel da Justiça do Trabalho e pode consolidar relações civis e comerciais em detrimento do reconhecimento de vínculos empregatícios reais — o que, segundo as entidades, aprofunda a precarização das relações de trabalho no Brasil.
Pejotização e o risco de um país mais desigual
Segundo o texto, a pejotização generalizada fere os princípios fundamentais do trabalho digno, como definidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), e ignora as responsabilidades sociais das empresas. Ao permitir que vínculos de emprego sejam convertidos em contratos comerciais entre CNPJs, abre-se caminho para a eliminação de direitos como férias, 13º salário, FGTS e previdência, ao mesmo tempo em que se enfraquece a negociação coletiva e o papel dos sindicatos.
Para as centrais sindicais, o avanço desse modelo de contratação tem repercussões que vão além do universo do trabalho: ameaça a sustentabilidade do sistema de previdência social, distorce o regime fiscal e compromete a construção de um país menos desigual. “Estamos tratando de impactos que atingem não apenas a geração atual de trabalhadores, mas também as futuras, comprometendo o pacto social brasileiro”, alerta o documento.
Articulação institucional e pressão política
Como resposta à decisão do STF, as centrais anunciaram uma série de medidas institucionais e mobilizações. A principal delas é a proposta de realização de audiências públicas junto ao Supremo, com a participação de especialistas, sindicalistas e representantes do poder público. As entidades também pretendem provocar o Ministério do Trabalho e Emprego para que articule uma frente com outros ministérios — como Justiça, Previdência e Fazenda — a fim de aprofundar o debate técnico e institucional sobre os impactos da pejotização.
A ideia é reunir estudos e promover seminários com participação ampla, incluindo parlamentares, membros do Ministério Público do Trabalho, ministros do TST e do próprio STF. A ofensiva busca reposicionar o debate sobre o vínculo empregatício e recolocar a centralidade do trabalho como eixo estruturante da cidadania.
Plenária do 1º de Maio será palco de resistência
A reação sindical não se limita às instituições. As centrais já convocaram para o próximo dia 29 de abril, em Brasília, uma Plenária Nacional das Centrais Sindicais, seguida de marcha unificada em preparação ao 1º de Maio. Durante o evento, serão lançados três documentos estratégicos: as “Prioridades da Pauta da Classe Trabalhadora para 2025”, a Agenda Legislativa 2025 e a Agenda Jurídica perante o STF e o TST.
Esses documentos trarão diretrizes para combater a desigualdade, ampliar a proteção social, promover emprego de qualidade e fortalecer os direitos trabalhistas, tudo sob a perspectiva de um desenvolvimento sustentável e justo. A pejotização, alertam os sindicalistas, será tratada como uma questão central da luta de classes contemporânea.
Defesa do trabalho decente e da democracia
Ao final da nota, as centrais reafirmam o compromisso com a democracia, com os direitos sociais e com o diálogo como caminho para enfrentar os desafios do novo mundo do trabalho. Para elas, a defesa da competência da Justiça do Trabalho e o combate à pejotização são inseparáveis da luta por justiça social.
Em um país marcado pela informalidade e por desigualdades históricas, dizem as centrais, entregar o trabalhador à lógica do “cada um por si” é institucionalizar a precarização como política de Estado. E, diante disso, concluem: “Não haverá democracia social possível sem trabalho decente”.
Reunião e deliberações
Na reunião virtual realizada nesta quinta-feira (17), as centrais sindicais brasileiras debateram e deliberaram uma ampla agenda de mobilização e articulação institucional em defesa dos direitos trabalhistas. A pauta abordou desde a implementação da nova Norma Regulamentadora nº 1 (NR1) até os desdobramentos jurídicos e políticos da pejotização, além da organização da Plenária Nacional e Marcha da Classe Trabalhadora, que acontecerá no próximo dia 29 em Brasília.
As centrais endossaram a proposta apresentada em reunião com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) sobre o processo de implementação do capítulo 1.5 da NR1, que trata dos fatores de risco no Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), realizada em 14 de abril, e definiram os seguintes encaminhamentos:
- Publicação do Guia de Implementação até 30 de abril;
- Publicação do Manual da NR1 em até 90 dias;
- Participação ativa das centrais na elaboração do material por meio da CTPP (Comissão Tripartite Paritária Permanente);
- Criação de uma Comissão Tripartite de Acompanhamento da implementação da norma;
- Lançamento de uma campanha nacional de orientação sobre o novo capítulo da NR1;
- Realização de evento nacional das centrais sindicais para apresentar a norma e orientar dirigentes sobre sua aplicação.
29 de abril: mobilização nacional e entrega de pautas ao Executivo, Legislativo e Judiciário
As centrais definiram detalhes logísticos e políticos para a Plenária Nacional e Marcha da Classe Trabalhadora, que antecede o 1º de Maio e ocorrerá em Brasília. O evento começará com concentração às 8h no estacionamento do Teatro Nacional, seguido de plenária das 9h às 10h30, onde será apresentada a Pauta da Classe Trabalhadora 2025, juntamente com as Agendas Legislativa e Jurídica.
A partir das 10h30, os participantes seguirão em marcha até o Congresso Nacional, com paradas previstas para entrega da pauta ao presidente Lula, ao presidente da Câmara, Hugo Motta, ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e aos presidentes do STF e do TST.
Alimentação do trabalhador e retomada da CPAT
Outro tema tratado na reunião foi a necessidade de fortalecimento do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). As centrais decidiram solicitar uma audiência com o ministro Luiz Marinho para discutir a retomada da CPAT (Comissão do PAT), com vistas à atualização e aprimoramento do programa.
Leia a íntegra da NOTA DAS CENTRAIS SINDICAIS SOBRE PEJOTIZAÇÃO E O PROCESSO NO STF
A Plenária Nacional das Centrais Sindicais, seguida de uma marcha, que será realizada no próximo dia 29 de abril, em Brasília, é parte das atividades unitárias para celebrar mais um 1º de maio. A Plenária lançará os documentos “PRIORIDADES DA PAUTA DA CLASSE TRABALHADORA PARA 2025”, Agenda Legislativa 2025 e a Agenda Jurídica perante o STF e o TST. Nesses documentos apresentamos diretrizes propositivas e analíticas para a superação das desigualdades econômicas e sociais, a distribuição da renda e riqueza, a geração de empregos de qualidade, a proteção social, trabalhista e previdenciária, entre tantas outras dimensões, tudo orientado para a construção de um projeto de desenvolvimento econômico e socioambiental sustentável para um país solidário, fraterno e justo.
Nas vésperas deste 1º de maio, a Repercussão Geral recentemente reconhecida sobre o tema da “pejotização geral” (Tema 1389 – ARE: 1532603), com determinação de suspensão da tramitação de todos os processos envolvendo a discussão de fraude, envolve deliberação sobre a competência da Justiça do Trabalho e o reconhecimento de relações civis e comerciais, em detrimento do reconhecimento de trabalho humano, vinculado aos princípios do trabalho decente (OIT), entre outros aspectos. São múltiplos e extensos os impactos, exigindo uma profunda análise das suas repercussões para a proteção trabalhista, social e sindical, para o sistema de previdência social e regime fiscal, sobre os efeitos para as gerações futuras e sobre o esforço de construção de um país menos desigualitário.
Por estas e outras razões as Centrais Sindicais e suas entidades filiadas se somam às manifestações já realizadas por outras entidades nacionais em defesa dos direitos sociais do trabalho, da competência da Justiça do Trabalho e contrárias às decisões que têm levado à ausência de compromisso social das empresas, retirando suas responsabilidades em detrimento do trabalho humano e decente, aprofundando o quadro de precarização das relações individuais e coletivas de trabalho no Brasil.
Para tratar do tema 1389 e das suas inúmeras relações conexas, pela abrangência e potencial revelado na própria enunciação da tese, as Centrais Sindicais estão tomando inciativas no sentido de:
Propor ao STF a realização de Audiências Públicas para recepcionar a análise que as organizações sindicais, especialistas e o poder público, de diversas áreas, têm a aportar sobre o tema.
Propor ao Ministro do Trabalho e Emprego a articulação dos Ministério da Previdência Social, Ministério da Justiça, Ministério da Fazenda e outros órgãos do Executivo Federal (a) o aporte de estudos sobre o tema e suas múltiplas repercussões e (b) estudos para serem apresentados em Seminário(s) com a participação de especialistas, dirigentes sindicais e gestores públicos, parlamentares, MPT, ministros do TST e STF.
As Centrais Sindicais reafirmam o seu compromisso de defesa dos direitos da classe trabalhadora e do diálogo social como resposta para os desafios contemporâneos nos marcos de preservação dos direitos fundamentais sociais do trabalho e da democracia no Brasil.
Brasília, 17 de abril de 2025.
Adilson Araújo (CTB)
Sérgio Nobre (CUT)
Miguel Torres (Força Sindical)
Moacyr Auersvald (NCST)
Ricardo Patah (UGT)
Antonio Neto (CSB)
(por Cezar Xavier)