Mais de dois mil policiais impediram que opositores se aproximassem do Congresso | Foto: Xinhua

Passados sete dias do grande ato pelo reajuste das aposentadorias – que contou com o apoio das torcidas organizadas e de milhares de manifestantes -, os argentinos voltaram a tomar as ruas de Buenos Aires nesta quarta-feira (19) para exigir um basta à política de atropelo aos direitos sociais levada a cabo pelo governo neoliberal de Milei.

“Sair atrás dos aposentados todas as semanas só é justificável devido a um grave surto de delírio psicótico que é aconselhável fazê-los perceber. É por isso que desta vez eles isolaram o cérebro. Cercaram a marcha e militarizaram a praça. Eles estavam com medo. Não queriam as imagens da semana anterior, com sua leve violência, de pele e osso: um golpe, uma bala de borracha, um ‘gazinho’. Tudo normal, naturalizado. Não desta vez. O governo de Milei tornou-se uma máquina perturbadora de aterrorizar, de violentar, de desumanizar o outro, de inferiorizar para dominar, de colocar pessoas contra pessoas”, descreveu o jornal Página12.

Nas proximidades ao Congresso, enquanto as colunas de aposentados, estudantes, sindicatos e movimentos sociais começavam a engrossar a marcha, a corja policialesca adiantou-se, começando desde bem cedo a vasculhar carteiras de senhoras e mochilas de estudantes, a exigir documentos e a interrogar quem quisesse cruzar as cercas de terror e ódio, num claro atropelo à “livre circulação”.

Sob violenta repressão, a Câmara de Deputados aprovou por 129 votos a 108 – com seis abstenções – o decreto presidencial que dá carta branca a Milei a assinar um novo acordo com o Fundo Monetário Internacional. Por ser ratificado pela Câmara, não é necessário que seja debatido no Senado. E quanto à dívida de 44 bilhões de dólares pagos atualmente pelo governo, seguirá vergonhosamente com sinal verde para que a sangria seja acelerada na contramão dos interesses do país e de seu povo.

Quase 60% dos aposentados e pensionistas ganham o salário mínimo, equivalente a cerca de 265 dólares (R$ 1.500). O governo congelou um bônus de cerca de 70 dólares (R$ 400,00) no ano passado e reduziu a entrega de medicamentos gratuitos, cujo preço duplicou em um ano.

O deputado nacional da União pela Pátria pela província de Chaco, Aldo Leiva, questionou a aprovação do endividamento, frisando que além de “uma verdadeira fraude” é a maior armação da história institucional do país. Com os bolsos cheios, denunciou, “dizem uma coisa e terminam votando outra”. “Os envelopes – repletos de dinheiro – estão na ordem do dia. Não tenho nenhuma dúvida da compra de vontades, o voto FMI”, enfatizou.

“Isso vai falhar e vocês sabem disso. Eles estão se livrando do problema e quando os líderes se livram do problema, isso cai na cabeça do povo. Assim não temos país, somos marionetes. Vale a pena perguntar para que servimos neste momento”, condenou Máximo Kirchner, elevando a denúncia na Câmara dos Deputados. 

O líder oposicionista recordou que “no caso das criptomoedas, se o presidente não fizesse parte dessa fraude, ele não conseguiria identificar um golpe a dois centímetros do nariz dele. E se isso acontecesse, estamos dando poderes a quem não viu isso”. Sendo assim, acrescentou Kirchner, “no dia 10 de dezembro de 2027, o governo que tomar posse poderá levantar a ilegalidade e a ilegitimidade desta dívida”.

A megaoperação montada pelos nazifascistas para impedir a mobilização iniciou com a “advertência” nos alto-falantes dos serviços de transporte público que a Polícia iria reprimir. Um anúncio ainda mais descarado e covarde, pois foi exatamente isso que ocorreu na manifestação da semana passada quando fez uso e abuso de cassetetes, armas com balas de borracha, bombas de gás e de spray contra cabeças de idosos, que deixou pessoas cegas e outras à beira da morte, como o fotógrafo Pablo Nahuel Grillo, de 35 anos. Permanece viva na lembrança a senhora de 81 anos, com uma bengala, que foi pulverizada com spray de pimenta e empurrada por um policial até desmaiar.

Desta vez, Milei tentou reduzir os riscos de imagens tão estarrecedoras, mantendo o cerco às estações de trens e ruas próximas ao Congresso.

Rechaçando o descaminho empreendido, entidades sindicais, organizações estudantis e de direitos humanos aprovaram um documento na terça-feira (18) ressaltando que “o FMI, como organização membro do sistema das Nações Unidas, deve respeitar o princípio da devida diligência e recusar ser cúmplice de uma manobra inconstitucional para assinar um acordo de forma secreta e antidemocrática, o que violará mais uma vez o direito ao desenvolvimento da população argentina”. 

Desta forma, solicitam que a organização rejeite “o acordo anunciado pelo governo argentino, pois, pela sua ilegalidade e ilegitimidade de origem, é suscetível de ser repudiado pelas futuras administrações do nosso país, estendendo a responsabilidade pela violação da ordem nacional e internacional a todos os funcionários que o assinam”.

Fonte: Papiro