“É preciso elevar a taxa de investimento ao patamar de 25%”, defende Adilson
O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, participou do lançamento do livro “Produção versus Rentismo – Trabalhadores e empresários pela reindustrialização do Brasil”, em evento realizado no último dia 4, no Sindicato dos Engenheiros.
O encontro reuniu representantes dos trabalhadores, empresários e economistas para debater a retomada da indústria nacional, as políticas de investimentos e os caminhos para o crescimento do país.
Confira, a seguir, os principais trechos da intervenção de Adilson Araújo:
“Gostaria de dizer da importância desse esforço do Pereira em construir esse livro. É verdade que nós temos grandes desafios. Para nós, que ambicionamos um projeto nacional de desenvolvimento, eu diria que o ponto da partida está numa frase dita por Getúlio Vargas: o ideal é ainda a alma de todas as realizações.
E é verdade que o Brasil precisa realizar muito. Eu diria que, à luz dos desafios contemporâneos do século 21, certamente uma nação como o Brasil, com toda a sua capacidade do ponto de vista mineral, energético, da Amazônia Azul, com 5,7 milhões de quilômetros, não deve se dar o direito de ser pura e simplesmente um mercador de grãos.
A potencialidade do ‘Brasil nação’ há de reivindicar toda a capacidade de desenvolver sua força produtiva. Me parece que a atenção maior é a gente desatar os nós. São muitos gargalos estruturais, é fato. A gente vive um quadro de instabilidade e eu diria de uma certa defensividade, porque a equação certamente não se completará se a gente admite que os juros estão fora do lugar.
Se os juros estão fora do lugar, nós temos que encontrar o lugar dos juros. Não são esses juros que se prevê aumentar. Esse juro que está dificultando a possibilidade do cidadão, sobretudo o cidadão de baixa renda, de voltar a consumir. Usando a expressão popular, o ‘rolezinho’ no shopping, a viagem programada de avião com a família. Poder se vestir melhor, comer melhor, se alimentar melhor. Poder se dispor dos equipamentos fabricados pelos operários, as linhas brancas e as coloridas também, por que não, já que o mundo possibilita?
Então, eu penso que nós temos que discutir, sim. Porque se é fato que há uma perspectiva de fortalecimento dos países emergentes, e a crise gera possibilidades, nós não vamos pegar carona na agenda belicista, anacrônica. A ‘rota da seda’ vai possibilitar fortalecer muito a ‘rota do Atlântico’. E, considerando esse patamar do que hoje produz o agro, e de toda a especulação e pressão exercida pelo mercado, essa financeirização da economia – que não tem contribuído em nada para melhorar a geografia socioeconômica e política, o que é fato –, o que nós pretendemos ambicionar do ponto de vista do protagonismo que pode exercer a indústria nacional?
Primeiro compreender que há de se fazer um jogo combinado. Eu sempre tenho dito que não há contradição na pactuação entre o capital e trabalho. Porque à classe trabalhadora muito interessa uma política de conteúdo local, o fortalecimento da engenharia nacional. Um mercado produtivo capaz de fabricar os seus navios, as suas aeronaves, as suas plataformas, os seus estaleiros, produzir emprego de qualidade.
Nós temos condições, já demonstramos isso. Ademais, o Brasil alcançou durante décadas um patamar de crescimento copiado recentemente pela China, e demos demonstração de que era possível retomar quando chegamos em 2010 ao crescimento de 7,5%. Abrir mão desta possibilidade é jogar um pouco numa política de neocolonização. E a gente precisa confrontar essas teses porque o tempo está indicando que nós precisamos de uma nova política industrial.
A denominada neoindustrialização será alcançada se a gente tiver capacidade, por exemplo, de dialogar com esse Congresso sobre a taxa de investimento, porque com o patamar atual nós não vamos conseguir. Como aponta os estudos do BNDES: as taxas de investimento do Brasil, que já foram melhores, estão abaixo da média da América Latina. Muito distante da média praticada no mundo.
Os estudiosos do assunto vão dar conta de que nós precisamos alcançar taxas médias de investimento da ordem de 25%. Nós estamos patinando em 15%, 16%, 17%. Mesmo com o Lucchesi, da CNI, tecendo aqui que a economia está melhorando, que a indústria está melhorando, mas estamos muito distantes daquilo que se viu alcançar no período do nacional-desenvolvimentismo.
Nós queremos esse Brasil potencialmente capaz de explorar toda essa possibilidade de ser um líder no debate das cadeias globais de valor. Nós queremos um país capaz de transformar energia limpa e renovável num grande polo de fomento, de atração de negócios, de distribuição de renda e de perspectiva para o nosso povo? Claro que nós queremos.
Nós precisamos sair do limbo. O IBGE diz que hoje são 106 milhões de ocupados. Todo mundo é ocupado, mas nós temos 40 milhões com CLT, 60 milhões na informalidade, ou seja, 60 milhões fazendo bico, vendendo um negócio, fazendo a renda, complementando com Uber e por aí vai. Mas desses, 70% estão recebendo até dois salários mínimos. Isso fere de morte o sistema de Seguridade Social. Eu digo que o problema do Brasil não é um problema previdenciário. Nós temos sim problemas com a Previdência, e a gente sabe até o porquê dessa conta não fechar. Porque o tripé contribuitivo deveria exigir mais da parte do empresário, até mesmo do próprio Governo, que usa o mecanismo da DRU, que sangra o sistema.
Mas eu acho que a gente precisa, sim, construir essa possibilidade de somar junto. Eu acho que não tem dúvida, a CNI expressa nos seus documentos: a defesa de uma taxa de juros que se aproxime da realidade hoje praticada internacionalmente. Não é possível que o Brasil siga um ponto fora da curva praticando taxa de juros maior do que os países em guerras. Então nós temos que pressionar, nós vamos ter que levantar o nosso povo. Agora somos só nós? Eu acho que não. Eu acho que a gente tem que conversar, sim, com o empresário, o nacionalista, com o empresário comprometido com o progresso social, com o desenvolvimento do país. Ao ponto até de dizer ‘por que o PRONAF leva quase R$ 400 bilhões e para a indústria só tem R$ 100 bilhões?’.
Então são muitas questões. Eu estou convencido de que a receita do Carlos Pereira ao organizar o livro indica bons caminhos. O diálogo com a CNI tem sido um diálogo maduro, fraterno, importante, e a gente precisa dialogar mais e melhor. A gente precisa assumir o compromisso, porque nós sabemos o Brasil que temos. E o Brasil que nós queremos certamente é um Brasil capaz de fazer com que de fato esse Brasil seja uma grande nação.”
Fonte: Página 8