Anatel atende operadoras e libera aumento de preços no meio dos contratos
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) cedeu aos interesses das operadoras de telecomunicações e anulou diversas regras que protegem os direitos dos consumidores. Entre as mudanças, a agência passou a permitir alterações nas características de ofertas de planos de celular, internet e TV por assinatura, incluindo reajustes de preços durante o período de vigência do contrato.
As mudanças, aprovadas na quinta-feira (5) e disposições para entrar em vigor em setembro de 2025, alteram trechos importantes do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC). Por maioria, o Conselho da Anatel aceitou o voto do conselheiro Alexandre Freire, contrariando o relator Raphael Garcia, que havia proposto manter as regras inalteradas.
Um dos pontos mais controversos é a autorização para que as operadoras modifiquem características dos planos, como preço, acesso e condições de uso, enquanto o contrato ainda estiver em vigor. A regra anterior proibia qualquer tipo de alteração unilateral. Segundo Freire, o Código de Defesa do Consumidor já regula essa prática e permite alterações unilaterais apenas com o consentimento do cliente.
Freire argumentou que a disposição imposta pelo regulamento “proíbe alterações de ‘cláusulas contratuais para beneficiário o consumidor’”. Em sua justificativa, ele afirmou que mudanças podem ser permitidas para incluir itens de utilidade ao cliente sem forçá-lo a aderir a uma nova oferta. “Isso evita que o consumidor seja obrigado, por exemplo, a aceitar uma oferta pior do que aquela oferta atual por falta de um item essencial em determinado momento”, defendeu o conselheiro.
No entanto, especialistas e organizações de defesa do consumidor condenam a decisão. Luã Cruz, coordenador do programa de Telecomunicações e Direitos Digitais do Idec, destacou que a medida pode gerar confusão e custos inesperados para os consumidores. “Muitas pessoas não sabem dizer como é que funciona de fato a sua própria oferta. E essa alteração durante a própria vigência do contrato pode confundir o consumidor e até gerar custos inesperados”, afirmou. Ele também destacou a necessidade de maior transparência, defendendo que “toda mudança deve ser precedida de uma mais transparente e permitir que o consumidor opte pela continuidade ou rescisão do contrato sem deliberação”.
Outra mudança é o fim da regra que impede a migração automática de consumidores para novos planos sem consentimento prévio. Pela norma anulada, a migração deveria ser feita para planos de igual ou menor valor e sem prazo de permanência, caso o consumidor não se manifestasse. Agora, as operadoras poderão incluir cláusulas de migração nos contratos, desde que o consumidor tenha concordado previamente.
Para Freire, a regra antiga era nula porque não levava em conta as necessidades específicas dos consumidores. “Embora os critérios de igual ou menor valor seja econômico, ele pode não refletir a qualidade e utilidade do serviço para o consumidor”, justificou.
O Idec, por sua vez, alertou para os riscos de práticas abusivas. “As operadoras podem migrar os consumidores para planos mais caros ou com características que atendam menos suas necessidades sem uma consulta adequada”, criticou Luã Cruz.
Outra alteração significativa foi a anulação da concessão de cobrança de valores durante os primeiros 30 dias de suspensão parcial dos serviços por inadimplência. O regulamento antigo determinava que, nesse período, não poderia haver cobrança de assinatura ou qualquer outro valor.
Freire argumentou que a proibição era uma interferência nos modelos de negócios das operadoras. “Proibir a cobrança exigindo a prestação gratuita de serviços, como coleta de chamadas e mensagens [por] 30 dias e acesso a serviços de emergência”, declarou.
Para o Idec, a decisão representa um retrocesso, já que os serviços de telecomunicações são essenciais e a regra anterior oferece proteção aos consumidores em situação de vulnerabilidade.
Com essas alterações, a Anatel abre espaço para um cenário mais favorável às operadoras, mas potencialmente prejudicial aos consumidores. Agora, além de poderem alterar os preços e características dos planos durante o contrato, as operadoras terão maior liberdade para migrar clientes automaticamente e cobrar valores durante períodos de inadimplência.
As mudanças levantam questionamentos sobre o equilíbrio na relação entre operadoras e consumidores. Segundo o Idec, as novas regras reforçam a necessidade de mais transparência e mecanismos que garantam a proteção dos usuários.
Para os consumidores, resta acompanhar as mudanças e estar atentos aos novos contratos que serão negociados a partir de 2025.
Fonte: Página 8