Rússia e China discutem aliança militar para “reequilibrar o poder global”
Ministro da Defesa da Rússia, Andrei Belousov (foto), se encontrou nesta terça (15) com o vice-presidente da comissão militar central da China, Zhang Youxia, em Pequim
A crescente parceria entre Rússia e China, destacada pela visita do ministro da Defesa russo Andrei Belousov a Pequim nesta segunda (14), reflete uma aliança cada vez mais sólida que desafia diretamente a hegemonia ocidental, especialmente dos Estados Unidos. O encontro ocorre no contexto do fortalecimento das relações militares entre os dois países, que têm coordenado uma resposta conjunta a uma série de desafios globais, desde as sanções impostas à Rússia até a pressão sobre a China em relação a Taiwan.
“Tivemos conversas muito substanciais com o ministro da Defesa chinês e vemos que temos pontos de vista comuns, uma avaliação comum da situação e uma visão comum do que precisamos fazer juntos”, disse Belousov durante a reunião. O representante do governo chinês, Zhang Youxia, disse esperar “um fortalecimento das relações entre as Forças Armadas da Rússia e da China”, segundo suas palavras traduzidas para o russo e citadas no comunicado.
Ainda nesta terça (15), o governo russo disse que fará um tratado militar com a Coreia do Norte. A aliança, disse o Kremlin, significará que as Forças Armadas dos dois países poderão defender um ao outro em caso de agressão de terceiros. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que o tratado será uma “cooperação estratégica” em todas as áreas, inclusive a militar. E afirmou que Moscou compartilhará mais detalhes do acordo assim que ele for concluído.
Mares turbulentos da China e Coreia
A aliança sino-russa, refletida neste encontro de Belousov em Pequim e nos crescentes laços militares, diplomáticos e econômicos entre os dois países, representa um dos mais importantes desenvolvimentos geopolíticos da última década. À medida que o Ocidente continua a aplicar sanções à Rússia e a conter a influência da China, Moscou e Pequim intensificam sua cooperação, desafiando a hegemonia dos EUA e alterando o equilíbrio de poder global.
Junto com isso, o anúncio de um tratado militar entre Rússia e Coreia do Norte representa um marco significativo na configuração geopolítica da Ásia e além. A cooperação estratégica entre as Forças Armadas dos dois países, que inclui apoio mútuo em caso de agressão externa, levanta importantes questões sobre a segurança regional e global. O Kremlin não deu detalhes completos sobre o acordo, mas destacou que ele englobará áreas militares e estratégicas.
Esse desenvolvimento acontece em um momento de tensões crescentes na Península Coreana e no cenário internacional. O anúncio da aliança militar entre Rússia e Coreia do Norte ocorreu no mesmo dia em que o regime norte-coreano explodiu trechos de estradas e linhas ferroviárias na fronteira com a Coreia do Sul. Em resposta, militares sul-coreanos dispararam tiros de advertência.
Aliança militar e parceria estratégica
Durante a reunião com o ministro da Defesa chinês, Zhang Youxia, Belousov enfatizou a convergência de visões entre Moscou e Pequim, especialmente no campo da segurança. Ambos os países, segundo o ministro russo, compartilham não apenas uma avaliação comum das ameaças globais, mas também uma visão alinhada sobre como lidar com esses desafios. O foco da conversa foi a necessidade de aprofundar a cooperação militar, fortalecendo uma parceria que já se materializou em exercícios conjuntos e na coordenação de políticas de defesa.
A importância dessa aliança foi destacada pela promessa de “uma nova era” nas relações sino-russas, feita por Vladimir Putin e Xi Jinping em maio de 2024. A parceria militar é vista por ambos os lados como uma forma de contrabalançar a influência dos EUA no cenário global, especialmente em regiões como o Leste Asiático e o Oriente Médio. Esse eixo estratégico Moscou-Pequim desafia diretamente as tentativas ocidentais de isolar a Rússia após a invasão da Ucrânia, além de reforçar a posição da China em suas disputas regionais, particularmente em relação a Taiwan.
Desafios comuns: Ucrânia e Taiwan
Um dos pontos centrais dessa aliança é o apoio mútuo em questões internacionais sensíveis. A Rússia apoia consistentemente a China em sua política em relação a Taiwan, criticando as “tentativas deliberadas” dos EUA de aumentar as tensões na região. A recente intensificação das atividades militares chinesas ao redor de Taiwan, interpretada como uma resposta às tentativas de independência da ilha, está em linha com a retórica de Pequim de que Taiwan nunca foi um país soberano.
A aliança entre Rússia, Coreia do Norte e China forma um triângulo de cooperação que desafia diretamente a ordem geopolítica dominada pelos Estados Unidos e seus aliados. À acusação dos EUA de que Pequim estaria fornecendo materiais que poderiam ser usados no conflito, a China se posiciona como uma aliada silenciosa, negando oficialmente o fornecimento de armas, mas mantendo um comércio robusto com Moscou, desafiando as sanções ocidentais. Mesmo que a China negue envolvimento direto, a aliança econômica e política entre os dois países continua a ser um obstáculo para a estratégia de isolamento de Washington.
Implicações globais da parceria sino-russa
O fortalecimento das relações militares e diplomáticas entre Rússia e China tem profundas implicações para a geopolítica global. A aliança entre as duas potências forma um contrapeso significativo à ordem mundial liderada pelos EUA e seus aliados, criando um novo bloco de poder com influência considerável em regiões estratégicas. A coordenação entre Moscou e Pequim vai além das questões de defesa, abrangendo áreas como economia, tecnologia e diplomacia, em um esforço claro para redesenhar o equilíbrio de poder global.
A relação sino-russa se torna ainda mais relevante em um momento de transição geopolítica. As sanções ocidentais contra a Rússia empurraram Moscou a buscar apoio no leste, enquanto a China enfrenta uma crescente pressão dos EUA em torno de questões comerciais e de segurança. A união de esforços militares e econômicos entre as duas potências tem potencial para mudar o cenário estratégico global, dificultando a capacidade do Ocidente de influenciar eventos em regiões como a Ásia-Pacífico e o Leste Europeu.
O papel dos EUA e o futuro da segurança global
A aliança Rússia-China apresenta um desafio direto à política externa dos EUA, que há anos tenta conter a ascensão da China e isolar a Rússia após a invasão da Ucrânia. A parceria entre Moscou e Pequim, no entanto, sugere que essas estratégias podem estar sendo frustradas, com as duas nações formando uma coalizão que não apenas resiste às pressões externas, mas também busca expandir sua influência em áreas chave.
Para os Estados Unidos, a resposta a essa nova configuração de poder exigirá uma combinação de diplomacia e fortalecimento de alianças regionais. A presença militar dos EUA na Ásia, a estreita relação com aliados como Japão, Coreia do Sul e Taiwan, e o contínuo apoio à Ucrânia são pilares dessa estratégia. Contudo, a crescente cooperação sino-russa sugere que uma nova ordem global pode estar se formando, com uma maior polarização entre o Ocidente e esse bloco emergente de poder no Oriente.
A nova parceria militar entre Rússia e Coreia do Norte e o fortalecimento das relações sino-russas apresentam sérios desafios à estabilidade regional e global. Por um lado, a aliança com Pyongyang pode encorajar a Coreia do Norte a adotar uma postura mais agressiva, sentindo-se respaldada por uma potência nuclear como a Rússia. Por outro, o estreitamento dos laços com a China pode acelerar a formação de um bloco de poder que busca contrabalançar a hegemonia ocidental.
(por Cezar Xavier)