O aumento para 10,75% contraria a tendência global de queda de juros, como a recente redução promovida pelo Banco Central dos Estados Unidos.

Copom reunido para discutir variação na taxa Selic, a taxa básica de juros. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) surpreendeu parte dos analistas ao anunciar, nesta quarta-feira (18), um aumento de 0,25 ponto percentual na taxa Selic, elevando-a de 10,5% para 10,75% ao ano. Essa é a primeira alta desde agosto de 2022, contrariando a tendência global de queda de juros, como a recente redução promovida pelo Banco Central dos Estados Unidos.

Segundo o comunicado oficial, a decisão unânime do Copom foi motivada pela “resiliência na atividade econômica, pressões no mercado de trabalho, aumento das projeções de inflação e expectativas desancoradas”. O Banco Central justificou a medida como necessária para que a inflação convirja para a meta estabelecida, destacando que a política monetária mais contracionista é o caminho adequado no atual contexto econômico.

A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) vocalizou o setor produtivo estrangulado pelo encarecimento do crédito. “Mesmo com o Brasil já tendo a maior taxa de juros do mundo, seguimos na contração do desenvolvimento econômico e da melhoria do poder de compra da população. E ainda dizem que é só o começo de um novo ciclo de taxas de juros alta. É um puro absurdo!”, afirmou em suas redes sociais. Como ela, economistas consultados pelo Portal Vermelho também criticaram a postura do Banco Central que favorece a especulação e o mercado financeiro em detrimento da indústria e da produção e consumo.

Cenário divergente: alta no Brasil e queda nos EUA

Enquanto no Brasil os juros subiram, nos Estados Unidos o Federal Reserve reduziu a taxa de juros em 0,5 ponto percentual, após quatro anos de estabilidade, passando de 5,25%-5,5% ao ano para 4,75%-5%. A elevação da Selic era amplamente antecipada pelo mercado financeiro, que já prevê um novo aumento nos próximos meses, podendo fechar 2024 em 11,25% ao ano.

O aumento no Brasil ocorre em meio a temores de elevação da inflação, agravados pela seca e queimadas, que podem impactar os preços dos alimentos. Entretanto, dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram uma queda generalizada nos preços em agosto, com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulando alta de 4,24% nos últimos 12 meses, dentro da meta de 4,5% para o ano.

Críticas contundentes de economistas

A decisão do Copom gerou reação negativa no meio acadêmico e entre economistas consultados pela reportagem. Para Marcelo Fernandes, professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), o aumento dos juros “não faz sentido” diante do cenário econômico atual. Ele destaca a deflação registrada em agosto e a recente valorização do real com a queda dos juros nos EUA.

O economista Marcelo Fernandes (UFRRJ)

“Na prática, com a queda de 0,5 ponto lá e o aumento de 0,25 aqui, o juro no Brasil subiu 0,75 ponto percentual. É um recado direto ao futuro presidente do BC, Gabriel Galipolo”, afirmou Fernandes, afrimando que o Banco Central está adotando uma postura conservadora antes da mudança na liderança.

Wellington Duarte, economista da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), foi ainda mais enfático, classificando o aumento da Selic como uma “afronta” ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo Duarte, a elevação dos juros trava o crescimento econômico e impede investimentos em áreas produtivas.

O economista Wellington Duarte (UFRN)

“O país está aprisionado por um Banco Central que parece querer impor um sistema de governo pautado pelo capital financeiro. Aumentar os juros é uma forma de conservar o status quo e favorecer o capital especulativo”, declarou.

Duarte também criticou a postura do BC em contraste com a política monetária dos EUA. “Lá, a redução dos juros busca impulsionar os investimentos em países emergentes, favorecendo o capital nacional. Aqui, o BC adota o caminho inverso, desestimulando a produção e o crescimento.”

Impactos esperados

O aumento da Selic terá impacto direto no crédito, tornando-o mais caro e menos acessível para consumidores e empresas. O encarecimento do crédito pode frear o consumo e reduzir as perspectivas de crescimento econômico no curto prazo. Por outro lado, o BC aposta que a alta ajudará a controlar a inflação, que, segundo o Copom, ainda apresenta riscos, especialmente diante das pressões externas e climáticas.

Mesmo com a controvérsia em torno da decisão, o Banco Central mantém a posição de que medidas contracionistas são necessárias para assegurar a estabilidade econômica. No entanto, o debate sobre o papel do BC e suas políticas monetárias deve se intensificar, especialmente à medida que o novo presidente da instituição, Gabriel Galipolo, assume o cargo nos próximos meses.

O aumento da Selic, primeira medida do gênero no governo Lula, coloca o Banco Central no centro de uma discussão sobre os rumos da economia brasileira e as estratégias necessárias para equilibrar crescimento e estabilidade.

(por Cezar Xavier)