Plenário da Câmara. Foto: Mario Agra/Câmara dos Deputados

Parlamentares brasileiros do sexo masculino são a maioria dos autores de propostas em tramitação na Câmara que retrocedem no que diz respeito à participação política de mulheres e negros. O posicionamento parece refletir a preocupação de boa parte deles com a manutenção de seu status quo, o que vai na contramão da luta democrática para garantir os direitos de segmentos sociais sub-representados. 

De um total de 71 propostas sobre reserva de vagas e financiamento — dois dos principais mecanismos para ampliar a participação de mulheres e negros na política brasileira —, 49 buscam avançar na legislação atual, 19 visam retroceder e cinco mantêm como está em relação a gênero e raça, propondo outros tipos de alteração.

Pouco mais da metade desse universo todo, 54,5%, foi apresentado por homens e 45,5% por mulheres. No entanto, das 19 propostas que pioram a legislação vigente, 15 foram elaboradas por homens. No sentido oposto, as mulheres foram a maioria das autoras, embora em menor proporção, de matérias que visam melhorar as regras atuais, com 26 do total de 49. 

As informações fazem parte de um relatório elaborado por pesquisadoras do Programa de Diversidade & Inclusão da FGV Direito Rio (PD&I) e pelo Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio (CTS-FGV). 

De acordo com o levantamento, “o menor número de projetos com proponentes do gênero feminino reflete a disparidade encontrada na composição da Câmara dos Deputados” — nas últimas eleições, por exemplo, apenas 90 mulheres (17,5%) foram eleitas para a Casa, ante 423 homens (80,5%).

“A nossa principal conclusão é que, apesar de uma distribuição relativamente equilibrada entre parlamentares homens e mulheres que propuseram medidas relacionadas à reserva de vagas e financiamento de campanhas de minorias (as chamadas cotas de gênero e raciais), a maioria das propostas que retrocedem na legislação atual são de autoria de homens”, diz, ao Portal Vermelho, Yasmin Curzi, professora da FGV Direito Rio e coordenadora do Programa de Diversidade & Inclusão. 

Ela salienta que esse cenário evidencia “o machismo e o racismo estruturais da política brasileira” e acrescenta que “os esforços para reduzir a participação política de minorias são predominantemente liderados por atores que buscam perpetuar as dinâmicas existentes com receio de perda de tais espaços”. 

A análise usou como base 92 proposições legislativas (87 projetos de lei e cinco propostas de emenda à Constituição) relativas aos temas de reserva de vaga (41,3% do total); financiamento de campanha (29,36%); violência política de gênero (15%) e reconhecimento (6,5%) — matérias que buscam instituir datas comemorativas e/ou simbólicas ou promover campanhas específicas acerca de um desses outros temas. 

A Lei 9.096/1995 (Partidos Políticos) foi, segundo o levantamento, o principal alvo das propostas de alteração, aparecendo 30 vezes — em geral, elas buscam modificar os dispositivos sobre a distribuição dos recursos do Fundo Partidário. 

Em seguida estão projetos que tentam alterar dispositivos sobre destinação de recursos e reserva de vagas, especialmente na Lei 9.504/1997 (Eleições), 28 vezes, e na Lei 4.737/1965 (Código Eleitoral), 25 vezes.

Em relação à reserva de vagas, são 38 propostas, das quais 25 buscam aumentar a participação política desses grupos, 11 retrocedem e dois mantêm como está. 

No caso das 27 propostas focadas no financiamento para mulheres e pessoas negras, 19 melhoram, cinco pioram, duas deixam como está e uma avança em relação ao financiamento de candidaturas de pessoas negras, mas mantém a legislação em relação às mulheres. 

No que diz respeito à filiação partidária, dessas 88 matérias, 47% estão alinhadas ao espectro político-ideológico de esquerda; 27% à direta e 26% aos partidos considerados de centro.