Estudos apontam queda de até 61% no uso da força policial com adoção de câmeras
O Ministério da Justiça e Segurança Pública lançou, nesta terça-feira (30), relatório sobre a utilização de câmeras corporais por policiais, com a recomendação de sua adoção por estados e municípios. As evidências levantadas em estudos analisados pela pasta, que consideram mais de 40 países, apontam que as câmeras corporais reduzem o uso da força policial entre 25% e 61%.
Outro dado importante trazido pelo documento diz respeito ao aumento dos casos de violência doméstica reportados em Santa Catarina e São Paulo, que tiveram crescimento de, respectivamente, 69% e 101% na presença de câmeras.
Mesmo ponderando que a análise desta questão necessita de maior aprofundamento, o relatório diz que, segundo os estudos avaliados, “na ausência de câmeras, estas ocorrências não poderiam ser filmadas, ou registradas com outra tipificação (como agressão verbal). Além do registro em si, estes achados sugerem que as câmeras são particularmente importante em casos de proteção à vítima de abuso doméstico, e potencialmente de crimes contra a mulher de forma mais ampla”.
Na avaliação do secretário-executivo adjunto do MJSP, Marivaldo Pereira, “todo órgão público tem o dever de prestar contas para a sociedade. Quando adotamos as câmeras corporais, aumentamos também a transparência da segurança pública, e, assim, garantimos que a sociedade possa acompanhar melhor o serviço que está sendo prestado”.
Para a diretora do Sistema Único de Segurança Pública da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), Isabel Figueiredo, o uso dessas câmeras é uma política de Estado. “Tivemos um processo de politização, que, felizmente, já foi superado. Estamos falando, de fato, de um equipamento técnico, que não é provido de ideologia. O que devemos fazer é pensar o uso desses dispositivos”, avaliou.
O relatório foi elaborado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), em parceria com o consultor Pedro Souza, professor de Economia na Universidade Queen Mary, de Londres.
Recomendações
Além de constatar resultados positivos nos locais onde o equipamento foi adotado, o documento traz cinco recomendações ligadas à sua implantação, com o objetivo de fundamentar a formulação de ações nos demais entes federativos, além de aprimorar as práticas policiais.
A principal recomendação aponta que, diante dos resultados apresentados, as câmeras corporais devem ser adotadas pelas polícias do país.
Outra indicação é “estudar, monitorar, observar e, se for o caso, mitigar possíveis consequências sobre condução de delitos de menor potencial ofensivo”. Isso porque a presença de câmeras corporais pode estimular a atividade policial, aumentando os registros de casos menos graves, como forma de o agente demonstrar o cumprimento do que normalmente é visto como sua função.
Além disso, o documento aconselha o estabelecimento de “protocolos claros, com mandato de utilização e limitando a discricionariedade sobre acionamento das câmeras” e o fortalecimento de “regimes de treinamento e supervisão para garantir a conformidade com manuais e protocolos de operação”.
Com relação às evidências relativas à violência doméstica, aponta que é preciso estudar e compreender como as câmeras corporais podem ser usadas na proteção de vítimas de ocorrências dessa natureza e contra a mulher.
Por fim, recomenda a produção de novos estudos para “compreender o efeito das câmeras em contextos ainda não pesquisados, como polícias rodoviárias, investigativas, penitenciárias ou judiciário”.
Posição do MJSP
Diante do papel constitucional que atribui principalmente aos estados o comando da maior parte das polícias no Brasil, mas considerando a importância do uso das câmeras e a discricionaridade com que têm sido adotadas, o MJSP publicou portaria sobre o tema no começo do ano.
No texto, a pasta recomenda a adoção do equipamento para agentes de segurança pública como policiais militares; civis federais; rodoviários federais; penais distritais, estaduais e federais; guarda municipal; e policiais legislativos e judiciais. No caso dos agentes de segurança privada, a Polícia Federal fica responsável pela implementação.
De acordo com o MJSP, “a instalação e o uso dos equipamentos têm por objetivo reforçar a transparência e legitimidade das ações dos agentes de segurança pública, assegurar o uso proporcional da força policial e garantir a preservação dos direitos fundamentais dos cidadãos, entre outros”.
Em maio, o ministério lançou nova portaria na qual estabelece diretrizes para a utilização das câmeras corporais por policiais e órgãos de segurança pública do país.
Dentre as diretrizes estão o uso das câmeras no atendimento de ocorrências; nas atividades que demandem atuação ostensiva, seja ordinária, extraordinária ou especializada; na identificação e checagem de bens e durante buscas pessoais, veiculares ou domiciliares.
Tais orientações foram lançadas pouco depois de decisão do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, de lançar edital para a contratação de 12 mil novas câmeras, estabelecendo que a gravação deverá ser realizada de forma intencional, deixando a cargo dos policiais a decisão de registrar ou não uma ocorrência, o que desvirtua o sentido da medida.