Morre J. Borges, mestre da xilogravura e do cordel, aos 88 anos
Na manhã desta sexta-feira (26), faleceu J. Borges, renomado xilogravurista, poeta e cordelista pernambucano, aos 88 anos, em sua cidade natal, Bezerros, no Agreste de Pernambuco. Borges era amplamente reconhecido como um dos maiores mestres da arte popular brasileira.
O anúncio foi feito pelo perfil oficial do Memorial J. Borges no Instagram, administrado pela família do artista. Em uma publicação com fotos recentes de Borges, a família expressou sua eterna saudade e gratidão. “Sua arte permanecerá no mundo, alegrando o coração de seus admiradores. Muito obrigada, Borges, por ter existido, por nos passar todo seu conhecimento de vida e de arte. Você foi único e necessário”, dizia a postagem. “O céu está em festa, como você dizia, chegou a hora de se encontrar com seus amigos.”
Familiares informaram que J. Borges foi internado há duas semanas por problemas pulmonares e cardíacos, mas recebeu alta e faleceu em casa, por volta das 6h da manhã. O velório do artista será realizado no Centro de Artesanato de Bezerros, a partir das 13h. O local do sepultamento ainda não foi confirmado pela família.
Trajetória e legado
J. Borges, cujo nome completo era José Francisco Borges, teve uma trajetória marcada pela simplicidade e pelo talento autodidata. Ele frequentou a escola por apenas um ano, onde aprendeu a ler, escrever e fazer contas. Na juventude, trabalhou como carpinteiro e pedreiro até descobrir a literatura de cordel. Há 60 anos, iniciou sua carreira como escritor.
Sua primeira xilogravura, a imagem de uma igrejinha, foi esculpida em madeira e depois impressa no papel, marcando o início de uma carreira brilhante. “Eu, quando inicio um cordel para escrever ou uma gravura para fazer, penso logo se vai tocar no sentimento do povo”, contou Borges em uma entrevista ao Jornal Nacional.
Reconhecimento internacional
A arte de J. Borges ganhou reconhecimento internacional, com exposições no Rio de Janeiro, no Museu do Louvre, na França, e em países como Estados Unidos, Alemanha, Suíça, Itália, Venezuela e Cuba. Lucas Vandebeuque, curador da exposição disponível no Museu do Pontal, destacou sua importância: “É uma das pessoas que ajudou a moldar uma ideia visual sobre o Nordeste e sobre a xilogravura brasileira.”
Um de seus quadros foi presenteado pelo presidente Lula ao Papa Francisco durante uma visita ao Vaticano. Em homenagem, Lula afirmou: “Um dos maiores xilogravuristas do país. Autodidata, começou a trabalhar muito cedo no agreste pernambucano. Fiquei muito feliz de poder levar sua arte até o Papa. Meus sentimentos aos familiares, amigos e admiradores deste grande artista do nosso país.”
A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, também prestou tributo ao artista. “Pernambuco está de luto! Se foi um gênio! O menino que estudou só até os 12 anos e que se tornou talvez o maior xilogravador por aqui, tinha um mundo dentro de si. E foi através dessa genialidade que ele conseguiu, ao longo dos seus 88 anos, expressá-lo em tinta, madeira, papel e cores.”
Luciana, que também é presidenta do PCdoB, pode contar com a arte de J. Borges na identidade visual do 14o. Congresso de seu partido, em novembro de 2017, além do verso de Thiago de Mello: Faz escuro, mas eu canto.
Homenagens e reconhecimentos
A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, exaltou a trajetória de J. Borges e destacou seu impacto cultural: “Vai deixar uma saudade imensa. Mas a sua grandiosidade permanecerá aqui pelas mãos de seus filhos, discípulos e centenas de xilogravuras que representam tão bem a nossa cultura.”
A Secretaria Estadual de Cultura, a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) e o governo de Pernambuco emitiram uma nota conjunta lamentando o falecimento de Borges. “Com a identidade visual de suas obras atrelada imediatamente às raízes pernambucanas, o artista levou o nome de Bezerros e de Pernambuco ao redor do mundo.”
Ao longo de sua carreira, J. Borges recebeu inúmeros prêmios, incluindo a comenda da Ordem do Mérito Cultural e o prêmio da UNESCO na categoria Ação Educativa/Cultural. Seu encontro com o escritor Ariano Suassuna, no início da década de 1970, foi um marco, levando sua obra para um público ainda maior. O artista português José Saramago também era admirador de Borges, que ilustrou o livro “O Lagarto”.
Um legado imortalizado
José Francisco Borges, conhecido como J. Borges, foi pintor, cordelista, poeta e xilogravurista. Ele era natural de Bezerros, onde viveu e trabalhou. Borges começou a trabalhar aos 10 anos e, em 1964, publicou seu primeiro cordel, iniciando uma jornada que o consagraria como um ícone da cultura nordestina. Suas obras capturam de maneira única a essência do povo e da cultura do Nordeste, sendo entalhadas diretamente na madeira sem esboços prévios.
J. Borges deixa um legado imortalizado em suas xilogravuras e cordéis, que continuarão a inspirar e alegrar futuras gerações.
(por Cezar Xavier)