Derrotados nas urnas, “bolsonaristas” venezuelanos tentam golpe de Estado
A questão das “atas eleitorais”, que Washington está tentando tornar pretexto para virar a mesa, deveu-se, segundo as autoridades venezuelanas, a um ataque de hackers para dificultar e atrasar a transmissão dos resultados aos centros do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), como Maduro explicou na cerimônia de proclamação.
“Houve um ataque massivo como nunca na nossa história ao sistema de transmissão do Conselho Nacional Eleitoral [CNE]. O ataque continua. Centenas de ataques ao site da CNE”, relatou o chefe de Estado, que acrescentou ter interrompido o sistema para evitar “a transmissão de dados que provocasse um apagão eleitoral”.
“Como não puderam causar o apagão elétrico, [tentaram] um apagão eleitoral e que não houvesse resultado eleitoral. E se neste momento não houvesse resultado eleitoral, eles teriam incendiado a Venezuela. […] esse era o plano”, explicou.
O procurador-geral venezuelano, Tarek William Saab, afirmou que as investigações revelaram que a sabotagem eletrônica veio da Macedônia do Norte e estava ligada a Lester Toledo, uma figura da oposição atualmente no exterior fugindo das acusações.
A Sputnik Brasil publicou uma entrevista com Víctor Theoktisto, doutor em informática e auditor externo do CNE para a supervisão e estudo do Sistema Eleitoral no software de sistema, segurança digital, criptografia e transmissão segura de dados entre junho e julho de 2021, que explicou que o ataque referido por Maduro foi um DOS (Denial Of Service ou Negação de serviço) e que consiste em saturar as redes com uma enorme quantidade de tráfego espúrio para evitar sucesso na transmissão da informação.
“Embora seja impossível alterar o conteúdo do que foi transmitido, as ligações foram reduzidas. De tal forma que raramente foram concluídas com sucesso, retardando todo o processo de totalização. Foi uma situação prevista pelas agências de inteligência com a ajuda dos operadores e acabou por ser resolvida, mas causou um atraso notável”, afirmou. A rede de transmissão utilizada, ele salientou, é exclusiva do processo eleitoral e não utiliza Internet.
De acordo com Theoktisto, a comunicação entre as urnas e ao Centro Nacional de Totalização é baseada em uma rede WAN (Wide Area Network ou Rede de área ampla) fornecida pela operadora de telefonia nacional através da rede de telecomunicações que transmite dados de linhas telefônicas, Metro Ethernet e serviço GSM ou via satélite em áreas remotas.
AUDITAGEM
Como registrou o Sputnik Brasil, quando o processo de votação é “encerrado à mesa, a máquina totaliza automaticamente todos os votos obtidos por cada candidato e transmite o resultado (Registro de Escrutínio) ao Centro Nacional de Totalização. Esses dados são devidamente encriptados através de dispositivos tecnológicos impossíveis de alterar, manipular ou eliminar”.
A máquina então gera o mesmo relatório de escrutínio impresso em papel semelhante aos das maquininhas de venda. “Neste papel é onde estão impressos os dados da mesa, dia, hora, vários códigos de segurança — para não serem suplantados por cópias falsas e únicas para cada mesa — os votos de cada candidato, por organização política, total de votos, nulos votos etc.”, explicou ele.
O especialista enfatizou que, além disso, “50% das mesas são auditadas de forma aleatória” seguindo um procedimento denominado Verificação Cidadã, onde “é corroborada a correspondência entre os resultados da votação que constam do Registro de Escrutínio impresso e os recibos de voto depositados na correspondente caixa de recibos”.
“Em suma, todas as organizações políticas que credenciaram as suas testemunhas têm atualmente, impressos, todos os editais em cada uma das mais de 30 mil mesas de voto”, disse o especialista. O que atesta a credibilidade dos processos do CNE.
ELEIÇÃO TRANSCORREU TRANQUILA
Depois das mais tranquilas eleições em uma década e 59% de participação no domingo (28), a Venezuela se vê de volta ao confronto, após a proclamação da reeleição do presidente Nicolas Maduro pelo Conselho Nacional Eleitoral com 51,2% dos votos, resultado recusado pela oposição de extrema-direita e pró-Washington, que alega “fraude” e se diz vencedora por “70%” – ao invés dos 44,2% registrados para Edmundo González Urrutia. Outros oito candidatos tiveram juntos 4,5% dos votos. O terceiro mandato de seis anos de Maduro começará oficialmente em 10 de janeiro de 2025.
Grupos violentos e encapuzados chegaram a queimar lixo e pneus em avenidas e promoveram outros atos de vandalismo. Uma manifestação foi convocada pelos chavistas para o Palácio Miraflores nesta terça-feira (30) em defesa da paz e democracia e contra o fascismo, enquanto Maduro denunciava a tentativa de um “Guaidó 2.0”.
“Há uma tentativa de impor novamente um golpe de Estado na Venezuela, de natureza fascista e contrarrevolucionária. Eu poderia chamar isso de uma espécie de Guaidó 2.0”, disse Maduro.
A reeleição de Maduro foi saudada pela Rússia, pela China, pela Bolívia e por Cuba, e contestada pelo fascista argentino Javier Milei, aliás, em companhia do presidente chileno, Gabriel Boric, e mais cinco governos conservadores latino-americanos.
A OEA, que em 2019 impulsionou o golpe de estado na Bolívia com fake news sobre apuração, teve a pachorra de se pronunciar questionando o resultado eleitoral venezuelano; parece que seu roteiro está fazendo escola.
Brasil, México e Colômbia realizam gestões pelo apaziguamento da situação, e o assessor especial de Lula, Celso Amorim, encontra-se em Caracas. O PT e o PC do B saudaram a vitória da democracia e de Maduro na Venezuela.
BLINKEN “PREOCUPADO”
O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, insuflou o golpismo da extrema-direita derrotada nas urnas, alegando que os EUA tinham “sérias preocupações” de que o resultado eleitoral não reflita a vontade ou os votos do povo venezuelano.
Blinken disse que o governo Biden esperaria que as autoridades eleitorais venezuelanas publicassem a tabulação detalhada dos votos e compartilhassem as informações dos resultados com a oposição e “observadores independentes”. Ele acrescentou que a “comunidade internacional” estaria observando de perto e “responderia de acordo”.
Como se sabe, os EUA patrocinaram todo o tipo de interferência contra a Venezuela assim que Chávez venceu a primeira eleição em 1998, de tentativas de golpe a 900 sanções ensandecidas, e até o “reconhecimento” de um “presidente Guaidó” durante o período de “pressão máxima” sob Trump. A União Europeia, que foi conivente com Washington, na aventura Guaidó, também embarcou nas “preocupações” dos EUA sobre as eleições de domingo.
Como observaram analistas, a oposição de direita venezuelana sempre questionou as eleições, mesmo quando Chávez as vencia de lavada – e inclusive isso foi levado em conta na criação do sistema de voto por urna e com recibo venezuelano -, tentando virar a mesa várias vezes desde o golpe fracassado de 2002.
GUAIDÓ 2.0
“Não é a primeira vez que enfrentamos o que enfrentamos hoje. Está sendo feita uma tentativa na Venezuela de impor um golpe de Estado, novamente, de natureza fascista e contrarrevolucionária. Eu poderia chamar isso de uma espécie de Guaidó 2.0″, disse Maduro em seu discurso de vitória no domingo.
Ele lembrou que em 2019 setores extremistas procuraram usar “a institucionalidade” da Assembleia Nacional – então controlada pela oposição – para “impor à Venezuela um modelo de rendição através de um ensaio a que chamaram Guaidó”.
“Os mesmos grupos liderados pelo império norte-americano que ensaiam a mesma operação foram os que saíram para tentar impor ao povo da Venezuela um presidente espúrio, uma espécie de filme 2.0″, enfatizou.
Maduro considerou que este “filme” tem os mesmos protagonistas: “por um lado, o povo que quer a paz, a democracia, a prosperidade e o progresso e, por outro lado, as elites cheias de ódio, com um projeto contrarrevolucionário fascista ligado ao governo norte-americano”.
O fim, apontou, também é conhecido: “danos ao país, danos aos humildes, danos à economia” e apoio do mesmo grupo de países “que hoje questionam o resultado eleitoral”. Esta oportunidade, disse ele, não será permitida para agir fora da Constituição e das leis.
“Digo aos conspiradores, aos envolvidos e aos que apoiam esta operação contra a democracia venezuelana que conhecemos o filme e que na Venezuela será respeitada a Constituição, a lei e nem o ódio, nem o fascismo, nem a mentira, nem a manipulação prevalecerão”, concluiu.
À primeira vista, o que a oposição de extrema-direita venezuelana está tentando fazer é retroceder às guarimbas de 2014 e 2017, a tentativa violenta de virada de mesa, sempre alegando “fraude eleitoral”, e que causaram dezenas de mortes.
A BBC Mundo, o serviço em língua espanhola, animou-se com os protestos, manchetando que “os bairros desceram até Caracas” e que “pelo menos cinco estátuas de Chávez foram derrubadas”. Fontes ligadas à oposição falaram em “sete mortos” e 46 presos. Uma prefeitura teria sido incendiada no interior do país.
O presidente venezuelano rejeitou a ideia de que as manifestações foram espontâneas e apontou o dedo para a organização de extrema-direita Vente Venezuela, encabeçada pela ex-deputada fascista e filha de magnata, María Corina Machado, a quem Urrutia serviu de biombo por ser inelegível.
Machado é notória por ter apoiado as sanções contra a Venezuela, o roubo dos ativos venezuelanos no exterior e até instado a uma “invasão cirúrgica” para depor Maduro.
Fonte: Papiro