Israel usou as banidas bombas de fósforo branco em ataque recente ao sul do Líbano | Foto: AFP

O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, reiterou na sexta-feira (21) que o mundo “não pode permitir que o Líbano se torne outra Gaza.”

Afirmação feita diante das declarações de Israel de que foram aprovados planos militares para atacar o Líbano e da reação do Hezbolah às ameaças e da intensificação dos confrontos fronteiriços.

O anúncio foi feito pelo comando militar de Israel na terça-feira, e respondido por uma advertência do líder do Hezbolah, Hassan Nasrallah, de que não haverá “lugar seguro” em Israel, que se seguiu à divulgação de um detalhado vídeo feito por drone apontando os principais centros militares, proteção antiaérea, porto e indústria bélica em Haifa, a terceira maior cidade israelense.

“Sinto-me obrigado a expressar a minha profunda preocupação com a escalada entre Israel e o Hezbollah ao longo da Linha Azul”, disse Guterres, referindo-se à linha de demarcação estabelecida pela ONU entre o Líbano e Israel e reincitada após a expulsão das tropas de ocupação israelenses do sul do Líbano no ano 2000.

“Um movimento precipitado – um erro de cálculo – pode desencadear uma catástrofe que vai muito além da fronteira e, francamente, além da imaginação”, disse o chefe da ONU a repórteres. “Sejamos claros: o povo da região e os povos do mundo não podem permitir que o Líbano se torne outra Gaza.”

“As forças de paz da ONU estão no terreno trabalhando para diminuir as tensões e ajudar a evitar erros de cálculo”, acrescentou. “O mundo deve dizer alto e bom som: a desescalada imediata não só é possível como é essencial. Não há solução militar”.

A força de paz, a UNIFIL, opera na “linha azul” desde 1978 por determinação das resoluções 425 e 426 do Conselho de Segurança da ONU. Israel manteve uma ocupação de quase duas décadas no sul do Líbano e, em 2006, tentou nova agressão, mas saiu bastante chamuscado.

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, já haviam se comprometido a “transformar Beirute em Gaza”. Esta semana, o líder do Hezbollah alertou para “nenhuma contenção e nenhuma regra” se Israel lançar um grande ataque ao Líbano.

“O risco de o conflito se espalhar para o Oriente Médio é real e deve ser evitado. Um gesto imprudente, um erro de cálculo, poderia levar a uma catástrofe muito além da fronteira e, francamente, inimaginável”, insistiu Guterres.

“Escalada na troca de tiros em curso. Escalada da retórica belicista em ambos os lados, como se a guerra total fosse iminente”, enfatizou o chefe da ONU.

O Hezbollah – assim como os revolucionários iemenitas – desencadearam uma série de ataques em resposta à invasão israelense de Gaza, exigindo o cessar-fogo e o fim do genocídio, resposta que visa imobilizar forças israelenses e, portanto, amenizar o sufocamento do povo palestino pelas tropas coloniais. Como efeito colateral, os colonos do norte de Israel precisaram deixar a região e atualmente estão em abrigos; povoados e cultivos estão abandonados. Também dezenas de milhares de libaneses foram deslocados pelos ataques israelenses no sul do Líbano.

O Hezbollah tem a capacidade de se defender e defender o Líbano contra Israel, afirmou a missão do Irã na ONU, advertindo que “talvez tenha chegado a hora da autoaniquilação deste regime ilegítimo”.

“Qualquer decisão imprudente do regime israelense ocupante para se salvar pode mergulhar a região em uma nova guerra”, postou a diplomacia iraniana no X.

Até aqui, evitou-se uma guerra em duas frentes e a extensão do conflito à região, mas cada vez que o regime Netanyahu fica mais débil e mais isolado, maior é a tentação dele e dos comparsas Gvir e Smotrich de uma aposta contra o futuro de Israel, na expectativa de atrair os EUA para a conflagração, tentando direcioná-la contra o Irã.

Analistas assinalam que Israel, que não consegue subjugar o Hamas, enfrentaria obstáculo ainda maior caso atacasse o Hezbollah, uma força muito mais experimentada e mais armada. Até mesmo na mídia imperial e especialistas militares afirmam que a linha de defesa antimísseis, o Domo de Ferro, dará conta de barrar os mísseis e drones libaneses.

O Hezbollah, que em décadas anteriores encabeçou a expulsão das tropas coloniais do Líbano, no pós 7 de outubro manteve uma ação de desgaste, mas buscou evitar uma conflagração geral na região – mesmo após a provocação de Netanyahu com o ataque à embaixada iraniana em Damasco e o assassinato extrajudicial de líderes do Hamas e do Hezbollah.

Assim, o que exatamente mudou? Mudou que o Gabinete de Guerra ruiu com a saída do ex-primeiro-ministro Gantz e o governo Biden tem mostrado abertamente que quer um respiro nesses meses que antecedem novembro e sua crucial reeleição ou não.

“NETANYAHU ARRASTA ISRAEL AO DESASTRE”

Como destacou o analista da Ria Novosti, Peter Akopov, trata-se que Netanyahu “não tem onde recuar: o fim das hostilidades com a conclusão de um acordo de trégua e o início das negociações sobre o futuro de Gaza será o início do fim não só do seu mandato, mas também da sua carreira política, e possivelmente sua vida em liberdade”.

Muitas pessoas acreditam – acrescenta o articulista, o qual alerta que Netanyahu “arrasta Israel ao desastre” – que nesta situação o premiê“usará o seu último trunfo: iniciará operações militares contra o Líbano”.

E é ele também que concluiu que “acontece que ninguém precisa da invasão israelense do Líbano, exceto Netanyahu, e mesmo para ele isso só é aceitável em condições absolutamente irrealistas”, entre elas, cidades e civis israelenses bombardeados.

Ainda assim, “isso pode acontecer?”, ele indaga. “Sim, pode – embora a probabilidade de tal resultado não exceda alguns por cento. Israel jogou um jogo muito perigoso, com consequências terríveis – e à medida que sobe a escada da escalada, arrisca-se a transformá-lo numa experiência suicida. Não há uma boa saída para Netanyahu da operação em Gaza – a única questão agora é até que ponto irá arrastar o seu país consigo”.

Fonte: Papiro