“Trabalhadores não foram ouvidos e texto não condiz com realidade”, dizem motoristas de app
Em audiência realizada nesta semana na Câmara de Vereadores de Salvador, o motorista de aplicativo Cláudio Sena criticou o relatório apresentado pelo Ministério do Trabalho que trata de questões relacionadas à categoria. Sena, que também é influencer, disse que o texto foi elaborado sem a participação dos trabalhadores do setor, destacando que “em nenhum momento, os trabalhadores foram ouvidos. Não houve motorista por aplicativos nesse grupo de trabalho.”
Segundo ele, as entidades envolvidas nas discussões não representam esses trabalhadores e, portanto, não têm histórico de luta pelos direitos da categoria desde 2014. Ele defendeu a importância de um projeto de lei elaborado pelos próprios motoristas, que trate principalmente da correção das tarifas, um aspecto crucial que o relatório atual ignora, avalia.
Ele afirma também que as estimativas de ganho citadas pelo governo não condizem com a realidade. “O relatório diz que o motorista, ao final de X horas trabalhadas, vai receber R$ 5.800. Onde está o custo com combustível, seguro, manutenção e financiamento?”, questiona?
O influenciador apontou a falta de transparência nas tarifas cobradas pelas plataformas. Segundo ele, duas corridas para o mesmo destino, realizadas por diferentes motoristas, podem resultar em cobranças distintas para os passageiros e pagamentos diferentes para os motoristas, exemplificou. Para ele, trata-se de uma prática de manipulação irresponsável das empresas.
Sena informou que os motoristas de aplicativos não querem ser representados por sindicatos que não têm legitimidade. “Queremos liberdade e uma tarifa justa, utilizando metodologias que a própria Uber emprega. Hoje, um motorista pode realizar a mesma viagem e receber valores diferentes”, reivindicou.
Sena conclamou à Comissão do Trabalho que considere o PL 536, ao invés do PL 12, que ele considera inadequado para atender às necessidades da categoria. “O ideal para nós seria o PL 536, porque foi elaborado por nós, que estamos ali pagando o combustível, que estamos ali pagando o carro, que estamos ali sendo insultados por passageiros, que estamos ali ficando 12, 14 horas, como fiquei ontem até hoje, 14 horas e 15 minutos, na pista”.
Apenas com o deslocamento, a plataforma já começa ganhando, diz o motorista. “À disposição de uma plataforma, custeando o meu deslocamento para ir até o comércio pegar um passageiro, e só nessa partida a Uber já está ganhando, com o meu deslocamento, com o meu tempo, com a minha dedicação, com o meu carro, com o meu investimento, meu combustível, meu financiamento, com tudo”, continuou.
“E ela está ali, ela divide comigo, e divide mesmo, porque em uma viagem que fiz ontem, a Uber ficou com 58%. Isso que os sindicatos que estavam no GT não tiveram sensibilidade. Isso que a Uber não está preocupada […]”, prosseguiu.
Ele pediu aos parlamentares presentes que as demandas dos profissionais sejam ouvidas na regulamentação do setor. “Nossa esperança é que esta comissão nos ouça e que nossas necessidades entrem nessa regulamentação. Nós temos um projeto de lei. Não sei como se tramita isso lá, mas nós queremos ser ouvidos”, defendeu. “Se o 536 (PL) entrasse em pauta, nossa, tenho certeza que seria feita justiça. O governo precisa nos dar liberdade e direitos, melhorando o serviço para o consumidor final e tirando o poder das plataformas sobre nós”, finalizou Sena.
O motorista, que foi um dos 25 primeiros a atuar na modalidade conta que quando a Uber chegou na cidade em sua primeira viagem a empresa cobrou R$ 27 da passageira e lhe deu R$ 20, sendo que essa mesma viagem hoje, a Uber pagaria R$ 16, R$ 17.
O PLP 12/2024 cria a categoria “trabalhador autônomo por plataforma” e define esta relação de trabalho como “intermediada” pelas empresas de aplicativo. Prevê uma carga máxima de 12h diárias em cada app, a contribuição ao INSS (pelos trabalhadores e empresas) e uma remuneração mínima de R$32,10 por hora.
Pela proposta, apenas o momento em que o motorista aceita uma viagem até aquele em que o passageiro chega ao destino, é contado como trabalho para fins de aposentadoria. O tempo em que o trabalhador está logado à disposição da plataforma não é considerado.
Entidades representativas de motoristas de app que participaram do GT criado pelo Ministério do Trabalho, tais como a Associação de Motoristas por App do Brasil (Ampab) e o Sindicato dos Motoristas de Transporte Individual por Aplicativo do Rio Grande do Sul (Simtrapli RS), defendem a necessidade de regulamentação, com ajustes ao texto do PLP 12/202.
“O motorista não tem autonomia, não escolhe o valor, não sabe nem qual o percentual que vai ser cobrado no término da corrida”, diz Denis Moura, da Ampab. “Quando a gente fala isso, os criadores do PL, o governo, dizem que agora vai ter uma proposta de clareza”, continua. “Clareza eu tenho, sei que a empresa fica em média com 40% do que eu ganho”, ressalta. “O que eu quero é que ela não fique com 40% do que eu ganho. Ou então eu tenho que ganhar muito bem”, defendeu Denise.
“Não somos microempresários, não somos parceiros, não somos totalmente autônomos. Somos trabalhadores”, definiu a motorista Carina Trindade, presidenta da Simtrapli RS.
Enquanto o PLP 12/24 prevê remuneração por hora trabalhada (R$ 32,10 por hora), o PL 536/24 determina como parâmetro da remuneração o km rodado e o minuto trabalhado. Pelo texto, o motorista terá que receber R$ 1,80 por km rodado e R$ 0,40 centavos por minuto, enquanto o cálculo não for aprovado localmente.
O projeto PLP 12/24 que regula o trabalho de motoristas de apps poderá ser votado na Câmara Federal na semana de 12 de junho, segundo projeções do governo. Greves, carreatas e motociatas contra a proposta aconteceram em Belo Horizonte, Goiânia, Rio de Janeiro, São Paulo, Campina Grande, entre outras cidades.
Por sua vez, o PL 536/2024 aguarda parecer do relator na Comissão de Indústria, Comércio e Serviços da Câmara.
Fonte: Página 8