Premiê Sunak convoca eleições antecipadas | Foto: AFP

Com seu partido 20 pontos percentuais atrás da oposição trabalhista nas pesquisas eleitorais, o primeiro-ministro conservador Rishi Sunak dissolveu o parlamento e convocou eleições gerais antecipadas no Reino Unido para o dia 4 de julho, com o país esgotado sob 14 anos de neothatcherismo, projeto do Brexit em crise aberta, o NHS rebentando pelas costuras e dois anos de indisfarçável estagnação. A campanha eleitoral já começou nesta quinta-feira (23).

O Escritório de Estatísticas Nacionais (o ‘IBGE’ britânico) disse que a economia cresceu 0,1% em 2023 em comparação com 2022. O Banco da Inglaterra afirmou esperar que a produção aumente ligeiramente em 2024, mas apenas 0,25%.

Em 2022, sob o peso da alta de juros e da inflação decorrente da guerra por procuração da Otan contra a Rússia na Ucrânia (alta do preço da energia), o Reino Unido viveu uma onda de greves, que chegou a 2 milhões de trabalhadores no ápice e ensaiou uma crise bancária.

Para analistas, a aposta de Sunak se deve a que a derrocada eleitoral só pioraria se a eleição fosse deixada para novembro ou dezembro, como era esperado. De acordo com a pesquisa YouGov MRP de abril, os trabalhistas estão a caminho de vencer facilmente, com 48% contra 29% dos conservadores. A situação é tal que 65 deputados conservadores desistiram de tentar a reeleição.

Um conservador descreveu “pânico na sala de chá” e disse que “todos [ficaram] mortificados” com a decisão do premiê, que uma figura importante à direita do partido descreveu como “loucura”, registrou o jornal progressista Morning Star.

A presidente do movimento Momentum, Kate Dove, chamou a “tirar os tories”. “14 anos de austeridade conservadora quebraram a Grã-Bretanha: o nosso NHS e os nossos serviços públicos estão sem financiamento e de joelhos, a nossa água privatizada cheia de esgotos, uma crise habitacional continua, enquanto os poucos ricos riem a caminho do banco”.

A escolha do 4 de julho – o “Independence Day” em Washington – curiosamente reflete uma característica da atual eleição no Reino Unido, que de certa forma repete a triste ‘escolha’ enfrentada pelos norte-americanos em novembro, entre ‘Genocide Joe’ e o candidato a Führer Trump, só que no caso para ‘decidir’ quem será o novo poodle de plantão em Downing Street 10.

Papel que Sunak tem desempenhado o melhor que pode, depois do brilhareco de Boris Johnson, que de tão esforçado até foi a Kiev levar o recado de Biden, durante as conversações de Istambul, proibindo fazer um acordo de neutralidade com a Rússia, que teria evitado dois anos de guerra.

Mas como poodle, ninguém chega aos pés de Tony Blair, o guia espiritual de Sir Keir Starmer, com sua performance junto a W. Bush no Iraque e demais guerras sem fim.

Mas como quem não tem cão caça com gato, se é para se livrar de 14 anos dos conservadores, de acordo com as pesquisas, até Starmer serve, pelo menos por um tempo.

Embora tenha uma folha corrida que faz inveja a muito pilantra. Como procurador-geral do último governo trabalhista, Stamer organizou a perseguição judicial ao fundador do WikiLeaks, Julian Assange, pavimentando o caminho para forçá-lo a se exilar na Embaixada do Equador, de onde sairia para a ‘Guantánamo britânica’ e o processo de extradição sob Trump.

Na luta interna no trabalhismo, Starmer promoveu um golpe contra o então líder Jeremy Corbyn, sob a farsa de que era “antissemita”, na verdade, por historicamente apoiar a luta de libertação dos palestinos contra o apartheid e a ocupação. A caça às bruxas no trabalhismo chegou a tal ponto que Corbyn, deputado há 41 anos em seu distrito eleitoral, teve que se candidatar como independente. Ele e outros parlamentares progressistas tiveram a legenda negada.

Sunak, em seu favor, pode alegar que seu mandato não foi pior do que o de sua antecessora, Madame Truss, que se achava uma Thatcher rediviva, e que caiu do cargo com um plano  econômico kamikaze que conseguiu a façanha de desagradar a todos, de operários até especuladores, por derrubar a libra esterlina e quase quebrar fundos de pensão, ao propor o corte de impostos dos mais ricos bancado com endividamento público e arrocho dos gastos sociais via congelamento dos recursos – sob a maior inflação em 40 anos e com contas de energia na estratosfera, efeito colateral das sanções contra a Rússia. Fora Truss que havia sido escalada para substituir Boris Johnson.

A antecipação das eleições forçou Sunak a admitir que um dos seus projetos mais acalentados, o dos voos de deportação de imigrantes para Ruanda, terá de ficar para depois do pleito.

Segundo o primeiro-ministro em estado terminal, a eleição acontecerá “em um momento em que o mundo está mais perigoso do que tem sido desde o fim da Guerra Fria. Essa guerra também tornou muito claro o risco para a nossa segurança energética”.

Ainda teceu loas aos genocidas no poder em Jerusalém e acusou “extremistas” de buscarem “minar nossos valores aqui em casa”; a China, de “procurar dominar o século 21 roubando a liderança em tecnologia” e aos “estados hostis” de supostamente insuflarem a imigração para “ameaçar a integridade de nossas fronteiras”.

Sunak também asseverou na tevê que “a estabilidade econômica está agora regressando ao país” e a melhora da economia está “dobrando a esquina”, embora haja admitido que “nem todos estão sentindo todos os benefícios disso ainda”.

Segundo o secretário-geral da central sindical TUC, Paul Nowak, a crise do custo de vida “ainda não acabou”. “Milhões de pessoas no país ainda estão tendo que cortar itens essenciais do dia a dia enquanto lutam para sobreviver.”

Uma pesquisa do TUC revelou que 58% da população diz que o padrão de vida não melhorou este ano, enquanto apenas 14% acredita que melhorou, com muitos se afundando ainda mais em dívidas.

Analistas também condenam o apoio ativo do governo Sunak ao genocídio de Israel em Gaza, seu empenho em prolongar a guerra na Ucrânia e sua política de destruir as relações com a China sem levar em consideração as consequências econômicas ou diplomáticas.

Para o Morning Star, “as promessas feitas de ‘nivelar por cima’ as comunidades industriais no norte e nas Midlands foram descartadas e as oportunidades que o Brexit proporcionou para uma política econômica e industrial mais soberana foram desperdiçadas”. “Sunak, como Cameron, May, Johnson e Truss antes dele, governou o Reino Unido no interesse do capital financeiro e do imperialismo.”

Por sua vez, Sir Starmer propõe um programa de seis pontos em caso de vitória que pretende melhorar as condições dos ingleses sem abandonar o arrocho austericida: “Proporcionar estabilidade econômica com regras rígidas de gastos”; “Reduzir os tempos de espera do NHS com mais 40.000 consultas noturnas e de fim de semana a cada semana”; “Um novo Comando de Segurança de Fronteiras”; “Reprimir o comportamento antissocial, com mais polícia de vizinhança”; e “criar a Great British Energy, uma empresa pública de energia limpa, para reduzir as contas de vez e aumentar a segurança energética, paga por um imposto extraordinário sobre gigantes do petróleo e gás.”

Fonte: Papiro