Onda de ocupações anti-Israel já lembra protestos contra guerra no Vietnã
O movimento começou em março, na Universidade Vanderbilt, no Tennesse, e no Smith College, em Massachussets. Estudantes ocuparam essas instituições norte-americanas para repudiar os ataques de Israel na Faixa de Gaza – que já tiraram a vida de mais de 34 mil palestinos.
Foram primeiros passos pontuais, tímidos até. Os jovens cobravam que as universidades deixassem de receber doações de produtores de armas e empresas ligadas a Israel. Pediam, ainda, o cessar-fogo em Gaza. Nada indicava que fossem ouvidos para além de seus colegas e dos funcionários.
Com o passar das semanas, porém, as manifestações anti-Israel se tornaram uma onda. Na maioria dos atos, a polícia tentou reprimir. À medida que notícias de violência contra os estudantes se espalhavam, mais as ocupações ganhavam a simpatia da opinião pública.
Até esta sexta-feira (26), já houve protestos em 50 universidades dos EUA. Só na Universidade de Columbia, 150 alunos foram presos. A reação desproporcional levou os professores a aderirem à causa, bem como a ONG Vozes Judias pela Paz. Epicentro das mobilizações, Columbia não via a polícia em seu campus desde 1968, quando alunos se levantaram contra a Guerra do Vietnã.
Em Los Angeles, a polícia prendeu 93 estudantes da Universidade do Sul da Califórnia – que, diante de “novas medidas de segurança”, cancelou uma cerimônia de formatura. A Universidade de Nova York, em Yale, contabilizou 45 presos.
Políticos republicanos e democratas, alinhados de primeira hora de Israel, criticaram o movimento estudantil. O presidente Joe Biden disse que o governo vai combater o “crescente antissemitismo”. Professores e até profissionais da imprensa passaram a ser presos. É uma ofensiva aberta contra a liberdade de expressão e de organização. Mas de nada adiantaram as ameaças.
Nesta semana, os Estados Unidos ficaram pequenos para tanta revolta, que ganhou projeção internacional. A onda de ocupações chegou a Paris, onde universitários bloquearam a entrada do Instituto de Estudos Políticos, a Sciences Po, em defesa de uma “condenação clara das ações de Israel”. Os cartazes autoidentificavam os manifestantes como “palestinianos”.
Como na pandemia, a universidade francesa passou a só dar aulas por videoconferência. Para garantir a retomada das aulas presenciais, a Sciences Po se comprometeu em realizar um debate interno sobre o tema e cancelar as punições aos estudantes.
As ocupações anti-Israel já lembram os protestos contra guerra no Vietnã que tomaram o Ocidente, especialmente os Estados Unidos, a partir de 1868. Os combates no Vietnã foram os primeiros a terem cobertura televisiva em tempo quase real, e as imagens de civis atingidos por bombas – como as de napalm – passaram a chocar cada vez mais os norte-americanos.
Além disso, como o alistamento militar era obrigatório, filhos de políticos e magistrados morriam à mesma proporção que filhos da classe trabalhadora. A insatisfação com os rumos da guerra foi turbinada com o escândalo de Watergate, que levou o presidente Richard Nixon à renúncia. Poucas vezes a credibilidade da presidência da República ficou tão manchada nos Estados Unidos.
Em outubro passado, com poucas semanas de bombardeiros em Gaza, uma pesquisa da revista The Economist indicou que, entre norte-americanos com até 30 anos, 30% apoiavam mais os palestinos e 17%, os israelenses. Nada menos que 41% desses jovens eleitores desaprovavam a maneira como Biden conduzia os Estados Unidos em Gaza.
Parte dessa juventude está agora ocupando os campi das universidades. Como haverá eleições para a Casa Branca em novembro, Biden provavelmente sairá desgastado se, até lá, mantiver o discurso oficial tão indiferente aos palestinos que estão sob cerco em Gaza. Israel já perdeu a guerra da narrativa. Os Estados Unidos estão na iminência de uma derrota simbólica também.