A paralisação dos servidores técnico-administrativos de universidades e institutos federais deixou de ser uma mera negociação coletiva para se transformar num teste político para o governo Lula. Deflagrada em março, a greve conta com a adesão de trabalhadores de 470 unidades de ensino – mais que o dobro das 230 esperadas pelo próprio movimento.

Essa mobilização histórica foi fundamental para forçar o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) a antecipar a Mesa Nacional de Negociação Permanente, que estava prevista só para junho. Mas a primeira rodada foi marcada por tropeços do governo – alguns até primários.

Coordenador da Mesa, o secretário nacional de Relações de Trabalho, Jose Lopez Feijóo – que já foi presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e secretário-geral da CUT – tentou impor aos servidores uma prática antissindical: proibir a realização de greves ao longo das negociações. O único efeito de sua proposta desastrosa foi unir ainda mais os trabalhadores.

É fato que Lula herdou uma bomba-relógio das gestões de Michel Temer e Jair Bolsonaro, responsáveis por quase sete anos de arrocho salarial e desvalorização das carreiras no funcionalismo. A reabertura da Mesa de Negociação, em fevereiro de 2023, foi um gesto importante do governo, que resultou em avanços já naquele ano. Foi o caso do reajuste salarial de 9% a todos os servidores públicos federais e do aumento de R$ 200 no vale-alimentação.

Mas a defasagem salarial continua. Os reajustes reivindicados agora pelos servidores técnico-administrativos – que vão de 22,71% a 34,32%, conforme a carreira – correspondem tão-somente à inflação acumulada no período. Há outras reivindicações igualmente justas, como aumento substancial nos benefícios econômicos, reestruturação das carreiras e revogação de decretos do governo Bolsonaro.

Em 10 de abril, Feijóo apresentou a contraproposta do governo, que se limitava a reajuste dos auxílios (refeição, alimentação e creche) e à convocação de mesas específicas para negociar recomposição salarial por carreira. O auxílio-alimentação, por exemplo, seria elevado de R$ 658 para R$ 1.000, enquanto o auxílio-creche passaria de R$ 321 para R$ 484,90. Os salários, no entanto, ficariam congelados em 2024, o que agravaria ainda mais o quadro de arrocho.

Na rodada de sexta-feira (19), havia a expectativa de que o governo fosse menos intransigente e mais sensível às demandas dos servidores. Mas houve nova frustração: Lula insiste em não dar nenhum centavo de reajuste em 2024, com a promessa de aumentos de 9% em janeiro de 2025 e 3,5%, em maio de 2026.

Entidades sindicais elevaram o tom. Para o Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores da Educação Básica, Profissional e Tecnológica), a contraproposta atual do governo é “irrisória e decepcionante”. Fátima Reis, da Comissão Nacional de Supervisão da Carreira da Fasubra (Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil), foi na mesma linha: “Estamos diante de uma proposta ruim e extremamente rebaixada, que não atende absolutamente à demanda da categoria”.

A greve nas universidades e nos institutos federais deve continuar, com potencial de se generalizar para outras categorias do serviço público. Ao que tudo indica, o governo Lula ainda não entendeu a força desse movimento, que tem o apoio das centrais sindicais e grande adesão nas bases.

As entidades sabem do risco de um movimento desse porte ser instrumentalizado para desgastar o governo – e, por tabela, a esquerda – em ano eleitoral. “Sob um governo de reconstrução da democracia, precisamos ter maturidade para que uma greve nacional não se torne uma greve antigoverno”, resume João Paulo Ribeiro, o JP, secretário dos Serviços Públicos e dos Trabalhadores Públicos da CTB (Central dos Trabalhadores do Brasil).

Porém, até o momento, não resta alternativa a esses servidores. A justificativa do governo para se comprometer com reajustes demorados e insuficientes se ampara numa lógica fiscalista, contrária àquela pela qual Lula foi eleito presidente em 2022. É a mesma lógica que busca déficit primário zero em 2024, depois de destinar R$ 1,89 trilhão em 2023 ao pagamento de juros e amortizações da dívida pública. Os técnico-administrativos deram o recado: os servidores não vão ceder.