Em países pobres, Nestlé coloca açúcar em alimentos para bebês
A Nestlé acrescenta açúcar em produtos para bebês de países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil, mas não faz o mesmo em países europeus, inclusive na Suíça, seu país-sede. É o que revela uma investigação feita pela ONG Public Eye, em colaboração com a Rede Internacional em Defesa do Direito de Amamentar (IBFAN).
“A nossa pesquisa mostra que, para a Nestlé, nem todos os bebês são iguais no que diz respeito ao açúcar adicionado. Na Suíça, onde a empresa está sediada, as principais marcas de cereais infantis e leites em pó vendidas pela gigante alimentar não contêm açúcar adicionado, já a maioria dos produtos Cerelac e Nido comercializados em países de rendimentos mais baixos contém açúcar, muitas vezes em níveis elevados”, diz a ONG.
Entre os exemplos citados, está o caso do Cerelac, voltado para bebês de seis meses, feito a partir de farinha de trigo. Na Alemanha e no Reino Unido, o produto não tem açúcar. No entanto, na Etiópia e na Tailândia contém de cinco a seis gramas por porção.
Ainda de acordo com a investigação, no Brasil — o segundo maior mercado do mundo para a empresa, com vendas de cerca de US$ 150 milhões em 2022 —, “três quartos dos cereais infantis da marca Cerelac (conhecidos como Mucilon no país) têm adição de açúcar, três gramas por porção em média”.
Em avaliação feita no relatório, o epidemiologista e professor do departamento de nutrição da Universidade Federal da Paraíba, no Brasil classifica o fato como “extremamente preocupante” e diz que “o açúcar não deve ser adicionado a alimentos destinados a bebês e crianças pequenas porque é desnecessário e altamente viciante”.
Ele acrescenta que a alimentação rica em açúcar aumenta o risco de distúrbios alimentares na idade adulta, como a obesidade, bem como outras doenças crônicas como a diabetes ou a hipertensão.
A Nestlé nega a adição de açúcar e, inclusive, diz que o ideal é evitar consumir ingredientes como esses na infância. Mas, a informação de que o ingrediente está presente nos produtos não está contida nas embalagens
Segundo o estudo, embora seja contrária às diretrizes estabelecidas pela OMS (Organização Mundial de Saúde), a adição de açúcar aos alimentos para bebês continua a ser permitida pelas leis nacionais da maioria dos países. “Estas baseiam-se no Codex Alimentarius, um conjunto de normas internacionais desenvolvidas por uma comissão intergovernamental e coordenado conjuntamente pela FAO e OMS, com sede em Roma”, explica.
Tais normas costumam admitir o uso do açúcar, o que é criticado pela OMS. “As recomendações da OMS são independentes de qualquer influência da indústria”, disse Nigel Rollins, cientista da Organização Mundial da Saúde (OMS), ao Public Eye e à IBFAN. “No Codex, o lobby é muito importante: a indústria açucareira e a indústria de alimentos infantis estão sempre presentes nas salas onde as decisões são tomadas”, completa.
Ele também diz que o duplo padrão, que diferencia a quantidade de açúcar nos diferentes países mais ou menos desenvolvidos “é injustificável” e “totalmente inapropriado”.
Com agências
(PL)