“Uma mulher que passa por qualquer tipo de violência não consegue seguir com a vida dela sem permanecer machucada. O impacto dura para sempre”, disse o novo técnico do Athletico-PR, Cuca, em coletiva neste domingo (10). A fala é uma referência à acusação de estupro, junto com outros três jogadores do Grêmio, de uma menina de 13 anos na Suíça em 1987. 

Em janeiro, a Justiça suíça acatou a argumentação da defesa de Cuca de que ele fora condenado à revelia e que deveria haver um novo julgamento. Como o crime já havia prescrito, o Ministério Público do país estabeleceu a anulação da pena e a extinção do processo, o que fez com que o técnico fosse inocentado. De acordo com o advogado da jovem, ela teria tentado suicídio depois do caso. 

Em seu discurso, feito durante coletiva sobre a partida na qual o Athletico venceu o Londrina por 6 a 0, Cuca disse que escreveu o texto com a ajuda da esposa e das filhas porque ainda não se sentia  “com conhecimento suficiente para falar sem esse respaldo sobre algo tão sério. Por elas e por todas. Não quero errar”. 

Cuca declarou, ainda, que pôde levar a vida “contornando a história porque o mundo do futebol e dos homens em que vivo não tinha me cobrado nada. Mas o mundo está mudando, acho que para melhor, e por isso estou me dando conta de que não adianta eu entender o que é ser um grande treinador, pai, avô e esposo, se eu não entender que o mundo é feito de outras coisas além do futebol, e que eu faço parte disso também”. 

Ele pontuou que “não pode mudar o passado” e completou: “Quantos de nós, homens, que agora me escutam, são capazes de olhar para o passado e rever atitudes? O mundo é um lugar muito diferente para homens e mulheres e, quando a gente enxerga isso, a gente pode até resistir, mas alguma coisa começa a mudar. E esse é o primeiro passo. Depois o sentimento é de real desejo de mudança. Só que as mudanças honestas e verdadeiras levam tempo, exigem dedicação, estudo, são dolorosas e desafiadoras”.

Disse, ainda, já entender “que a realidade tem que ser transformada para que o mundo seja um lugar seguro para as mulheres, para todos. O mundo do futebol ainda é campo de muitos preconceitos. Entendi que quando me cobram, não é só sobre mim: é sobre a forma como nós, homens – e a sociedade como um todo – trata as mulheres de maneira desigual e muitas vezes violenta”.

A fala de Cuca sobre o caso e sobre o machismo, sobretudo no futebol, não deixa de ser uma sinalização positiva que pode ajudar homens a reverem suas posições. Casos recentes como as condenações de Daniel Alves e de Robinho por violência sexual, dentre outros ocorridos ao longo dos anos, mostra que o mundo do futebol precisa ser reformulado em sua essência para que atitudes desse tipo não sejam acobertadas e não se repitam. 

Avançar na área esportiva é fundamental, ainda, para ajudar o país a superar a cultura do estupro e o grave cenário de violência contra as mulheres. Somente em 2022, o Brasil registrou o maior número de estupros da história, quase 75 mil, aumento de 8,2% em relação a 2021 — sendo quase 89% vítimas do sexo feminino, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Ainda segundo pesquisa de 2023 do FBSP, 33,4% das mulheres brasileiras com 16 anos ou mais sofreram violência física e/ou sexual por parte de parceiro íntimo ou ex ao longo da vida, percentual bem superior à média global, de 27%, conforme a OMS. E 47% das brasileiras afirmam ter sofrido algum tipo de assédio em 2022.

Com agências 

(PL)