São Paulo (SP) 25/02/2024 – Ato do Pastor Silas Malafaia em apoio a Bolsonaro na Avenida Paulista. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

Lideranças sociais de todo o Brasil compartilharam seus comentários sobre o que viram e ouviram ontem da Avenida Paulista. Mais uma vez, o ex-presidente Jair Bolsonaro mobilizou sua bolha de fanáticos para tecer desinformação e distorções de argumentos para tentar se safar da condenação pública. Com isso, tentou passar impressão de força, ao mesmo tempo que se incriminou ainda mais.

Mas lideranças como a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-SP), o presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), Adilson Araújo, a presidenta da UNE, Manuella Mirella e o presidente da Conam (Confederação Nacional de Associações de Moradores), Getúlio Vargas Jr., convergiram em diversos pontos, ao refletir uma preocupação compartilhada com o futuro da democracia no Brasil e a importância de uma resposta firme e coordenada por parte da sociedade civil e das instituições democráticas para enfrentar os desafios atuais.

Avaliaram o contexto de crise institucional e democrática que Bolsonaro tenta impor em sua manifestação. Tanto Jandira Feghali quanto Adilson Araújo destacaram a gravidade das alegações de tentativa de golpe por parte de Bolsonaro e suas consequências para o Estado Democrático de Direito. Ambos ressaltaram a importância de resistir às investidas autoritárias e de defender as instituições democráticas do país.

Todos reconheceram a capacidade mobilizadora do discurso polarizador do bolsonarismoJandira Feghali e Vargas Jr. mencionaram a mobilização expressiva de apoiadores de Bolsonaro na Avenida Paulista, destacando-a como uma tentativa do presidente de projetar uma imagem de força e apoio popular. Ambos apontaram as estratégias políticas de Bolsonaro, incluindo tentativas de diálogo com o Congresso Nacional e a preparação para as eleições futuras.

Jandira Feghali e Manuella Mirella criticaram fortemente o teor do discurso de Bolsonaro e sua defesa de medidas como a anistia para invasores de instituições democráticas. Adilson Araújo ressaltou os ataques de Bolsonaro às instituições democráticas e sua postura contrária ao Estado de Direito, enfatizando a necessidade de rejeitar essa narrativa.

O alerta e necessidade de resistência ao que foi visto ontem também foi amplamente apontado. Todas essas lideranças sociais destacaram a importância da vigilância democrática e da resistência às ameaças autoritárias representadas pelo governo de Bolsonaro. Eles enfatizaram a necessidade de mobilização e engajamento cívico para proteger os valores democráticos e promover mudanças positivas na sociedade.

Erros de Bolsonaro

A deputada federal Jandira Feghali, do PCdoB-RJ, compartilhou com seus seguidos das redes sociais suas impressões sobre o discurso do ex-presidente Jair Bolsonaro na Avenida Paulista. Jandira destacou diversos pontos que considera cruciais para compreender o contexto e as intenções por trás do evento.

A deputada ressaltou que o discurso ocorre em meio a investigações sobre sua suposta tentativa de golpe e a abolição do Estado Democrático de Direito. Ela argumentou que há evidências substanciais dessas alegações, incluindo vídeos de reuniões ministeriais onde Bolsonaro conspira contra a democracia e as eleições.

Um aspecto mencionado por Jandira foi a mobilização expressiva de apoiadores de Bolsonaro, muitos dos quais viajaram em ônibus de diferentes estados para participar do ato na Avenida Paulista. A deputada destacou que esse tipo de evento é uma tentativa de Bolsonaro de projetar uma imagem de força, especialmente quando enfrenta situações complicadas.

Além disso, Feghali criticou fortemente o teor do discurso de Bolsonaro e suas tentativas de se apresentar como vítima iluminada pelo universo, enquanto na verdade, segundo ela, o presidente teve uma trajetória política controversa e sem grandes realizações em seus anos como deputado federal. “

“Ele ficou 28 anos na Câmara dos Deputados, e falava para as paredes, porque ninguém ouvia os discursos de Bolsonaro, de apoio à tortura, à ditadura e a tudo que não prestava da história autoritária do Brasil. (…) Foram 28 anos de um irrelevante deputado federal que não prestou nenhum serviço à sociedade brasileira, sem projetos aprovados, sem ser líder de nada, sem ser presidente de comissão, é um deputado absolutamente irrelevante. Então ele faz um discurso medido, absolutamente defensivo, recuado, mas com muitos erros políticos”, observa ela.

A deputada apontou diversos erros políticos no discurso de Bolsonaro, incluindo sua defesa da minuta do estado de sítio como constitucional, seu pedido de anistia para os invasores do Congresso, do Supremo Tribunal Federal e do Palácio do Planalto, e sua retórica contra o Supremo Tribunal Federal que qualificou de “alguns” que o perseguem. Jandira ainda apontou a ausência no discurso da eleição de outubro de 2022, “quando a soberania do voto popular escolheu a democracia e não a política de Bolsonaro”.

“Ao pedir anistia, falando que eram pobres coitados aqueles que invadiram o Congresso, o Supremo e o Planalto, na verdade eram seus seguidores golpistas, estimulados por ele, com lideranças de militares e outros que lá estavam articulados pelo seu grupo, incentivados e planejadamente colocados para aquela invasão. Portanto, quando ele pede anistia para golpistas, ele se identifica com esses golpistas e se coloca do lado do golpe”, pondera ela.

Por fim, a parlamentar enfatizou que o discurso de Bolsonaro foi uma afronta à democracia e uma tentativa de minar as investigações sobre suas ações. Ela concluiu afirmando que o ato na Avenida Paulista revela claramente o alinhamento de Bolsonaro com o autoritarismo e o golpismo, com baixa representatividade política com a “lamentável” presença do governador de São Paulo e do governador de Goiás, que, “aliás, têm sido muito bem nutridos por uma política republicana do Governo Lula”.

A análise da deputada Jandira Feghali ressalta a importância da vigilância democrática diante das ameaças à ordem constitucional. “Bolsonaro se mantém na mentira, se mantém dentro do campo golpista, quando admite a minuta e defende a anistia para golpistas, continua atacando o judiciário, mesmo sem fazer abertamente essa agressão. Portanto, esse ato continua sendo uma afronta à democracia, porque esse ato é contra a investigação do golpe”.

Lobo em pele de cordeiro

O presidente da CTB (Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), Adilson Araújo, emitiu uma análise contundente, destacando os desafios enfrentados pelo campo democrático popular e a necessidade de resistência diante das investidas neofascistas.

Araújo começou sua avaliação descrevendo Bolsonaro como um “lobo em pele de cordeiro”, destacando suas tentativas de se apresentar como um político democrático e patriota, enquanto na verdade é responsável por inúmeras ações que minaram a democracia e negligenciaram o bem-estar da população brasileira. Ele enfatizou a gravidade das ações de Bolsonaro durante a pandemia, acusando-o de provocar um genocídio ao não priorizar a vacinação e contribuir para a morte de mais de 700 mil brasileiros. “Ele tenta falsear, mostrar-se como político democrático, patriota, defensor da liberdade, só que, na verdade, o que nós sabemos é que o Bolsonaro é uma persona non grata”, disse ele.

Além disso, Araújo ressaltou o papel de Bolsonaro na tentativa de golpe e sua postura contrária ao Estado de Direito. Ele argumentou que o ato na Avenida Paulista foi uma tentativa do presidente de negar suas responsabilidades passadas e de se apresentar como vítima. No entanto, Araújo afirmou que a sociedade brasileira deve rejeitar essa narrativa e levantar a bandeira “sem anistia para golpistas”.

“Ele atentou contra a democracia durante todo o tempo e, diante de todas as evidências até então divulgadas na grande mídia, ele presta inúmeros depoimentos dando conta de que é o principal líder da tentativa do golpe e que também proclamou um verdadeiro atentado ao Estado de Direito”, afirmou.

Agora cabe à esquerda trabalhar a agenda das ruas. A quebra do monopólio das ruas em maio de 2021 foi um passo importante para retomada do campo democrático e popular.

Ao analisar a mobilização ocorrida no ato, Araújo reconheceu sua magnitude, estimada em cerca de 200 mil pessoas, e destacou a importância de não subestimar a força da manifestação. Ele alertou para os perigos representados pela agenda neofascista, que, segundo ele, vai contra qualquer perspectiva de melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro.

Araújo também ressaltou a importância de um projeto político que valorize o trabalho e o trabalhador, em contraposição à agenda ultraliberal defendida por Bolsonaro. “O Bolsonaro defende uma agenda ultraliberal, muito respaldado pelo mercado, pelo rentismo, pelo capital especulativo e o grande agronegócio”. Ele destacou iniciativas como o Nova Indústria Brasil e o Novo PAC como exemplos de um projeto de desenvolvimento que busca reduzir a desigualdade e promover o bem-estar social.

“Bolsonaro é um liquidacionista, um negacionista, subalterno e submisso às pressões do capital externo, sobretudo ao imperialismo norte-americano. Então, eu penso que as lições do dia de ontem devem servir para que a gente possa também começar a se situar na necessidade de ganhar as ruas”, convocou.

Por fim, o presidente da CTB enfatizou a necessidade de mobilização e resistência por parte do campo democrático popular, destacando a importância de ganhar as ruas e defender o Estado de Direito. Ele concluiu que a luta política deve ser centralizada na promoção de um Brasil mais justo e igualitário, onde o trabalho e o trabalhador sejam valorizados.

“Cabe à esquerda trabalhar a agenda das ruas. A quebra do monopólio das ruas em maio de 2021 foi um passo importante para retomada do campo democrático e popular. Agora temos a necessidade de ocupar o espaço com a bandeira Sem Anistia Para Golpista, entre tantas outras batalhas, sobretudo a da luta contra a ainda elevada taxa dos juros. O roteiro “Bolsonaro” precisa de uma página final. Sem sua sentença, o Estado de Direito corre sério risco”, concluiu o sindicalista.

Alerta para a democracia

Em entrevista, a presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Manuella Mirella, compartilhou suas impressões sobre o recente ato liderado pelo presidente Jair Bolsonaro. Mirella destacou a emergência do momento e a necessidade de enfrentar a organização persistente da extrema-direita e do bolsonarismo.

“A nossa impressão é que o ato que o Bolsonaro puxa, em um momento de desespero, é porque a questão não é se ele vai ser preso, mas quando vai ser preso”, afirma. “Mmostra que a extrema-direita e o bolsonarismo seguem organizados, e que nós temos agora um grande desafio, que é fazer essa guerra cultural, ideológica nas nossas bases, porque os discursos que a gente viu na Avenida Paulista ontem, foram discursos que o Bolsonaro cultivou durante os quatro anos de sua gestão”.

Ao abordar o discurso e as dinâmicas do evento, a líder estudantil expressou preocupação com a continuidade das narrativas polarizadas e rasteiras cultivadas por Bolsonaro ao longo de seus quatro anos de mandato. Ela enfatizou a importância de uma guerra cultural e ideológica dentro das bases progressistas para combater essas ideias.

Um ponto relevante levantado por Mirella foi a constatação de que, mesmo após um ano do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma eleição acirrada, muitas pessoas não se arrependem de terem votado em Bolsonaro. Isso demonstra, segundo ela, a persistência e a resiliência do bolsonarismo, que continua mobilizado e articulado.

A presidenta da UNE ressaltou a preocupação com os ataques às instituições democráticas presentes no discurso do ato, apesar de serem pintados como defesa da democracia. Para Mirella, esses ataques representam uma ameaça ao maior bem do país: a democracia brasileira.

“Nós não subestimamos o bolsonarismo, muito menos o Bolsonaro, mas pelas falas, tanto do Malafaia, quanto do Nicolas, ou do próprio Bolsonaro, mais uma vez atacando as instituições democráticas, este é um ato pintado de defesa da democracia, mas que nós vimos ali ataques ao nosso bem maior que é a democracia brasileira”, resumiu.

Manuella Mirella alertou que o ato liderado por Bolsonaro não será capaz de protegê-lo da prisão, destacando a necessidade de vigilância e mobilização contínuas para preservar os valores democráticos do Brasil.

A análise da presidenta da UNE ecoa o sentimento de alerta e a importância da resistência contra as ameaças à democracia, reforçando a necessidade de uma ação firme e coordenada da sociedade civil e das instituições democráticas para enfrentar os desafios atuais.

Olho na eleição

Getúlio Vargas Jr

O presidente da Conam (Confederação Nacional de Associações de Moradia), Getúlio Vargas Jr., ao comentar o ato em defesa de Bolsonaro, destacou suas observações sobre o atual cenário político e as perspectivas para as eleições de 2024.

Em sua análise, Vargas Jr. ressaltou que o bolsonarismo, embora não demonstre a mesma força que anteriormente, ainda exibe uma capacidade de mobilização significativa, especialmente entre seus apoiadores mais fervorosos. Ele enfatizou a importância de uma resposta dos movimentos sociais e progressistas diante das tentativas de reverter narrativas e promover uma agenda de anistia aos golpistas.

“Não tem aquela força toda que eles achavam que tinha, mas por outro lado, eles não estão mortos, né? Mas a gente entende que tem que ter uma resposta dos movimentos sociais, dos movimentos organizados, das forças progressistas, no sentido de não ter anistia”, recomendou.

Uma das estratégias identificadas pelo líder do movimento de moradia foi a tentativa de Bolsonaro de buscar apoio no Congresso Nacional, aproveitando as pressões e contradições dentro do próprio Centrão, que antes era sua base aliada. Essa movimentação, segundo ele, representa uma preocupação, visto que nem sempre a maioria no Congresso está alinhada com a defesa da democracia. “Bolsonaro tenta tirar suas questões do campo jurídico e mandar para o campo parlamentar”, alerta.

No entanto, o aspecto mais destacado pelo líder social foi a preparação dos setores de direita e centro-direita, incluindo o campo bolsonarista e seus aliados, para as eleições de 2024. Ele observou a tentativa de arregimentar os estados com maioria bolsonarista e destacou a eleição na cidade de São Paulo como emblemática, delineando claramente dois campos políticos opostos.

“Um campo extremamente progressista contra um campo extremamente conservador. O ato na Paulista deixa claro que a vitória do campo progressista na eleição de São Paulo, se fosse um semáforo, teria que deixar a gente no sinal amarelo”, avalia ele.

Vargas Jr. enfatizou que o ato na Avenida Paulista não deve ser interpretado como um sinal desesperador, mas sim como um alerta para a necessidade de mobilização e vigilância por parte dos setores progressistas. Ele destacou que, embora o cenário político atual possa não ser favorável, ainda não está definido por completo, pois “a correlação de força já foi muito pior”.

A análise dele oferece uma visão ponderada do cenário político brasileiro, destacando desafios e oportunidades para os diferentes atores políticos, enquanto destaca a importância da participação cívica e do engajamento democrático.

(por Cezar Xavier)