Foto: Rovena Rosa/Agência

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aplicou nesta sexta-feira (9) uma multa de R$ 165,8 milhões à Enel Distribuidora pelo apagão que atingiu a Região Metropolitana de São Paulo em novembro de 2023. Na ocasião, cerca de 2,1 milhões de pessoas ficaram sem luz, com o fornecimento levando uma semana para ser normalizado.

Segundo a agência reguladora, a empresa de energia descumpriu o contrato de concessão da rede elétrica paulista ao não garantir energia a moradores afetados pelo temporal que atingiu a cidade. Além disso, consta também do auto de infração, o fato de a companhia só ter mobilizado efetivamente as equipes de manutenção – próprias e terceirizadas – em 6 de novembro, três dias depois do temporal.

A queda de árvores provocada pelas chuvas torrenciais comprometeu o abastecimento de energia em diversas áreas da capital paulista e dos arredores e causou a morte de seis pessoas.

Segundo a Aneel, a concessionária de energia descumpriu uma resolução normativa que permite a penalização de companhias por “implantar, operar ou manter instalações de energia elétrica e os respectivos equipamentos de forma inadequada”. A agência reguladora também informou que a empresa – privatizada – descumpriu o contrato ao não garantir o fornecimento de energia à população atingida pela tempestade.

O documento da Aneel apontou ainda que o serviço só foi normalizado em todos os imóveis afetados apenas em 10 de novembro, uma semana após o temporal. O órgão regulador refutou a justificativa da companhia de que o apagão foi causado por um evento climático atípico, com rajadas de vento duas vezes acima do previsto. Para a Aneel, mesmo que tenha ocorrido um evento climático severo, a distribuidora deve adotar medidas que levem à normalização “célere” do sistema.

De acordo com a agência, apesar de cumprir imites regulatórios firmados no contrato de concessão, os indicadores mostram piorara nos últimos anos na qualidade dos serviços prestados pela companhia, principalmente em ocorrências emergenciais.

A Enel ainda pode recorrer da multa. Um eventual recurso será primeiramente analisado pela área técnica da Aneel. Após, será encaminhado para a diretoria da agência, que decidirá se acolhe os argumentos da distribuidora.

Privatizada na década de 90, a Enel administra hoje o que um dia foi a Eletropaulo, uma empresa estatal paulista, criada em 1981, durante a gestão de Paulo Maluf, para gerar e distribuir energia no estado.

No final daquela década, o então governador Mario Covas (PSDB) dividiu a Eletropaulo em quatro empresas e a privatizou. Em 2018, a Enel comprou ações da Eletropaulo que ainda pertenciam à União e assumiu o controle da ex-estatal. A companhia está presente em 24 municípios da região metropolitana de São Paulo e atende a atende a 18 milhões de consumidores.

Com a privatização – e a meta de auferir apenas lucros sem a preocupação com a eficiência dos serviços, a primeira medida adotada pelos novos executivos que passaram a comandar a companhia foi reduzir o número de funcionários. “A empresa perdeu memória técnica. O número de funcionários com experiência não foi reposto”, disse à Folha de SP, o presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo, Eduardo Annunciato, o Chicão.

Com isso, profissionais experientes foram substituídos por terceirizados, prática adotada pelo setor desde a privatização iniciada nos anos 90. “Investiram na mão de obra terceirizada, que tem uma rotatividade tremenda e corpo menos qualificado para avaliar e atender os problemas”, prosseguiu Chicão.

Estimativas do sindicato indicam que em 2019 o número de empregados diretos da Enel era de 7,7 mil, e atualmente está em 3,9 mil. Segundo a entidade, a antiga proprietária da Eletropaulo, a AES ([resultante da pulverização da Eletropaulo] havia ampliado o quadro de funcionários diretos após um apagão em São Paulo, causado por uma tempestade em 2014. Até a Enel assumir o controle em 2018 e a partir do ano seguinte, cortou trabalhadores.

Desde então, a situação vem se agravando, o que resultou no caos provocado pelo apagão de novembro. “A gente previu o que aconteceu. Avisamos a Enel que se houvesse um ciclone extratropical, São Paulo poderia ficar uma semana sem luz”, continuou o sindicalista. “O problema é crônico e não vai se resolver agora. Pode até piorar, se mudanças não forem feitas no modelo do setor elétrico”, concluiu Annunciato à Folha.

Fonte: Página 8