Agência da ONU faz chegar trigo aos palestinos | Foto: Said Khatib/AFP

O chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, no domingo (4) rejeitou os cortes de recursos para a agência de assistência da ONU para os refugiados palestinos, a UNRWA, da qual dependem quase 2 milhões de palestinos de Gaza, sob ameaça de fome catastrófica.

A política de asfixiar a agência da ONU, que desde 1949 socorre as vítimas da “Nakba”, vem sendo encabeçada pelo presidente Joe Biden, sob o pretexto de que, de acordo com o desacreditado e acusado de genocídio governo Netanyahu, doze de 13.000 funcionários da agência em Gaza teriam tido algum “envolvimento” com o ataque de 7 de outubro do Hamas.

Acusações, aliás, sobre as quais não se conhece quaisquer provas.

Para Borrell, o desfinanciamento da UNRWA é “desproporcional e perigoso”. Em comunicado, ele observou que “se alguns médicos de um hospital europeu estivessem envolvidos em atividades criminosas, haveria uma investigação completa e todas as medidas apropriadas seriam tomadas”.

“No entanto, nenhum governo deixaria de financiar o serviço de saúde, pois isso puniria principalmente as pessoas que recebem esses serviços”, enfatizou Borrell.

A má conduta de indivíduos – ele acrescentou – “jamais deve levar à punição coletiva de toda uma população”.

Borrell registrou, ainda, que a agência presta serviços a refugiados palestinos em todo o Oriente Médio, não apenas em Gaza, alertando que “o fim da UNRWA também seria um sério risco para a estabilidade regional”.

NORUEGA TAMBÉM CONTRA OS CORTES

Em artigo de opinião publicado pelo The New York Times, também o ministro das Relações Exteriores da Noruega, Espen Barth Eide, defendeu enfaticamente a preservação da UNRWA e condenou o corte de recursos que implica em sua asfixia e até colapso.

Um posicionamento que a Noruega assume com a credencial de ter sido, nos anos 1990, o país que conduziu as negociações entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina que levaram à assinatura do primeiro Acordo de Oslo.

Eide salientou que, após quase quatro meses de guerra, “a situação em Gaza é catastrófica. Mais de 75% da população da área, de mais de dois milhões de habitantes, está deslocada. Dezenas de milhares de palestinos foram mortos, muitos deles crianças. A ONU alerta que a fome é iminente”.

“A principal tábua de salvação para os habitantes de Gaza neste cenário é a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA, na sigla em inglês), a agência de quase 75 anos que é quase inteiramente financiada por contribuições voluntárias”, ele salientou.

Após registrar o anúncio feito por Washington e mais 14 países da suspensão das doações para funcionamento da agência da ONU, sob uma alegação da inteligência israelense, Eide reitera que “agora é exatamente o momento errado para interromper o financiamento da UNRWA” e reafirma que a Noruega “mantém-se firme no nosso compromisso de continuar a financiar esta agência crucial e o povo palestino”.

Na qualidade de Ministro dos Negócios Estrangeiros norueguês – ele acrescentou -, “exorto os países doadores a refletirem sobre as consequências mais amplas do corte da UNRWA”.

“Se estas decisões não forem revertidas, corremos um sério risco de agravar a terrível crise humanitária em Gaza. E como a UNRWA também apoia milhões de refugiados palestinos na Cisjordânia, Jordânia, Líbano e Síria, uma interrupção dos pagamentos poderia desestabilizar ainda mais uma região já extremamente volátil”.

“NÃO À PUNIÇÃO COLETIVA”

“No entanto, o mundo deve continuar a financiar a UNRWA por razões mais do que práticas. Não devemos punir coletivamente milhões de pessoas pelos supostos atos de alguns”, disse Eide;

Ele também se congratulou com a resposta do Comissário-Geral da UNRWA, Philippe Lazzarini, ao destituir os acusados e iniciar uma investigação. “Se as alegações forem confirmadas, os envolvidos no ataque devem ser responsabilizados.”

Ao refutar a decisão de cortar o financiamento humanitário em razão de uma suspeita, o chanceler norueguês reedita o raciocínio do homólogo europeu Borrell. “Se alguns membros de um departamento de polícia cometessem um crime, alguém responsabilizaria esses indivíduos, não dissolveria toda a força policial.”

Temos de distinguir – ele destaca – entre o que os indivíduos podem ter feito e o que a UNRWA representa.

“Desde que a UNRWA foi criada em 1949, ela forneceu serviços básicos, educação, abrigos, infraestrutura de acampamento e assistência de emergência para as pessoas que fugiram ou foram expulsas de suas casas na guerra de 1948 que se seguiu ao estabelecimento de Israel. Naquela época, a população refugiada era de cerca de 750 mil. Hoje, quatro gerações depois, cerca de 5,9 milhões de refugiados palestinos são elegíveis para os serviços da UNRWA em toda a região”.

150 FUNCIONÁRIOS DA UNRWA MORTOS

Desde o início desta guerra, os funcionários da UNRWA em Gaza, que são em sua maioria contratados localmente, continuaram realizando serviços de socorro em condições extremas e com risco diário para suas próprias vidas. “Eles, como tantos outros, pagaram um preço alto: desde 7 de outubro, mais de 150 funcionários da UNRWA foram mortos.”

Um país relativamente pequeno, a Noruega é um dos principais doadores da UNRWA, comprometendo no ano passado US$ 45 milhões – um valor ainda muito menor do que os Estados Unidos.

A Noruega fez do processo de paz entre Israel e os palestinos uma prioridade desde as negociações que conduziram ao primeiro Acordo de Oslo entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina, assinado em 1993.

“Quase seis milhões de palestinos não escolheram viver suas vidas como refugiados. Estou convencido de que eles, como o resto de nós, prefeririam uma vida num país a que pudessem chamar seu”.

A QUESTÃO DO DESTINO DOS REFUGIADOS

A questão do destino dos refugiados palestinos está no centro do conflito israelo-palestino, mas 75 anos depois uma solução política continua a ser indefinida. Uma resolução justa e abrangente será uma condição prévia essencial para a paz e a solução de dois Estados, tanto para Israel como para os palestinos, salientou Eide.

“A UNRWA é muito mais do que uma organização humanitária. Representa um compromisso da comunidade internacional para com os refugiados palestinos. Suas operações também são críticas para a presença de outras organizações humanitárias em Gaza”. “Precisamos de mais, e não menos, acesso humanitário à Gaza, devastada pela guerra”, ele insistiu.

O ministro norueguês apontou, também, que “substituir a extensa infraestrutura de apoio da UNRWA por canais alternativos, como sugeriram os críticos da UNRWA, levaria muito tempo”.

Dirigindo-se aos países doadores, ele concluiu: “O povo de Gaza e os refugiados palestinos em todo o Oriente Médio não devem pagar o preço pelas transgressões dos indivíduos. Não podemos abandonar agora o povo palestino”.

Fonte: Papiro