Ceará celebra a Data Magna em memória à primeira abolição da escravatura no Brasil
Francisco José do Nascimento, o Dragão do Mar
Neste dia 25 de março, o Ceará se volta para suas raízes históricas, reverenciando a Data Magna do estado, uma celebração marcada pela lembrança da abolição dos escravos, um marco na trajetória cearense. Instituído como feriado em 2011 no dia 6 de dezembro de 2011, o projeto foi apresentado na Assembleia Legislativa pelo então deputado estadual Lula Morais (PCdoB), e a decisão foi publicada no Diário Oficial do Estado, celebrando um momento singular na história não apenas da região, mas de todo o Brasil.
A província do Ceará teve o pioneirismo de ser a primeira do país a libertar os escravos, desempenhando um papel importante no movimento abolicionista, sendo usada na campanha abolicionista, que, naquele momento, sacudia o Brasil Império. Enquanto o Brasil como um todo só alcançaria essa conquista em 1888, o Ceará já havia dado esse passo significativo quatro anos antes.
Essa importante mudança foi sancionada em 25 de março de 1884, marcando o início de uma nova era para a população escravizada da região. O pioneirismo do Ceará na abolição da escravatura é um testemunho do compromisso histórico da província com a justiça e a igualdade.
O historiador Airton de Farias explica que o Ceará não dependia da escravidão para movimentar a economia local. “Teve muito uso do trabalho livre, na pecuária, no algodão, também do trabalho africano, mas, em geral, predominava o trabalho livre”, diz ele. Havia, inclusive, um tráfico interprovincial com os africanos partindo do Ceará, o que impacta a presença desta população na região, até hoje, mas também ajudou a prolongar a escravidão no Ceará.
O quadro Fortaleza Liberta – pintura de autoria do cearense José Irineu de Sousa, retrata a solenidade de libertação dos escravos de Fortaleza, no salão nobre da Assembleia Provincial. No entanto, a obra invisibiliza os movimentos de negros e negras exploradas, o que joga uma sombra de desconfiança sobre a forja do processo histórica. Os escravizados nunca estiveram passivos na luta por sua liberdade, pois sempre reagiram à crueldade que lhes era imposta por meio da formação de quilombos, o movimento de Jangadeiros, liderado por Francisco José do Nascimento, o Dragão do Mar.
Além disso, historiadoras como Sílvia Vieira, apontam que alguns municípios no Ceará tinham mais escravizados do que pessoas livres. O movimento abolicionista não estaria preocupado com essa população, mas sim com questões mercadológicas internacionais. Mesmo após a Lei Áurea, havia regiões mais remotas do estado que forçavam a continuidade da escravidão. Assim como, o pós-abolição foi marcado por ex-escravizados trabalhando sem remuneração para seus antigos senhores. A diferença era que, agora, não teriam suas famílias desagregadas pelo tráfico negreiro interprovincial.
Dragão do Mar
O movimento abolicionista no estado teve seus precursores e conquistas anteriores à data magna. Um desses momentos emblemáticos ocorreu em 1º de janeiro de 1883, quando a Vila do Acarape testemunhou a entrega de 116 cartas de alforria, em um evento histórico que contou com a presença de figuras proeminentes como José do Patrocínio.
A liberdade recém-conquistada pelos escravos não significou o fim de seus desafios. Muitos buscaram refúgio em quilombos, como o da Serra do Evaristo em Baturité, enquanto outros tentavam reconstruir suas vidas em Fortaleza, em uma jornada em busca de suas famílias e uma nova perspectiva de vida.
O legado do movimento abolicionista ressoa até os dias atuais na sociedade cearense. Figuras como o Dragão do Mar, destacam-se como símbolos de resistência e luta pela liberdade ao recusar traficar escravos em suas jangadas. A ação deu origem à Greve dos Jangadeiros, que cessou o tráfico de escravos para outros lugares do Brasil por alguns dias e foi visto como um dos catalisadores para a abolição na província.
A coragem do Dragão do Mar em se recusar a transportar escravos em suas jangadas e a ação do então presidente da província, Manuel Sátiro de Oliveira Dias, em declarar a libertação de todos os escravos, ecoam como testemunhos vivos da determinação do povo cearense em buscar a justiça e a igualdade.
A Data Magna do Ceará é mais do que um feriado; é um momento de reflexão sobre o passado, celebração das conquistas e renovação do compromisso com os valores de liberdade e dignidade para todos os cidadãos. É um lembrete das lutas e conquistas que forjaram a história do estado e inspiram a construção de um futuro mais inclusivo e justo para todos.
(por Cezar Xavier)