Alternativa às mazelas neoliberais não virá da extrema direita, diz Lula
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou, neste sábado (17), da abertura da 37ª Cúpula da União Africana do Brasil, em Adis Abeba, na Etiópia. Em seu discurso, Lula reafirmou a necessidade de combater as desigualdades sociais e disse que “a alternativa às mazelas da globalização neoliberal não virá da extrema direita racista e xenófoba” e que “o desenvolvimento não pode ser privilégio de poucos”.
Ao abrir seu discurso, o presidente lembrou as similaridades entre os países da África e o Brasil. “A luta africana tem muito em comum com os desafios do Brasil. Mais da metade dos 200 milhões de brasileiros se reconhecem como afrodescendentes. Nós, africanos e brasileiros, precisamos traçar nossos próprios caminhos na ordem internacional que surge”, disse.
Em seguida, destacou que, na atualidade, “já não vigoram as teses do Estado mínimo. Planejar o desenvolvimento agrícola e industrial voltou a ser parte das políticas públicas em todos os quadrantes. As transições energética e digital demandam o incentivo e a orientação dos governos”.
Lula voltou a criticar a atual divisão global e salientou que “a multipolaridade é um componente inexorável e bem-vindo do século 21”. O presidente seguiu argumentando que “a consolidação do BRICS como principal espaço de articulação dos países emergentes é um avanço inegável. Sem os países em desenvolvimento, não será possível a abertura de novo ciclo de expansão mundial, que combine crescimento, redução das desigualdades e preservação ambiental, com ampliação das liberdades”.
Neste sentido, enfatizou que “o Sul Global está se constituindo em parte incontornável da solução para as principais crises que afligem o planeta” e criticou o atual modelo concentrador de riquezas que prejudica, sobretudo, os países e populações mais vulneráveis, entre as quais os imigrantes, que fogem de conflitos e da miséria.“A alternativa às mazelas da globalização neoliberal não virá da extrema direita racista e xenófoba. O desenvolvimento não pode ser privilégio de poucos”, declarou.
Lula completou dizendo que “só um projeto social inclusivo nos permitirá erigir sociedades prósperas, livres, democráticas e soberanas. Não haverá estabilidade nem democracia com fome e desemprego”. Ele também apontou que o momento é propício para “resgatar as melhores tradições humanistas dos grandes líderes da descolonização africana”.
O presidente pontuou, então, que ser humanista hoje “implica condenar os ataques perpetrados pelo Hamas contra civis israelenses, e demandar a liberação imediata de todos os reféns. Ser humanista impõe igualmente o rechaço à resposta desproporcional de Israel, que vitimou quase 30 mil palestinos em Gaza – em sua ampla maioria mulheres e crianças – e provocou o deslocamento forçado de mais de 80% da população”.
Ele voltou a defender a necessidade da criação de um Estado palestino “que seja reconhecido como membro pleno das Nações Unidas”. E aproveitou para reafirmar ser preciso uma ONU fortalecida e que tenha um Conselho de Segurança “mais representativo, sem países com poder de veto, e com membros permanentes da África e da América Latina”.
Ao falar da guerra na Ucrânia, disse que sua duração “escancara a paralisia do Conselho” e que além da “trágica perda de vidas, suas consequências são sentidas em todo o mundo, no preço dos alimentos e fertilizantes. Não haverá solução militar para esse conflito. É chegada a hora da política e da diplomacia”.
Cenário nacional e parceria
Depois de tratar do panorama global, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou sobre o Brasil e a parceria com a África. “O povo brasileiro está recuperando sua soberania política e econômica. Estamos adotando um projeto de transformação ecológica, que nos permitirá dar um salto histórico. Estamos resgatando nossa democracia, tornando-a cada vez mais participativa”, afirmou.
O presidente falou da disposição de o Brasil desenvolver programas educacionais na África e colaborar para que o continente possa se tornar independente na produção de alimentos e energia limpa. Na área da saúde, disse que há “muito a aprender com as estratégias sanitárias de ambos os lados, e a possibilidade de estruturar sistemas públicos robustos e de alcance amplo”.
Ao tratar da questão ambiental, o presidente disse que o “imperativo de proteger as duas maiores florestas tropicais do mundo, a Amazônica e a do Congo, nos torna protagonistas na agenda climática. Os instrumentos internacionais hoje existentes são insuficientes para recompensar de forma eficaz a proteção das florestas, sua biodiversidade e os povos que vivem, cuidam e dependem desses biomas”.
De acordo com o presidente, “ com a recuperação de áreas degradadas, podemos criar um verdadeiro cinturão verde de proteção das florestas do Sul Global”.
Outro ponto destacado de seu discurso foi o combate à fome. “É inadmissível que um mundo capaz de gerar riquezas da ordem de US$ 100 trilhões de dólares por ano conviva com a fome de mais de 735 milhões de pessoas. Estamos criando no G20 a Aliança Global contra a Fome, para impulsionar um conjunto de políticas públicas e mobilizar recursos para o financiamento dessas políticas”.
Por fim, Lula tratou da inteligência artificial. O presidente destacou que essa tecnologia “não pode tornar-se monopólio de poucos países e empresas” e alertou para o fato de que a IA pode se transformar em “terreno fértil para discursos de ódio e desinformação, além de causar desemprego e reforçar vieses de raça e gênero, que acentuam injustiças e discriminação”.
Nesse campo, ele lembrou que o Brasil vai promover a interação do G20 com o Painel de Alto Nível criado pelo Secretário-Geral da ONU para apoiar as discussões sobre o Pacto Digital Global. “Esperamos, com isso, contribuir para uma governança efetiva e multilateral em Inteligência Artificial e que incorpore plenamente os interesses do Sul Global”, concluiu.