Obstáculos e arame farpado colocados ao longo do Rio Grande na fronteira sul dos EUA | Foto: Reprodução

A xenofobia contra imigrantes está, rapidamente, se tornando o mote preferido para a volta de Trump à presidência dos EUA, enquanto o presidente Biden, aliás, ‘Genocide Joe’ [Joe do Genocídio], promove em frenesi as ‘guerras para sempre’ do império do dólar, da guerra por procuração da Otan contra a Rússia na Ucrânia à cumplicidade com Israel em Gaza, passando pelas provocações contra a China em Taiwan.

Em seus comícios, Trump está dizendo que as “portas de presídios e hospícios” estão sendo abertas nos países fronteiriços no sul, para “invadir os EUA”, e que “os terroristas” estão chegando.

Agora, ele postou: “Nossa fronteira se tornou uma arma de destruição em massa. Nossa destruição”. “Terroristas estão chegando sem controle, de todo o mundo. Agora há 100% de chance de grandes ataques terroristas nos EUA”, ele sublinhou.

TEXAS CONTRA A “INVASÃO”

E, na semana passada, o governador do Texas, o republicano Greg Abbott, se recusou a cumprir uma decisão da Suprema Corte, a favor do direito do governo federal de remover o arame farpado que ele mandou a Guarda Nacional texana colocar ao longo da margem do Rio Grande, perto da cidade fronteiriça de Eagle Pass, sob o pretexto de “conter a invasão” dos imigrantes.

Abbott anunciou que o Texas discordava da decisão do Supremo, iria continuar a controlar a fronteira com o México no Estado e que não permitiria que o arame farpado fosse cortado.

Por sua vez, o governo Biden tentou contornar a situação, prometendo trocar a liberação dos US$ 100 bilhões que pediu para a guerra na Ucrânia, em Gaza e, assim que possível, em Taiwan, por um “acordo bipartidário” para “fechar a fronteira”.

Como registrou ‘Common Dreams’, o colunista Will Bunch, do ‘The Philadelphia Inquirer’, disse que o desafio do governador Abbott era a “maior ameaça à autoridade federal desde a ‘resistência maciça’ do Sul nas décadas de 1950 e 60” à decisão do tribunal superior que determinou a integração escolar. Outros comentaristas, mais afoitos, compararam o impasse a um episódio que precedeu a Guerra Civil.

Bunch recomendou a Biden que seguisse o exemplo do ex-presidente Dwight Eisenhower, que federalizou a Guarda Nacional do Arkansas para encerrar um impasse sobre a integração da Little Rock Central High School. “Se Biden for o único a recuar no Eagle Pass, então, correndo o risco de parafrasear Trump, não teremos mais um país”, acrescentou.

IMBRÓGLIO TOMA AS MANCHETES

Rapidamente, o imbróglio tomou as manchetes no país inteiro, com 25 governadores endossando a recusa de Abbott, e com dez Estados anunciando o envio de seus efetivos de Guarda Nacional estaduais em apoio.

A decisão na Suprema Corte dos EUA, reconhecidamente hegemonizada pelos conservadores desde as nomeações de juízes de Trump, foi por 5 votos a 4. E foi precedida pelo escândalo da morte de quatro imigrantes, que acabaram afogados ao se depararem com o arame farpado e outros obstáculos implantados.  A implantação do arame farpado também estava impedindo a Patrulha da Fronteira federal de acessar uma área onde fica uma rampa de barcos usada por seus agentes para navegar até o Rio Grande.

“PACTO QUEBRADO”

Abbott, em um comunicado divulgado na semana passada, afirmou que o governo Biden “quebrou o pacto” entre os Estados e o governo federal ao supostamente não aplicar as leis de imigração, classificou a imigração como uma “invasão” e invocou “a autoridade constitucional do Texas para se defender e se proteger”.

Em sua declaração, Abbott fez referência aos pais fundadores James Madison e Alexander Hamilton, e disse basear sua alegação na Constituição dos EUA. Ele citou o Artigo IV, Seção 4, que promete proteção federal contra “invasão” e o Artigo 1, Seção 10, Cláusula 3, que reconhece o “interesse soberano” de um Estado em proteger suas fronteiras.

“O fracasso do governo Biden em cumprir os deveres impostos pelo Artigo IV, § 4 desencadeou o Artigo I, § 10, Cláusula 3, que reserva a este Estado o direito de autodefesa. Por essas razões, já declarei uma invasão nos termos do artigo I, § 10, cláusula 3ª para invocar a autoridade constitucional do Texas para se defender e se proteger. Essa autoridade é a lei suprema da terra e substitui quaisquer leis federais em contrário. A Guarda Nacional do Texas, o Departamento de Segurança Pública do Texas e outros funcionários do Texas estão agindo com base nessa autoridade, bem como na lei estadual, para proteger a fronteira do Texas”, atreveu-se Abbott.

Na verdade, como registrou Jacob Crosse, o Artigo I Seção § 10 é uma afirmação abrangente de autoridade federal, não estadual, e declara que nenhum Estado deve “manter tropas” ou “envolver-se em guerra, a menos que realmente invadido”.

“A alegação de que o influxo de migrantes desesperados e famintos, alimentados pela pobreza e pela opressão, constitui uma invasão é um repúdio a toda a história dos Estados Unidos, cuja população é majoritariamente descendente apenas desses migrantes, embora principalmente da Europa.” A atual campanha contra os “imigrantes ilegais”, defendida por republicanos e democratas, mesmo com nuances, é “fundamentalmente racista e chauvinista”.

INCITAÇÃO À XENOFOBIA

O vice de Abbott disse “não mexam com o Texas”, acrescentando que “levamos a segurança de nossa fronteira a sério. […] Acreditamos que constitucionalmente temos razão. Temos o direito de defender os nossos cidadãos. Temos o direito de defender este país. Estamos apenas fazendo o trabalho.” Ele asseverou que “16 milhões de pessoas vieram para este país desde que Joe Biden assumiu o cargo”. “É uma invasão. […] Estamos enfrentando um exército”, acrescentou.

Registre-se que a Patrulha de Fronteira federal deteve quase 250 mil imigrantes só no mês de dezembro de 2023, um aumento de 31% em relação aos mais de 191 mil em novembro, e de 13% em relação aos 222 mil imigrantes capturados em dezembro de 2022, o recorde histórico anterior.

Um após o outro, os governadores republicanos jogaram lenha na crise, com um deles argumentando que agora “somos todos Estados fronteiriços”.

A governadora do Dakota do Sul, Kristi Noem, escreveu que Abbott estava “exatamente certo em invocar a autoridade constitucional do Texas para se defender”. Em um post posterior, chamou a fronteira de “zona de guerra”.

O governador Kim Reynolds disse que Iowa enviou membros da Guarda Nacional para a fronteira com o Texas no passado. “Quando o governo federal falha, os Estados intervêm”, ele insistiu, ecoando as alegações de Abbott.

Na quinta-feira passada, em uma declaração formal, os 25 governadores republicanos endossaram a argumentação “constitucional” de Abbott, na prática, um endeusamento da xenofobia e racismo contra imigrantes.

“Como o governo Biden abdicou de seus deveres constitucionais compactos para com os Estados, o Texas tem todas as justificativas legais para proteger a soberania de nossos estados e de nossa nação”, subscreveram os governadores.

BIDEN EM MODO ‘BIPARTIDÁRIO’

Em um comunicado divulgado da Casa Branca na noite de sexta-feira, o presidente Biden prometeu aos republicanos que “fecharia” a fronteira EUA-México se eles ajudassem a aprovar um pacote de financiamento suplementar de US$ 110 bilhões para as guerras dos EUA mundo afora.

A declaração de Biden foi divulgada dois dias depois que o governador do Texas declarou que os migrantes que buscam asilo constituíam uma “invasão” de seu Estado e justificou sua usurpação da autoridade federal sobre a fronteira.

O pacote de guerra suplementar está definhando no Congresso nos EUA desde outubro por, segundo os republicanos, não incluir medidas suficientemente brutais contra os imigrantes e a virtual eliminação do direito de asilo.

No esforço para atrair os republicanos para um acerto, Biden já realizou mais deportações no ano passado do que Trump em 2019 (ou seja, antes da pandemia) e agora está prometendo “fechar a fronteira”.

Segundo o comunicado da Casa Branca, o projeto de lei de financiamento suplementar concederia a Biden “uma nova autoridade de emergência para fechar a fronteira quando ela ficar sobrecarregada”. Acrescentou que as novas políticas solicitadas por Biden representariam o “conjunto mais duro e justo de reformas para proteger a fronteira que já tivemos em nosso país”.

As mudanças no projeto de lei incluem a detenção de todos os adultos solteiros e o fechamento obrigatório da fronteira EUA-México se os “encontros” de migrantes atingirem uma média de 5.000 por dia. Mais do que esse número tem sido relatado praticamente todos os dias nos últimos meses.

Uma vez atingido o limite, a nova lei permitiria que o presidente impusesse uma paralisação, exigindo que os agentes da Patrulha de Fronteira expulsassem imediatamente, sem processamento, todo e qualquer imigrante que cruzasse a fronteira. Durante a paralisação, nenhum imigrante que cruzasse poderia solicitar asilo sob o Título 8.

A paralisação só poderia ser suspensa quando os “encontros diários” tivessem uma média inferior a 3.750 por dia em um período de duas semanas, algo que não acontece há meses. Além disso, qualquer migrante que tentasse cruzar a fronteira duas vezes durante uma “paralisação” seria proibido de entrar nos EUA por um ano.

O comunicado da Casa Branca observou ainda que o projeto de lei incluía financiamento para a fronteira solicitado pelo próprio Biden em outubro, prevendo “mais 1.300 agentes da Patrulha de Fronteira, 375 juízes de imigração, 1.600 oficiais de asilo e mais de 100 máquinas de inspeção de ponta”.

“DETER E DEPORTAR”

O senador James Lankford, um dos principais negociadores dos republicanos sobre o pacote suplementar, elogiou o projeto de lei bipartidário do Senado. “O projeto se concentra em nos levar a zero travessias ilegais por dia. Não há anistia. Aumenta o número de agentes da Patrulha de Fronteira, aumenta os agentes de asilo. Aumenta os leitos de detenção para que possamos deter rapidamente e depois deportar indivíduos.”

Lankford acrescentou que o projeto de lei prevê “voos adicionais de deportação para fora” e “muda nosso processo de asilo para que as pessoas recebam uma triagem rápida de asilo em um padrão mais alto e, em seguida, sejam devolvidas de volta ao seu país de origem”.

Fonte: Papiro