Se o Brasil é um país de dimensões continentais, a gigantesca São Paulo é uma espécie de cidade-país. O Censo 2022 lhe atribuiu 11,4 milhões de habitantes, que se espalham nos quase mil bairros de suas 32 subprefeituras. Tampouco faltam animais de estimação. De acordo com a prefeitura, há 1,8 milhão de cães e 810 mil gatos nos domicílios urbanos da cidade. Não é de estranhar que em São Paulo existam mais pet shops do que farmácias.

Fundada em 25 de janeiro de 1554, São Paulo completa 470 anos nesta quinta-feira (25). Em cima de um orçamento recorde de R$ 111,8 bilhões, o prefeito bolsonarista Ricardo Nunes diz desejar que a capital paulista seja “a melhor cidade do mundo para se viver”. Mas, sob seu governo, a explosão do número de pessoas em situação de rua, o crescimento da Cracolândia e o abandono crescente da região central mostram que talvez o político Ricardo Nunes tenha traído o cidadão Ricardo Nunes.

Veja-se pela pesquisa “Viver em São Paulo: Qualidade de Vida 2024”, divulgada pela Rede Nossa São Paulo na terça-feira (23). Pelo menos dois dados do levantamento deveriam envergonhar os gestores paulistanos. O primeiro revela uma insatisfação generalizada dos moradores: se pudessem, 60% deixariam a cidade. A ditadura militar criou o slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o”. Os gestores parecem ter criado um karma para os paulistanos: “Odeie e fique”.

O segundo dado mostra que, além da insatisfação, há desesperança. Nada menos que 65% dos moradores não têm nenhuma vontade de participar da vida política de São Paulo. É como se cada um deles evocasse os versos de Álvaro de Campos: “O que há em mim é sobretudo cansaço — / Não disto nem daquilo, / Nem sequer de tudo ou de nada: / Cansaço assim mesmo, ele mesmo, / Cansaço”.

Embora São Paulo seja “como o mundo todo”, tal qual resumiu Caetano Veloso na letra de Vaca Profana, é preciso dar rumo a esse mundo. O principal oponente de Ricardo Nunes nas eleições municipais de 2024 será Guilherme Boulos, líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e deputado federal pelo PSOL-SP. Além do próprio partido, Boulos terá o apoio de PT, PCdoB, PV, Rede e PDT. Sua proposta é de “uma São Paulo mais moderna, humana e segura”.

O sentimento de mudança já é grande e pode crescer ainda mais até outubro, mês da eleição. Conforme pesquisa Ipec desta semana, apenas 17% dos moradores de São Paulo aprovam o governo municipal, enquanto 38% o rejeitam. As chances de reeleição de Ricardo Nunes passam pelos 42% que consideram a gestão regular. Já as chances de São Paulo se tornar um lugar melhor para se viver passam necessariamente pela não reeleição do prefeito.