Extração desenfreada causou afundamento do solo em diversos bairros de Maceió | Foto: Reprodução

A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) criticou a atitude do prefeito de Maceió, João Henrique Holanda Caldas (PL), conhecido como JHC, pelo perdão do passivo ambiental da mineradora Braskem, em troca de R$ 1,7 bilhão. O manifesto foi lançado na semana em que a Prefeitura, por determinação da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia, foi intimada a fornecer informações “com urgência e prioridade” sobre o acordo que JHC fez com a empresa.

Assinado por Dom Vicente Ferreira, presidente da Comissão para a Ecologia Integral e Mineração da CNBB, o documento, ignorado pela cúpula da Arquidiocese de Maceió, que deveria o ter publicizado ao mesmo tempo e não o fez, por razões não informadas, foi lido na íntegra durante o ato das vítimas da Braskem, realizado na orla da Ponta Verde, no final do ano passado.

“A Comissão para Ecologia Integral e Mineração da CNBB expressa solidariedade às famílias desalojadas e denuncia, ainda, o acordo recente firmado entre a prefeitura de Maceió e a Braskem, no âmbito da Ação Civil Pública, pelo qual, mediante ao pagamento de R$ 1,7 bilhão, o município dará quitação plena de todo o passivo ambiental da companhia, doando áreas públicas e isentando a empresa de dados futuros”, diz um trecho da nota.

No texto, Dom Vicente denuncia também os incentivos fiscais concedidos à Braskem, se solidariza com as famílias despejadas e critica a falsa ideia de empresa com responsabilidade socioambiental propalada pela Braskem e defende urgência para superar esse modelo extrativista que coloca o lucro acima da vida.” Enquanto a crise socioambiental atinge seus limites, o extrativismo predatório da mineração emerge como a expressão mais emblemática da insustentabilidade deste sistema”, continua o texto.

“O cenário vivenciado em Maceió, Alagoas, configura, na realidade, um crime continuado perpetrado pela empresa petroquímica Braskem, evidenciando a perversidade intrínseca à mineração no Brasil, com a conivência do Estado”, denuncia a entidade. “Continuamos lutando pela Ecologia Integral, conscientes de que tudo está interligado em nossa casa comum: quando cuidamos da terra, ela também cuida de nós”, diz a CNBB.

“Em conformidade com a nota da Comissão Pastoral da Terra do Estado de Alagoas, repudiamos veementemente, com base em testemunhos, a truculência por parte da Defesa Civil Municipal, utilizando a força policial e as viaturas da Braskem para remover as pessoas de suas casas, na madrugada da quinta-feira (30/11)”, segue a nota, “oferecendo apenas escolas creches como abrigo delas, mas sem respeito às suas escolhas, propriedades e, inclusive, aos pessoais que tiveram que ser deixados para trás”, critica a entidade.

Para a coordenadora do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), Neirevane Nunes, a “nota da CNBB, assinada por Dom Vicente, é muito importante na luta contra a Braskem e em defesa das famílias, que sofreram e ainda sofrem os efeitos danosos da mineração irresponsável, praticada por essa empresa, durante quase quatro décadas”.

Ao portal “Tribuna Hoje”, a prefeitura disse “ter recebido com naturalidade a informação sobre o despacho da ministra Cármen Lúcia, uma vez que se trata de rito esperado na tramitação processual”. E “que encaminhará ao STF dentro do prazo estabelecido as informações solicitadas”, quando “demonstrará a total regularidade do termo de compensação firmado com a Braskem em julho de 2023 e homologado pela Justiça”.

O procurador do Trabalho Cássio Araújo, da coordenação do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), avalia que “não adianta a prefeitura tentar minimizar o problema em que ela está metida”, pois “o acordo foi muito lesivo para a cidade de Maceió, sob diversos aspectos”, como: “doação do patrimônio público para a empresa acusada de praticar o crime ambiental; quitação de danos futuros; e o valor em si do acordo”.

“A questão dos danos futuros está levando o Município a contrair um empréstimo externo de 40 milhões de dólares e a destinar casas do ‘Programa Minha Casa, Minha Vida’ para suprir os males causados pelo colapso da mina 18, quando isso seria obrigação da Braskem”, denuncia o procurador.

Para o integrante do MUVB, “o empréstimo seria fazer com que toda a sociedade pagasse pelo crime da Braskem”. Além disso, acrescenta, “as casas do programa social deveriam ser destinadas para outras pessoas que estão em situação de necessidade de moradias, assumindo a sociedade por outra obrigação que seria da Braskem, realocando as pessoas afetadas e pagando indenizações justas”.

Somente em 2021, as renúncias fiscais concedidas à Braskem somaram R$ 791,5 milhões. A maior parte – R$ 726 milhões – foi concedida pelas operações da mineradora na região Nordeste, por meio da Sudene. São renúncias que existem desde a metade do século passado e recentemente foram renovadas pelo Congresso brasileiro, por mais 5 anos.

Fonte: Página 8